Hospital português opunha-se à realização de uma teleconsulta, mas teve mesmo de a fazer
No meio da polémica que envolveu as mais altas instituições portuguesas, incluindo a Presidência da República, as gémeas luso-brasileiras continuam a ter acesso ao Serviço Nacional de Saúde (SNS).
Na tarde desta mesma sexta-feira as meninas tiveram uma teleconsulta no Hospital de Santa Maria, confirmou a CNN Portugal.
Os médicos insistem que é necessário examinar as crianças, que estão a ser tratadas a uma doença rara, a atrofia muscular espinhal tipo 1, de forma presencial. Só que a família interpôs uma contestação à qual o Tribunal Administrativo de Lisboa deu provimento, obrigando o hospital a realizar a consulta por vídeo e à distância.
O advogado da família garante que o estado da saúde das crianças piorou recentemente, depois de 15 meses de acompanhamento e da administração do Zolgensma, o medicamento mais caro do mundo, tendo mesmo as crianças passado um período recente internadas num hospital de São Paulo.
Pelo meio houve três consultas desmarcadas e, só após esta ordem judicial, foi possível realizar-se a consulta.
Na ação que chegou ao Tribunal Administrativo o advogado escuda-se no impacto mediático do caso e na saúde das crianças. Foi precisamente o segundo argumento que o tribunal entendeu como fundamental: a deterioração do estado de saúde das gémeas, uma vez que os juízes entendem que uma viagem entre Brasil e Portugal não seria benéfica.
“Podendo acarretar graves prejuízos irreparáveis para a sua saíde, na medida em que, nos últimos meses, têm tido várias intercorrências, designadamente problemas de índole pulmonar, sendo certo que têm tido limitações a nível da expansibilidade pulmonar”, pode ler-se.
Por isso mesmo o Hospital de Santa Maria não teve outra hipótese. Notificado pelo tribunal este fim de semana, teve mesmo de aceder à teleconsulta, criando as condições necessárias para isso, mesmo opondo-se à realização.
Para posição do hospital há duas razões: o acompanhamento à distância contraria os pareceres clínicos das equipas que tomaram conta do caso; não há garantia de equidade em relação a todos os outros casos com a mesma patologia.
Em causa está uma consulta de neuropediatria, essencial para o acompanhamento da eficácia do milionário medicamento administrado, o que até poderá ter impacto no pagamento da última parcela do Estado à farmacêutica que o desenvolve. Caso se verifique que não há eficácia plena, o SNS pode ser ressarcido em centenas de milhares de euros.
Da decisão deste fim de semana fica ainda uma outra nota: o tribunal alertou que, caso a teleconsulta não seja suficiente, as meninas terão mesmo de ser avaliadas presencialmente, o que implica uma viagem a Portugal.
O caso das duas gémeas residentes no Brasil que adquiriram nacionalidade portuguesa e receberam em Portugal, em 2020, o medicamento Zolgensma, com um custo total de quatro milhões de euros, foi divulgado pela TVI (do mesmo grupo da CNN Portugal), em novembro passado, e está ainda a ser investigado pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
A Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS) já concluiu que o acesso à consulta de neuropediatria destas crianças foi ilegal.