Como Schjelderup se tornou estrela do Football Manager

15 mar 2023, 08:24
Andreas Schjelderup (Gualter Fatia/Getty Images)

Simulador revelou que reforço do Benfica era o jogador mais contratado na atual edição. A perceção do enorme potencial acompanha há muito o norueguês, na vida como no jogo. Quanto à popularidade virtual, ela resulta de vários fatores. Uma conversa sobre Schjelderup e wonderkids

Andreas Schjelderup estreou-se pela equipa principal do Benfica nos Barreiros nos minutos finais do jogo com o Marítimo, um marco para o jovem de 18 anos que chegou à Luz em janeiro e que já vinha ganhando rodagem na equipa B. No final, Roger Schmidt voltou a falar do norueguês, para o definir como «um talento brilhante». A perceção desse potencial acompanha desde muito cedo Schjelderup, que antes de chegar à Luz já era figura na Liga dinamarquesa e ainda antes tinha entrado na órbita dos grandes clubes europeus. E que além disso era estrela do Football Manager (FM), o popular simulador de gestão de futebol.

Quando o Benfica anunciou a contratação de Schjelderup, as redes sociais do FM assinalaram o momento com a revelação de que se tratava do jogador mais contratado na atual edição.

Essa informação não é pública, uma vez que não existe um ranking de popularidade e apenas os responsáveis pelo jogo têm acesso a esses dados. Como explica ao Maisfutebol um dos dois head researchers do Football Manager em Portugal, que são os responsáveis pela base de dados de jogadores a atuarem no nosso país. «Só mesmo a Sports Interactive é que tem esses dados sobre os jogadores mais contratados», diz Carlos Bessa.

A promessa que andou em digressão pela Europa

No FM, Schjelderup é um wonderkid, um jogador sub-20 classificado com alto potencial. Já o era na «vida real». Quando crescia no Bodo-Glimt, o clube da sua cidade natal, o extremo atraiu rapidamente a atenção de grandes clubes europeus. Esse interesse começou por levá-lo a uma espécie de digressão por várias academias pela Europa fora.

«Visitei o Ajax quatro vezes, o PSV quatro vezes, o Tottenham, o Liverpool, a Juventus, o Fulham, a Atalanta e o Bayern Munique», contou Schjelderup à televisão norueguesa TV2. Mas optou por aquela que acreditou ser uma aposta mais sólida para um futuro próximo. «Era muito tentador ir para clubes de Itália, de Inglaterra ou de Espanha. Eu até sou fã do Liverpool, mas não queria ser mais um na multidão. Nesses clubes o caminho para chegar à primeira equipa é mais longo.»

Então, escolheu a Dinamarca e o Nordsjaelland. Foi uma aposta ganha. Chegou no verão de 2020 e estreou-se seis meses mais tarde pela equipa principal. Tinha 16 anos. A partir daí foi crescendo, reforçando o potencial e ganhando influência em campo. Esta época, quando o Benfica o contratou em janeiro, era o melhor marcador do campeonato dinamarquês, com 10 golos.

«Deu passos muito rápidos», diz o seu antigo treinador, Flemming Pedersen, atual coordenador-técnico do Nordsjaelland. «O plano era que ele jogasse e treinasse na equipa sub-19 no primeiro ano e chegasse à equipa principal quando completasse 17 anos. Mas ao fim de meio ano percebemos que estava na altura de subir à equipa principal e ganhou logo a titularidade», afirmou o técnico ao canal NRK.

O percurso e a qualidade de Schjelderup refletem-se no FM e contribuem, obviamente, para se ter tornado, como dizem os responsáveis pelo jogo, o jogador mais popular entre os utilizadores da atual edição. «A maioria da base de utilizadores do FM prefere contratar jogadores com mais «atributos verdes» - 16 (em 20) - ou acima. O Schjelderup tem quase todos os atributos ideais para um ala que joga pelo interior», disse ao The Athletic David Lind, «researcher» do FM na Dinamarca.

A relação qualidade/preço que explica a popularidade

Mas a popularidade recorde que Schjelderup atingiu no FM resulta de uma combinação de vários fatores, considera Carlos Bessa, que ajuda, a pedido do Maisfutebol, a contextualizar e a explicar a lógica do jogo a «não praticantes»: «É quase como funciona um departamento de scouting na prática. Como treinadores, queremos procurar bons negócios ou excelentes jogadores a baixos preços, mediante o nível em que estamos. Estando na Dinamarca, ele está num mercado apetecível. Se quisermos um wonderkid que esteja a atuar no Brasileirão, terá outro preço.»

«Porque é que muitas pessoas contrataram o Schjelderup? Porque era um jogador com muito potencial, sobretudo pela relação qualidade/preço. Ele tem atributos bons, não são brilhantes mas são bons e estão realmente evoluídos para um miúdo de 18 anos. Os atributos, o facto de ser muito jovem e o facto de não ser muito caro e ser um jogador com muito potencial, cria o boom», continua: «Tem muito potencial de crescimento e era a um preço relativamente barato pelo facto de estar na Liga dinamarquesa. É um misto de grande potencial versus idade, versus preço. Conseguia-se comprar a preços competitivos.»

Uma oportunidade no jogo, como na «vida real»

O jogo imita a vida. E essa possibilidade de comprar um jogador com muito potencial a preços competitivos «foi o que aconteceu» na realidade, quando o Benfica agarrou a oportunidade e avançou para a contratação de Schjelderup em janeiro: «O Benfica não comprou o jogador muito caro. Nove milhões por um jogador com o potencial que lhe é atribuído não é uma fortuna. Este jogador no Brasil certamente ficava mais caro.»

No jogo, há também um efeito bola de neve. O FM não nos dá uma lista de wonderkids, ou de jogadores com muito potencial. Mas há vários sites e fóruns dedicados ao jogo que fazem essas listagens e a palavra vai passando. «O jogador tem um bom preço, destaca-se, as pessoas vão falando, há sites específicos do FM que desenvolvem listas com os melhores jogadores jovens, ou os jovens jogadores mais económicos, listas preferenciais.»

Essa é uma das formas a que quem joga pode recorrer para encontrar bons negócios. A outra, explica Carlos Bessa, é fazer o trabalho por si próprio. Colocar o seu departamento de scouting virtual a trabalhar, ou fazer a pesquisa por conta própria, «procurando jogadores baratos e que tenham potencial». «O Schjelderup encaixava neste perfil. Portanto, por qualquer das vias, foi começando a ficar famoso» na comunidade do jogo.

Isto para quem procura esse tipo de futebolistas, claro. Há lógicas muito diferentes entre os jogadores de FM. Carlos Bessa, por exemplo, conta que nunca «contratou» Schjelderup. E explica: «Aquilo que eu jogo no FM não tem nada a ver com ir buscar wonderkids. Eu gosto de treinar em Ligas exóticas, periféricas. Gosto de jogar na Liga da Malásia, da Africa do Sul... Nestes países assim não tenho forma de ir buscar o Schjelderup. Uma equipa qualquer da Malásia não tinha dinheiro para ir buscar o Schjelderup. Nem o Schjelderup queria ir jogar para a Malásia.»

As promessas que ainda nem têm idade para entrar no jogo

Os analistas do FM, espalhados por todo o mundo, observam jogadores desde muito cedo. «Eu costumo acompanhar regularmente jogos do campeonato sub-19», exemplifica Carlos Bessa: «É por causa disso que o jogo muitas vezes se antecipa, entre aspas, e identifica potencial em jogadores que ainda não são muito conhecidos. Estes jogadores ainda não chegaram à equipa sénior, mas em período formativo já estão a mostrar que têm muito potencial.»

Muitas vezes, os observadores já têm debaixo de olho jogadores que ainda nem podem entrar no jogo. «Nós só podemos criar jogadores a partir de uma idade específica, por questões legais. Só a partir dos 16 anos, mas depende da altura em que fazem 16. Se um miúdo fizer anos em dezembro, só podemos criá-lo no ano seguinte. Por exemplo, no FC Porto há um jogador que tem muito potencial, e que por acaso já se estreou na equipa B, mas ainda não está na base de dados. É o Rodrigo Mora. Já o conheço talvez há dois anos. Só que ele ainda não tem idade. Entra na próxima época.»

É a partir desse trabalho, feito como no scouting «a sério», que se definem os atributos e o potencial de cada jogador. Requer muita observação de jogos e também ponderação, nota Carlos Bessa, para que as expectativas não saiam furadas. «Poucos são os jogadores que não enganam. E mesmo os que não enganam acabam por enganar mesmo», sorri: «Portanto, isto de atribuir potencial não é feito de ânimo leve.»

A valorização que torna Schjelderup «menos apetecível»

É o potencial atribuído ao jogador - numa escala de 0 a 200 em que 180 é um jogador de classe mundial - que leva o jogo a defini-lo ou não como um wonderkid. No caso de Portugal, Carlos Bessa não avança com um número exato de jogadores que tenham esse estatuto, mas diz que «não há muitos».

A transferência de Schjelderup para o Benfica alterou os pressupostos. Agora, ele está mais valorizado, portanto já não é uma oportunidade tão boa para quem joga FM. «A partir do momento em que foi transferido da Liga dinamarquesa para o Benfica já deixa de ser um jogador tão apetecível», nota Carlos Bessa: «Alguém que queira contratar agora o Schjelderup já não vai buscá-lo por 10 milhões. É exatamente como na realidade. O jogo transporta as pessoas para a realidade, ou vice-versa.»

A atualização do valor de um jogador não passa pelos researchers. É feita pelo próprio jogo quando há uma transferência, explica Carlos Bessa: «A partir do momento em que o jogador muda, o valor de mercado desse jogador atualiza-se. Quando se compra um bom jogador no Brasil, como por exemplo o Pepê, do Grêmio, que veio para o Porto, automaticamente o valor vai subir, porque há uma valorização do jogador, que é feita pelo motor do jogo, pela inteligência artificial.»

E em Portugal, quem são os wonderkids?

Mas continua a haver boas oportunidades no jogo. O Maisfutebol desafiou Carlos Bessa a dar alguns exemplos de jogadores da base de dados portuguesa com alto potencial. Cá vão três sugestões de wonderkids, um para cada um dos chamados «grandes»:

«No FC Porto há o Martim Fernandes, do FC Porto B, que é lateral. É um jogador de enorme qualidade e tem um futuro tremendo à sua frente. É um jogador em quem temos muita confiança.»

«No caso do Sporting, há um que também não engana, que é o Rodrigo Ribeiro, ponta de lança. Também é um jogador em que acreditamos muito, ainda que não seja propriamente novidade, porque já se estreou pela equipa principal.»

«No Benfica temos o João Neves, médio. Mas lá está, também é um jogador que já se estreou pela equipa principal e até já jogou na Liga dos Campeões, acaba por não ser tanto uma novidade.

«Não são escolhas completamente desconhecidas, mas são miúdos que ainda estão a ganhar minutos e são algumas das grandes mais-valias que temos em Portugal. Temos outras, mas a escolher um de cada clube escolheria esses três.»

Benfica

Mais Benfica

Patrocinados