Esta quinta-feira é esperado um novo aumento das taxas de juro, pelo BCE, em 25 pontos base. Ainda há incerteza se será este o fim das subidas
O Banco Central Europeu (BCE) deverá anunciar esta quinta-feira um novo aumento das taxas de juro em 0,25 pontos percentuais, este é, pelo menos, o consenso que existe nos mercados. Uma decisão que deverá ser conhecida em Lisboa ao início da tarde, a que se seguirá, pouco depois, uma conferência de imprensa onde a líder do BCE, Christine Lagarde, deverá explicar os motivos da decisão, mas também deixar algumas pistas para as dúvidas que subsistem: será esta a última subida? As taxas vão ficar neste patamar durante muito tempo? Quando se poderá esperar uma descida das taxas de juro.
Para estas decisões, o BCE olhará, essencialmente, para o ritmo da subida dos preços, mas também para o andamento da atividade económica no conjunto dos países que partilham o euro. E se é verdade que a taxa de inflação na zona euro já caiu para 5,5% em junho, um valor que fica quase pela metade face ao pico de 10,6% atingido em outubro passado, não é menos verdade que o BCE tem defendido que a inflação continua “demasiado alta” e “continuará a sê-lo durante muito tempo”, pelo que ainda há muito caminho a percorrer.
Desde julho de 2022 o BCE já fez oito aumentos consecutivos das taxas de juro, num total de quatro pontos percentuais, uma política que tem vindo a replicar as decisões de vários bancos centrais em todo o mundo e que, entre os grandes bancos centrais, foi iniciada pela Reserva Federal (Fed) nos Estados Unidos da América (EUA). Ontem, a Fed decidiu aumentar as taxas de juro em 0,25 pontos percentuais, pelo que as Fed Funds passam assim a estar num intervalo entre 5,25% e 5,5%, o nível mais elevado em 22 anos. Ainda assim, o banco central norte-americano defende que a inflação permanece elevada.
A expectativa de uma aproximação das taxas de juro dos EUA e da zona euro tem dado, em parte, ânimo ao euro, que já cresceu em torno de 5% face ao dólar este ano. Uma moeda mais forte ajuda a controlar os preços no sentido em que as importações se tornam mais baratas, mas a inflação na zona euro não deverá regressar aos 2% pretendidos pelo BCE antes de 2025, segundo as previsões da instituição com sede em Frankfurt, na Alemanha.
Se do lado da inflação, o BCE poderá encontrar razões para a subida dos juros, do lado da atividade económica o cenário não é o mesmo. A economia da zona euro tem vindo a desacelerar de forma expressiva, mas para já, tem conseguido escapar a um cenário de recessão. Mesmo tendo em conta que o seu principal motor, a Alemanha, já está em recessão técnica, depois de ter registado dois trimestres consecutivos de crescimento negativo, primeiro no último trimestre do ano passado e, depois, no primeiro trimestre de 2022.
Taxas voltam a subir esta quinta?
Para Filipe Garcia, economista e presidente da IMF – Informação de Mercados Financeiros, uma surpresa seria se o BCE não aumentasse as taxas de juro já esta quinta-feira. Garcia considera que este é um cenário dado quase como garantido por Christine Lagarde e todos os membros do BCE, pelo que a taxa de depósito deverá atingir os 3,75%, enquanto a taxa de refinanciamento os 4,25%.
Este ponto de vista também é partilhado pelo BPI, que considera ainda que o BCE dará sinais em como pretende voltar a subir as taxas no outono, avança em nota sobre os mercados financeiros. Tal decisão iria reforçar a expetativa em como as taxas continuarão altas durante algum tempo.
Para Filipe Garcia, em termos de expectativas de mercado, “há neste momento cerca de 80% de probabilidade de haver mais uma subida até ao final do ano”, embora esta não tenha de ser obrigatoriamente em setembro. Com esta subida, encerrar-se-ia o ciclo de subida das taxas de juro, com a taxa de depósito a 4% e a taxa de referência a 4,5%.
Uma nova subida das taxas de juro teria, igualmente, um impacto nas taxas Euribor. Para o presidente da IMF, o mercado acha que a Euribor a 12 meses já está, provavelmente, na zona de máximos, enquanto a Euribor a 6 meses ainda terá um “pequeno espaço para subir”, provavelmente até setembro ou outubro. Já a Euribor a três meses ainda terá um “bom bocado para subir”, possivelmente até ao período entre outubro e novembro.
Como a Euribor a 12 meses já tem de contemplar a possibilidade de uma interrupção ou queda nas taxas de juro, é por isso que ela vai, provavelmente, começar a cair, defende Filipe Garcia, acrescentando que esta pode ser a Euribor que cairá mais depressa.
Já chegámos ao topo ou taxas de juro voltarão a subir?
Filipe Garcia refere que a inflação já esta a desacelerar, ainda que a inflação subjacente esteja a desacelerar menos, pelo que surge a questão, até que ponto vale a pena subir os juros a partir do nível em que já estamos? Do outro lado do Atlântico, a Fed, nos Estados Unidos, também pode influenciar esta questão já que não é comum os principais bancos centrais andarem em contraciclo.
Neste sentido, Filipe Garcia defende que tudo indica que o ciclo de aperto monetário, pela via das taxas de juro, está perto do fim. No entanto, o presidente da IMF confessa que “o mercado está a descontar que as taxas de juro de referência do BCE vão começar a cair a partir do final do primeiro semestre de 2024”, ou seja, teremos taxas de juro nos níveis atuais durante seis meses ou até mais um pouco, segundo estas expectativas.
O próprio BCE defende que, após atingirem o pico, as taxas de juro irão manter-se nesse patamar durante bastante tempo, pelo que uma interrupção da subida não implica descidas no curto prazo, defende o economista da IMF.
Contudo, o economista admite que, na sua opinião, pode haver lugar a uma queda mais pronunciada nas taxas em 2024. “Creio que quando começarem a descer, provavelmente descerão de uma forma mais rápida. Mas tenho de dizer, isto é futurologia”, ressalva. Ainda assim, Filipe Garcia defende que, provavelmente, já vimos o pior no que toca às subidas dos juros.
Também o BPI segue nesta direção, considerando que o pico da restritividade monetária já foi praticamente atingido, pelo que a nova estratégia, a partir daí, será manter. "A nossa previsão é que o BCE não começará a considerar uma primeira redução das taxas antes do verão de 2024", refere em nota.
O que vai influenciar futuras decisões?
O BCE tem dito que as suas decisões são dependentes dos dados económicos, sobretudo da inflação, esclarece Filipe Garcia. No entanto, o economista diz que também se nota cada vez mais desconforto com as subidas adicionais de juros, desde políticos, membros do BCE, a algumas instituições como o Fundo Monetário Internacional (FMI) ou a Organização para a Cooperação e para o Desenvolvimento Económico (OCDE).
No entanto, o economista acredita que a discussão em torno das taxas de juro se está a tornar mais política do que até ao momento. “Até à última reunião, o BCE agarrou-se muito à inflação para subir as taxas, mas começaram a surgir um conjunto de críticas, relativamente à necessidade destas subidas”, seja por parte de governos, seja por parte de membros do BCE, esclarece Filipe Garcia. Como tal, o presidente da IMF considera que uma parte do final deste ciclo de subidas irá advir dessa mesma divisão que começa a haver.
Por outro lado, também temos assistido a uma desaceleração da inflação numa grande quantidade de economias, continua o economista, bem como um conjunto de estudos que atribuem a inflação a fatores que pouco têm a ver com o BCE. “É discutível até que ponto a subida das taxas contribui de forma positiva para dissipar os constrangimentos logísticos, projeções de escassez, expansão de margens e a subida dos salários”.