Há cada vez mais cancro da pele em Portugal. E se acha que basta utilizar um bom protetor solar, desengane-se

20 jul 2022, 07:00
Pele (Pexels)

O calor extremo pode não estar diretamente relacionado com o surgimento de novos casos, mas deve estar atento à radiação UV. "É preciso abandonar a ideia que o protetor solar tem proteção absoluta", avisa o presidente da Associação Portuguesa de Cancro Cutâneo que explica ainda a melhor forma de evitar ter lesões perigosas

Todos os anos o número de pessoas com cancro da pele em Portugal aumenta cerca de 3%. De acordo com o presidente da Associação Portuguesa de Cancro Cutâneo (APCC), João Nuno Maia e Silva, os valores, ainda que não sejam "explosivos", "continuam a ser um problema". Se incluirmos todos os cancros de pele, são 12 mil novos casos ao ano. Se nos concentrarmos nos mais graves, os melanomas, rondam os 1.000. 

Existem vários fatores que levam a estes números. Entre eles, o facto de a população estar cada vez mais envelhecida e de muitos estrangeiros de pele clara vindos do Norte da Europa terem vindo viver para Portugal. Como têm padrões de exposição solar diferentes, aparecem muitas vezes com lesões na pele. 

Na ótica de João Nuno Maia e Silva, para combater estes números é preciso que as pessoas, portugueses ou estrangeiros, estejam informados e bem informados sobre os sinais a que devem estar atentos, a importância do diagnóstico precoce e os cuidados que devem ter. "É preciso abandonar a ideia que o protetor solar tem proteção absoluta", afirmou. Muitas vezes existe a teoria de que "com o protetor solar não são precisas preocupações", mas a verdade é que muitas vezes as pessoas utilizam "o protetor para prolongar a exposição solar". Se é uma delas, saiba que está a usar a estratégia errada. 

"Todos os estudos nacionais e internacionais já demonstraram que quem usa protetor solar, muitas vezes, também apanha escaldões, porque acaba por ficar muito mais tempo exposto ao sol. A ideia de 'Eu coloco protetor solar e por isso posso expor-me' deve ser combatida. O 50+ não significa que não tenhamos de nos preocupar", explicou o dermatologista à CNN Portugal. 

O protetor solar, mesmo os que são resistentes à água, devem ser reaplicados de três em três horas. Por isso, cada vez que vai à água, depois de secar, deve voltar a aplicar creme pelo corpo. Isto porque, de acordo com o presidente da APCC, "as substâncias dos protetores químicos já estão degradadas [ao final desse tempo]."

Para além do protetor solar, existem outros fatores que deve ter em consideração. O horário em que se vai expor ao sol - sendo das 12:00 às 16:00 consideradas as horas perigosas -, o tipo de vestuário que utiliza e o usufruto das sombras. 

Existe alguma ligação entre o calor extremo e os casos de cancro da pele? 

Vários países da Europa - entre eles Portugal, Reino Unido, Espanha, Itália a e França - têm sido fortemente atingidos por uma onda de calor extremo que já provocou incêndios florestais. Em território nacional, houve várias zonas que ultrapassaram os 40ºC e isso resultou num excesso de mortalidade. Numa semana, a Direção-Geral da Saúde (DGS) registou 659 óbitos em excesso. Mas terá este calor extremo alguma ligação direta com os casos de cancro cutâneo?

"Não há uma relação linear entre uma coisa e outra", disse João Nuno Maia e Silva. Existem dois agentes diferentes a ter em conta na resposta a esta pergunta: "uma coisa é o calor e outra é o índice de radiação".  

"A temperatura muitas vezes não corresponde ao índice de radiação. Por exemplo, mesmo quando está nublado, podemos sair da praia com um escaldão e, no entanto, pode até não estar muito calor e não estamos expostos ao sol", mas estamos expostos à radiação Ultra Violeta (UV). Aliás, por alguma razão a DGS classifica a radiação UV um fator cancerígeno, um fator de risco que contribui para o cancro da pele. 

Para o presidente da APCC, "os meses de entrada do verão, como maio, são os mais perigoso". Porquê? Porque a radiação UV já é elevada e as pessoas geralmente ainda não andam protegidas.  

"Podemos conviver com o sol de diferentes formas. Podemos ser negligentes ou podemos ser responsáveis", avisa, contando que no seu caso não deixa de aproveitar o sol: "Mas respeito e adapto-me."

E quem trabalha ao sol? 

Para quem vai à praia ou pratica desporto ao ar livre é sempre mais fácil ajustar a sua atividade. Mas para aqueles que trabalham ao sol - como agricultores, jardineiros ou construtores civis - muitas vezes não têm consciência do "enorme risco das suas profissões". 

"Se eu perguntar a um agricultor se coloca protetor solar quando vai à praia, cerca de 70/80% diz que sim, mas se eu perguntar se o fazem quando estão a trabalhar, os números já caem para 25%. Estas pessoas são uma grande preocupação. Uma hora de sol na praia vale o mesmo que uma hora ao sol no campo", disse João Nuno Maia e Silva. 

Na visão do especialista, é preciso alertar estes trabalhadores para o uso regular de protetor solar, principalmente nas zonas do corpo que estão expostas ao sol - uma vez que é aí que surgem as lesões -, tentar, sempre que possível, realizar a atividade à sombra ou nas horas de menor calor. Por isso, sublinha, as empresas prestadoras deste tipo de serviço deviam dar acesso a material de proteção aos trabalhadores, como chapéus de abas largas e vestuário protector. Além disso, seria importante, acrescenta, que apostassem na criação de sombras e disponibilizassem dispensadores de protetor solar.

A que sinais devemos estar atentos? Existe algum que não seja visível?

Cerca de 90% dos casos que são detetados numa fase precoce são curáveis. "É uma lesão que se vê, que se consegue observar, que é tirada com uma simples cirurgia e é curada", explicou o dermatologista. Mas quando esta fase é largamente ultrapassada, são precisos exames complementares e pode mesmo levar à morte. Por isso, o diagnóstico precoce é essencial e "à volta de 20% dos doentes têm mais que uma lesão".

Que lesões são estas? De acordo com a APCC, deve aprender a identificá-las através do método ABCDE: Assimetria, Bordos (regulares ou irregulares), Cor, Dimensão, e Evolução (em termos de dimensão). É um método bastante mais ilustrativo através de imagens, como a que se segue. 

Nevo ou Melanoma (Imagem: Associação Portuguesa Cancro Cutâneo)

Por norma, os sinais, chamados Nevos, que surgem no nosso corpo são semelhantes entre eles, têm a mesma cor, a mesma forma e praticamente as mesmas dimensões. Por isso deve estar mais atento quando surge algum numa zona onde nunca teve, de pigmentação diferente, de dimensões diferentes. Isso pode ser um sinal de alerta. 

"Cerca de 70% dos cancros de pele aparecem em pele normal. A pessoa foca-se muito no sinal que já existia e que é grande, normalmente é na pele normal, onde não existia sinal nenhum, onde de repente aparece uma pinta que permanece, que não há mais nenhuma igual no corpo, que ninguém da família ter uma idêntica. Por isso é que é muito importante ver as imagens."

O cancro da pele surge, normalmente, a nível de sinais ou de feridas que não cicatrizam e em nas zonas que estão mais expostas ao sol: rostos, braços, pernas. Se lhe aparecer no corpo alguma 'mancha' idêntica às da imagem acima, o melhor é fazer um diagnóstico e descartar todas as hipóteses. 

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