Na fotografia de capa, tailandeses evacuados tomam o pequeno-almoço no ginásio que lhes serve de abrigo no campus da enquanto se abrigam num ginásio dentro do campus da Universidade Surindra Rajabhat, na província fronteiriça de Surin, a 25 de julho (Lillian Sunwanrumpha/AFP/Getty Images)
Doze mortes e mais de 135 mil civis retirados. É o balanço do confronto em curso, pelo segundo dia, entre a Tailândia e o Camboja, que disputam a fronteira entre os dois países.
A tensão entre estes dois países vizinhos do Sudeste Asiático tem vindo a agravar-se nos últimos meses à custa de áreas disputadas ao longo da fronteira, com uma extensão de 800 quilómetros e que foi traçada em parte pelo antigo colonizador do Camboja, França. Esta fronteira passa perto de vários locais religiosos de importância arqueológica reclamados por ambos os países.
Os confrontos começaram pelas 4:30 locais desta sexta-feira. Foi o Camboja quem iniciou o fogo cruzado, com recurso tanto a armas ligeiras como a armamento pesado, segundo informou à CNN o coronel Richa Sooksuwanon, porta-voz adjunto do exército tailandês. Na resposta, o exército tailandês utilizou fogo de artilharia.
Os confrontos estão a ter lugar em dois locais na província de Ubon Ratchathani e num outro na província de Surin. O exército tailandês já alertou a população para evitar essas áreas.
O exército tailandês explicou ainda que as suas forças estavam a realizar operações de desativação de explosivos e a recuperar corpos em Kantharalak, área que foi atingida por rockets do Camboja na quinta-feira.
Os confrontos de quinta-feira envolveram trocas de tiros com armas ligeiras e lançamento de rockets entre a Tailândia – aliada dos Estados Unidos por tratado – e o seu vizinho mais pequeno, o Camboja.
A Tailândia enviou depois caças F-16, bombardeando o que afirmou serem alvos militares em território cambojano.
Pelo menos 16 pessoas morreram até agora na Tailândia, a maioria civis, segundo o Ministério da Saúde tailandês.
No Camboja, pelo menos uma pessoa morreu e outras cinco ficaram feridas, segundo Met Measpheakdey, porta-voz da província de Oddar Meanchey, que faz fronteira com as províncias tailandesas de Buri Ram, Surin e Si Saket.
As autoridades do Camboja acusaram o exército tailandês de utilizar armas de fragmentação em dois locais na madrugada de sexta-feira.
Mais de quatro mil pessoas no Camboja foram retiradas das suas casas junto à fronteira, segundo noticiou a Associated Press esta sexta-feira, citando outra fonte oficial da província de Oddar Meanchey.
Vídeos de Oddar Meanchey, captados na quinta-feira, mostravam aldeões a fugir durante a noite, carregando os seus pertences em veículos e a dormir debaixo de lonas.
Na quinta-feira, mais de 130.000 habitantes da Tailândia tinham sido evacuados para abrigos temporários, segundo o Ministério da Saúde da Tailândia. Imagens da província de Surin mostravam estas pessoas abrigadas numa universidade, deitados em tapetes no chão e a comer de recipientes de plástico.
A embaixada dos EUA na Tailândia já aconselhou esta sexta-feira os cidadãos americanos a evitarem deslocações num raio de 50 quilómetros da fronteira entre a Tailândia e o Camboja, devido aos confrontos em curso.
Disputa fronteiriça
A recente escalada de violência ocorreu depois de cinco soldados tailandeses terem ficado feridos, na quarta-feira, na sequência da explosão de uma mina terrestre.
Contudo, a tensão vinha-se acentuando desde maio, quando um soldado do Camboja foi morto durante um confronto entre as tropas tailandesas e as tropas cambojanas. Os dois lados abriram fogo numa outra zona contestada da fronteira.
A Tailândia e o Camboja têm mantido uma relação tanto de cooperação como de rivalidade. A fronteira terrestre — em grande parte cartografada por França durante o domínio colonial sobre o Camboja — tem sido, periodicamente, palco de confrontos militares e origem de tensões políticas.
“Ambos os lados guardam ressentimento em relação ao passado”, afirma Thitinan Pongsudhirak, professor de ciência política na Universidade de Chulalongkorn, em Banguecoque.
“Os tailandeses acreditam que os franceses retiraram terras à Tailândia e que as entregaram ao Camboja. Já os habitantes do Camboja pensam que esta é a sua civilização desde tempos muito antigos e que, no fim de contas, esta é a sua terra.”
Não se trata, contudo, de uma luta equilibrada. O exército tailandês ultrapassa largamente o rival em número de efetivos e armamento: os seus 361 mil militares no ativo são o triplo do contingente do país vizinho.
Além disso, os Estados Unidos encaram a Tailândia como um importante aliado fora da NATO, o que permitiu a Banguecoque beneficiar de décadas de apoio americano aos seus programas de armamento.
A Tailândia está atualmente mergulhada num contexto de incerteza: a sua primeira-ministra, Paetongtarn Shinawatra, foi suspensa de funções em julho, após ter sido divulgada uma chamada telefónica com o influente ex-líder cambojano Hun Sen, na qual esta parecia criticar as ações do próprio exército no conflito.
O exército tailandês é, há muito, um ator central na política daquele reino, tendo tomado o poder em vários golpes de Estado e, frequentemente, derrubando governos democráticos. O exército apresenta-se como o defensor máximo da monarquia.