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Comentadora CNN

Semana de vitória para as mulheres do Brasil

21 jan 2023, 22:43

Medidas de apoio à saúde reprodutiva das mulheres mostra sinais práticos de volta para o século XXI, com base na ciência e não na religião

Se Bolsonaro representou um retrocesso para a vida e saúde das mulheres no Brasil, o atual governo, em apenas 20 dias, já mostra sinais práticos de volta para o século XXI e saída da era medieval implementada pela extrema-direita que estava no poder. Importante dizer, já de início, que não era nada além da obrigação, mas representa um relevante cuidado com a saúde das meninas mulheres diante de tantas demandas urgentes no país. 

Uma das ações, realizada pelo Ministério da Saúde, foi a revogação de portarias que eram consideradas barreiras para acesso ao aborto legal. No Brasil, diferente de Portugal e outros países progressistas, o procedimento só pode ocorrer em três casos muito específicos: risco de vida da mulher, fetos anencéfalos e em casos de violência sexual. 

A portaria, agora extinta, exigia que os profissionais de saúde notificassem as autoridades policiais sobre os casos e guardassem materiais retirados das pacientes, como embriões e fetos. No Brasil, de acordo com o último Anuário da Segurança Pública, 180 meninas e 40 mulheres por dia são estupradas, sem contar as inúmeras violações que não chegam ao conhecimento policial. Em muitas situações, principalmente nos que envolvem crianças e adolescentes, familiares são os autores, o que pode fazer com que a vítima deixe de procurar o cuidado de saúde pela obrigatoriedade de denunciar.

Quando foi implementada, em 2020, a medida já era criticada por especialistas de diversas áreas. Com a revogação, as meninas e mulheres podem, de fato, serem cuidadas em um dos momentos mais difíceis de suas vidas, com poder de escolha sobre como prosseguir ou não com uma denúncia.

Segundo a ministra da Saúde, Nísia Trindade, a portaria era considerada um “retrocesso aos direitos das mulheres” e que violava os princípios do sistema público de saúde brasileiro. É uma postura muito diferente do governo anterior, que defendia “a vida desde a concepção”, em uma clara interferência religiosa em um estado que deveria ser laico. Nada surpreendente para quem utilizava o lema “Deus, Pátria e Família”, de origem fascista e era contra a interrupção da gravidez mesmo quando a vítima tivesse sido vítima de um dos mais perversos e misóginos crimes que existem.

Brasil saiu de aliança ultraconservadora

Outra ação realizada nesta semana pelo governo representa uma simbologia importante para o mundo de que a política no Brasil mudou. O governo saiu, oficialmente, de uma aliança ultraconservadora, conhecida como “Convenção de Genebra”, que tentava barrar, junto aos órgãos internacionais, toda e qualquer tentativa de acesso à saúde reprodutiva, além de pregar um modelo de família “tradicional”. 

A aliança foi criada em 2020 por integrantes do então governo brasileiro e dos Estados Unidos. Um ano depois, quando Trump saiu do poder, Joe Biden também retirou o país do tratado. Com isso, o Brasil passou a ter mais protagonismo, liderando na Organização das Nações Unidas (ONU) e outros órgãos internacionais tentativas de impor uma agenda ultraconservadora para o mundo. 

A figura da ex-ministra da Família, Damares Alves, agora eleita senadora, foi uma das principais nesta empreitada de misoginia. Ainda fazem parte da convenção países como Arábia Saudita, Bahrein, Polônia e Hungria, nações que não são nenhum bom exemplo de como tratam e cuidam das mulheres. 

Em nota, o Itamaraty anunciou a saída da aliança e destacou que “o Governo reitera o firme compromisso de promover a garantia efetiva e abrangente da saúde da mulher, em linha com o que dispõem a legislação nacional e as políticas sanitárias em vigor sobre essa temática, bem como o pleno respeito às diferentes configurações familiares". O anúncio é mais do que simbólico para o mundo de como o novo governo possui uma visão muito mais contemporânea, progressista e adequada sobre a saúde das mulheres e a diversidade de famílias que existem. 

A articulação entre os ministérios e as novas ações, antes mesmo de completar um mês de posse e diante de tantas pautas urgentes, é um sinal animador de comprometimento com a saúde das mulheres do país. Mais do que promessas de campanha ou ideologia, os direitos reprodutivos são assuntos de saúde pública e não devem estar alinhados com políticas de governo a cada quatro anos, mas sim, de Estado. Ao mesmo tempo, serve de alerta para o que pode acontecer quando a extrema-direita governa uma nação.

 

* Amanda Lima escreve a sua opinião em Português do Brasil

  

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