Os novos tratamentos são caros e não chegam a todos. Para Solange Peters, presidente da Sociedade Europeia de Oncologia Médica, o aumento do tempo de vida permitido pelas inovações científicas levará a uma lista cada vez maior de doentes a que é preciso dar atenção. Para que os sistemas de saúde não colapsem, apontou, o foco está na prevenção. Até porque “ainda estamos longe” da cura
O aviso vem de Solange Peters, presidente da Sociedade Europeia de Oncologia Médica: chegará a um ponto em que o elevado número de casos de doentes com cancro não permitirá o tratamento a todos. O esforço, diz numa entrevista ao El País, deve estar na prevenção.
“Estes [novos] tratamentos prolongam a sobrevivência, mas também fazem com que se tenha mais pacientes para tratar e que aumentam os custos. Com o tempo não vamos poder tratar todos os pacientes. Não se poderá pagar”, alertou.
A especialista reconheceu que os novos fármacos são eficazes mas extremamente caros, podendo pôr em risco a sustentabilidade dos sistemas de saúde. Para evitar esse colapso, insistiu, a prevenção é a chave. “Sabemos que não se lhe dedica o suficiente, apesar de todos conhecermos a importância da prevenção”, referiu.
Para Solange Peters, “ainda estamos longe” de encontrar o “tratamento revolucionário” para o cancro – e, logo, a sua cura. Assim, até que esse dia surja, disse, “o que podemos fazer é reduzir o número de casos”, dedicando mais dinheiro à prevenção. Porque mesmo as técnicas de pesquisa e os tratamentos inovadores “não chegarão a grande parte das pessoas no mundo, inclusive para países ricos como a Suíça”.
Para garantir a sustentabilidade dos sistemas de saúde, juntou, é necessário “começar a definir o preço justo dos fármacos”, pesando os custos da investigação, da produção e o número de pacientes que deles vão beneficiar.
Bons exemplos
“Quanto mais avançamos [na pesquisa], mais mecanismos de resistência identificamos, assim como novas situações sem controlo”, concretizou a também chefe do serviço de oncologia do Hospital Universitário de Lausanne, na Suíça.
Com o foco na prevenção, elogiou o esforço levado a cabo em mamografias e colonoscopias a partir dos 50 anos, que disse estarem “bem implantadas”. Quanto à monitorização do cancro do pulmão, considerou ter “uma aceitação quase completa na comunidade científica e médica”, embora praticamente não se faça. A vontade política, acrescentou, faz parte da solução.
Questionada sobre o tabaco, um dos hábitos associados ao desenvolvimento do cancro, a especialista não defendeu a proibição. Mas deixou avisos noutra direção: “Devemos ter cuidados com os lóbis. Na Suíça, lutei muito contra a indústria do tabaco. A indústria está a inventar novos produtos, com uma pretensão de criar uma forma de fumar sem fumar. Dizem que não terás cancro, mas terás à mesma, são os mesmos carcinógenos.”
Solange Peters, de 50 anos e formada em biologia, começou a trabalhar no campo das doenças infeciosas na viragem do milénio, quando o VIH começou a ser controlado. Peters saltou para a oncologia porque, no contacto com seropositivos, conheceu muitos doentes com cancro. E, explicou ao El País, percebeu que o lado da biologia era determinante na eventual solução.