Entre pressões com políticos italianos e tensões com responsáveis norte-americanos, o rosto da Stellantis perdeu o poder
Carlos Tavares acha que o setor automóvel precisa de uma revolução e dirigir-se mais para a aposta nos automóveis elétricos. Na Stellantis não acham exatamente o mesmo, e essa é uma das razões para que o reputado gestor português tenha decidido pedir a demissão do grupo, deixando de ser uma das figuras fortes na indústria.
De acordo com o Financial Times, que consultou duas fontes relacionadas com o processo, as duas partes chegaram a um ponto de rutura depois de diferenças insanáveis naquilo que ambos os lados entendiam que devia ser aposta.
Carlos Tavares queria uma Stellantis mais focada na estratégia da eletrificação dos veículos, mas a altura escolhida não terá sido a melhor. É que o gestor português ainda lutava para recuperar a sua reputação depois de os últimos resultados financeiros não terem sido os esperados.
Sem esperar por uma melhoria nos resultados, Carlos Tavares tentou empreender uma estratégia que fosse ao encontro daquilo que a União Europeia pretende. Só que na Stellantis a ideia passava mais por uma abordagem flexível que fosse capaz de suster as operações nas centrais de produção, enquanto não se perdiam margens de lucro.
Para se ter uma ideia do quão separadas estavam as partes, bastava ver que Carlos Tavares pressionou os legisladores italianos a disponibilizarem mais subsídios para a produção de veículos elétricos, sob pena de várias fábricas terem de fechar. Em paralelo, o gestor português também perdeu poder quando viu as tensões subirem com outras instituições públicas, além de fornecedores e outros parceiros, especialmente nos Estados Unidos. Fontes do Financial Times dizem mesmo que Carlos Tavares entrou em guerra com algumas destas partes para tentar restaurar a sua reputação.
Uma pedrada no quarto maior fabricante de automóveis em todo o mundo, e cujo líder, John Elkann, que é membro do grupo Agnelli, e que também tem participações no clube Italiano Juventus, tentou tratar com chamadas constantes para Roma e Paris durante o fim de semana.
Uma pedrada que chega num momento delicado para a indústria, nomeadamente na Europa, onde Volkswagen e Ford anunciaram encerramentos de fábricas e despedimentos para responderem a uma quebra na procura de veículos elétricos. Em paralelo, outro problema: a competitividade dos fabricantes chineses.
Carlos Tavares estava à frente da Stellantis desde 2021, quando a PSA, dona da Peugeot, e a Fiat Chrysler Automobiles decidiram fundir-se. De início conseguiu fazer subir as margens de lucro, nomeadamente pela bruta contenção de custos que permitiu uma grande competitividade na Europa. Só que este ano as vendas não estão a ser as esperadas no mercado europeu e norte-americano, o que também tem tido efeitos na bolsa.
A Stellantis prossegue agora para tentar encontrar um novo líder e salvar um ano que deve terminar no Vermelho.