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Comentadora CNN

O humilde homem do pão com leite condensado e das jóias milionárias

15 mar 2023, 13:43

Bolsonaro segue passeando por mercados e fast foods nos Estados Unidos enquanto vários processos de investigação correm no Brasil, com risco de receber um mandado de prisão pela Polícia Federal caso não volte ao país até o final de março

A página já deveria ter sido virada, mas os escândalos do governo Bolsonaro não param de surgir - especialmente com o trabalho do jornalismo profissional, que a sua seita tanto detesta. O mais novo é o das jóias milionárias recebidas pela ditadura saudita, no valor de “apenas” 3 milhões de euros. 

As diferentes versões dadas pelo ex-presidente e demais envolvidos só pioram a situação já delicada de Bolsonaro. Ele segue passeando por mercados e fast foods nos Estados Unidos enquanto vários processos de investigação correm no Brasil, com risco de receber um mandado de prisão pela Polícia Federal (PF) caso não volte ao país até o final de março. Tic-tac.

A história das jóias mostra mais uma faceta da corrupção do ex-governo e utilização da máquina estatal em prol de interesses pessoais. Já é muito grave que um funcionário tente enganar as autoridades passando pela alfândega com peças avaliadas em 3 milhões de euros.

Mais grave ainda foram as pelo menos oito tentativas, com vídeos e uma série de provas, de que Bolsonaro tentou a qualquer custo pegar as jóias retidas pelas autoridades, pressionando os servidores públicos da Receita Federal. Em uma delas, às vésperas da fuga para Orlando, até um avião do Exército foi utilizado para levar um funcionário até São Paulo para tentar dar o último “carteiraço” através de um servidor a mando de Mauro Cid, braço direito e esquerdo de Bolsonaro. Ou seja, não se sustenta a versão de que o ex-presidente não sabia das jóias, até porque, já estava em posse de outro estojo recebido pelos sauditas.

A essa altura, fica difícil de saber quais os crimes mais graves que estão em investigação. É uma questão de perspectiva pessoal. Eu elencaria a atuação criminosa na pandemia de Covid-19, a crueldade com os índios Yanomamis e a tentativa de golpe no dia 8 de janeiro como os mais graves, porque envolveram bens muito mais valiosos: vidas humanas e a democracia.  Fato é que o caso das jóias serviu para o cerco se fechar contra Bolsonaro, apesar de outros fatores não terem faltado até aqui. 

Mas o risco de prisão não é a única possível consequência. O escândalo bateu direto em Michele Bolsonaro, bagunçando os atuais planos da extrema-direita. O PL foi obrigado a adiar um evento programado para 8 de março, Dia da Mulher, que lançaria Michele como presidente da ala feminina do partido. O evento, com ar de O Conto de Aia, foi prorrogado para 21 de março, logo depois de voltar da segunda viagem aos Estados Unidos para se encontrar com o marido. 

Já sabemos que os fiéis seguidores da família Bolsonaro não se abalam com nada. Eles podem cometer crimes ao vivo que sempre vão achar uma maneira de defendê-lo. Aliás, já estão tentando mudar a narrativa e colocar a culpa no ex-ministro das Minas e Energia, Bento Albuquerque. 

Nas redes sociais, o ex-presidente continua agindo como se fosse líder máximo do país, publicando tweets com “feitos” do seu governo, com várias mentiras aplaudidas pelos seguidores. Curiosamente, o foco recente das postagens passou para ações “anticorrupção”, uma de suas falsas bandeiras.

Bolsonaro foi eleito em 2018 com o lema contra a corrupção, na esteira dos escândalos do PT, mas já era mais do que claro que de ético e ilibado nada tinha, sem contar a crueldade das ações nos últimos quatro anos. Os motivos para sua derrota em 2022 são muitos, isso que ainda nem se sabia das jóias milionárias. Em 2026, uma narrativa anticorrupção só vai funcionar para a seita bolsonarista mesmo. Mas o roteirista do Brasil sempre surpreende. 
 

* Amanda Lima escreve a sua opinião em Português do Brasil

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