Por 800 euros é possível comprar uma carta de condução falsa. Anúncios na internet dizem que "é totalmente legal"

9 out 2022, 08:00
Imigrantes da CPLP e OCDE já podem conduzir em Portugal

Uma breve pesquisa na internet revela a facilidade com que é possível obter uma carta de condução falsa em menos de uma semana. A CNN Portugal foi procurar perceber quais os métodos e como se apanha quem produz e quem utiliza estes documentos falsificados

Tudo começa com um anúncio no Instagram que promete aquilo que qualquer jovem que chumbou no Exame de condução sonha, mas que está longe da realidade. “Compre a sua carta de condução de forma rápida e legal”, afirma o anúncio que transporta quem o clica para uma página na Internet ilustrada com uma estrada e com letras azuis onde se pode ler “obtenha sua carteira de habilitação portuguesa e brasileira online, sem qualquer exame, em 7 dias”. 

A página afirma ter parcerias com escolas de condução em Portugal, “onde passam centenas de motoristas todos os anos” e apela a quem não tem tempo para conseguir ir às aulas necessárias para ser habilitado a conduzir. “Percebemos que pode estar muito longe ou não ter muito tempo e dinheiro de sobra”, está escrito no site, acrescentando que, quando fizer o pagamento, a sua carta vai ser tratada por uma escola automática, “com consistência e profissionalismo para que não haja diferença visível entre a sua carta - a falsa - e as demais”.

O site desvenda ainda mais um pouco do processo. Depois de pagar uma quantia negociada por whatsapp com um dos contactos disponíveis, a empresa que detém o site diz que inscreve o aluno “para o exame teórico e prático” e ele “passa automaticamente nos exames”. Depois disto, a carta é entregue em casa. Neste site é prometida a entrega em sete dias, mas noutros consultados pela CNN Portugal o prazo chega a ser cinco dias. Há mesmo empresas que falsificam cartas através de endereços com o nome e o logotipo do IMT - O Instituto da Mobilidade e dos Transportes, habilitado oficialmente para conceder uma carta de condução. 

Exemplo de um dos endereços que promete cartas de condução sem exame "legalmente emitidas pelo IMT"

 

Falsificadores entram em contacto por Whatsapp e pedem 800 euros 

Para realizar a inscrição é preciso entrar em contacto via Whatsapp com um dos números anunciados no site. 

Poucos minutos depois da primeira mensagem, o agente da compra da carta de condução, como se autointitula na conversa com a CNN Portugal, escreve que “trabalha com o IMT”, juntamente “com várias escolas de condução”. “O nosso objetivo é facilitar o processo para aqueles que não desejam passar pelo processo normal ou que tenham sido reprovados no exame”, afirma ainda.

Depois dessa breve troca de mensagens, segue o custo de toda esta operação. Primeiro, é preciso fazer um depósito de 400 euros e entregar vários dados pessoais, nomeadamente a assinatura e a data de nascimento, uma fotografia do cartão de cidadão e uma imagem 4x4 estilo passaporte. Depois, após receber uma fotografia de como ficará a carta de condução falsificada, é necessário pagar outros 400 euros para a receber em casa.

Já questionado sobre o que acontecerá se for parado numa operação STOP e um polícia pedir para ver a carta de condução contrafeita, este funcionário vinca que todo o processo é “totalmente legal”. “Todas as verificações de holograma, até verificações de banco de dados do sistema serão aprovadas nesse caso. Vai ser o mesmo que alguém que foi para a escola de condução”, acrescenta, garantindo que já elaborou “centenas de cartas de condução desta forma, sem nunca receber uma reclamação”.

As ferramentas da PSP para lidar com cartas de condução falsificadas

Ainda que seja difícil de perceber quantas cartas falsas estão a circular diariamente em Portugal, à CNN Portugal, fonte oficial da Polícia de Segurança Pública (PSP) afirma que este tem sido um crime que tem obrigado os agentes policiais a frequentar novos cursos, “nomeadamente na área da investigação criminal e análise criminal”, nos quais são dadas ferramentas aos que lhes permitam reconhecer os “diversos tipos de suporte documental, as principais medidas de segurança incorporadas nos documentos, sistemas de impressão e tintas”, para que dessa forma seja mais fácil detetar eventuais documentos falsos com que se deparem no dia-a-dia.

“É também ensinado aos polícias a utilizarem os sentidos, como a visão e o tato”, assim como alguns equipamentos “como lupas e luzes ultravioleta” que possibilitam visualizar algumas medidas de segurança integradas nos documentos.

A mesma fonte diz também que, se estiverem em causa suspeitas de que as cartas de condução são “notoriamente falsas”, ou de que “apresentam níveis de falsificação bastante elaborados”, os documentos são “apreendidos e enviados para laboratórios forenses para serem alvo de perícia, e dessa forma se poder atestar as eventuais falsificações”.

A falsificação da carta de condução é um crime punido com pena de prisão que pode variar entre os seis meses e os cinco anos e, lembra fonte da PSP, “qualquer cidadão que seja detetado com um documento falso na sua posse será apresentado às autoridades judiciárias”.

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