Porque Putin quer tanto conquistar Bakhmut? Tudo o que precisa de saber sobre a mais dura batalha da guerra

CNN , Rob Picheta*
2 mar 2023, 08:00

As forças russas estão cada vez mais perto de capturar a cidade de Bakhmut, após semanas de sangrentos combates que gradualmente desgastaram uma resoluta resistência ucraniana.

Bakhmut não é o tipo de cidade pela qual Moscovo esperava estar a lutar no segundo ano da sua invasão - é um local relativamente pequeno no leste de Donetsk, que permaneceu fora do alcance da fraca campanha terrestre da Rússia durante muitos meses.

Mas a sua captura representaria algum progresso militar para o presidente russo, Vladimir Putin, e daria às suas forças a oportunidade de lançar ataques aéreos em áreas urbanas mais a oeste.

Eis o que precisa de saber sobre a batalha por Bakhmut.

Porque é que Bakhmut está em foco?

O maior desafio da Ucrânia neste momento é defender Bakhmut, disse o presidente Volodymyr Zelensky na sua mensagem de vídeo na noite de terça-feira.

As tropas russas têm conseguido ganhos incrementais em torno da cidade, mas as forças ucranianas ainda não recuaram, criando um impasse que lembra batalhas que se arrastaram noutras cidades do leste, como Severodonetsk, no ano passado.

No sábado, as forças armadas da Ucrânia disseram no seu canal no Telegram que "o inimigo continua a tentar romper as defesas e tomar Bakhmut" e que o comandante do Grupo Militar do Leste da Ucrânia, o coronel-general Oleksandr Syrskyi, tinha visitado as unidades que estão a defender a cidade.

Alexander Rodnyansky, conselheiro de Zelenksy, disse à CNN na terça-feira que "a situação é difícil". "Não há nenhum segredo sobre isso", sublinhou.

"A Rússia está a tentar cercá-la neste momento e está a utilizar as suas melhores tropas da Wagner, aparentemente as mais bem treinadas e experientes", acrescentou o conselheiro. "Os nossos militares vão obviamente pesar todas as opções. Até agora, eles têm segurado a cidade, mas, se for necessário, recuarão estrategicamente, porque não vamos sacrificar toda a nossa gente para nada."

Os militares ucranianos também confirmaram que as forças russas estão a empregar os combatentes mais experientes da Wagner enquanto tentam capturar a cidade.

O que está a acontecer no terreno?

Ainda há cerca de 4.500 civis em Bakhmut, incluindo 48 crianças, disse a porta-voz da administração militar regional ucraniana de Donetsk, Tetiana Ignatchenko, à CNN, na quarta-feira.

Ela apelou às pessoas para deixarem a cidade devido ao perigo, mas também garantiu que têm mantimentos suficientes.

"Há comida, água e medicamentos na cidade. As pessoas receberam tudo com antecedência", disse Ignatchenko. "Mesmo assim, todos têm de partir. A situação é extremamente perigosa para os civis."

Ucranianos veem televisão num centro de ajuda humanitária em Bakhmut. Dimitar Dilkoff/AFP/Getty Images

Um militar da 93.ª Brigada da Ucrânia diz que as forças do seu país estão a resistir em Bakhmut, sem planos para uma retirada.

"Estamos de pé em Bakhmut. Ninguém vai recuar ainda", disse o soldado num vídeo divulgado pelos militares ucranianos na quarta-feira. "Estamos de pé. Bakhmut é a Ucrânia."

O militar também afirmou que a situação em Bakhmut estava um pouco mais calma do que nos dias anteriores.

"Abafámos um pouco o inimigo. Está um pouco mais calmo, mas ainda há tiroteios na periferia", indicou. "Há explosões isoladas, há bombas no ar."

Mas as tropas ucranianas reconhecem que está a tornar-se mais difícil manter a cidade à medida que as rotas do oeste são espremidas pelas forças russas, que avançaram tanto para o norte como para o sul de Bakhmut.

"A situação em Bakhmut é agora muito difícil. É muito pior do que foi oficialmente noticiado", contou à CNN, na terça-feira, um militar que não quis ser identificado. "Em todas as direções. Especialmente na direção norte, onde os russos conseguiram o maior avanço entre Berkhivka e Yahidne."

O que é que Bakhmut significa para a guerra?

A cidade situa-se a nordeste da região de Donetsk, a cerca de 21 quilómetros da região de Lugansk, e tem sido alvo das forças russas há meses. Desde o verão passado, a cidade tem estado a um passo das linhas da frente, pelo que a sua captura representaria um sucesso há muito almejado pelas forças de Moscovo - e traria algum valor estratégico limitado.

A cidade tem importantes ligações rodoviárias com outras partes da região de Donetsk; a leste até à fronteira com Lugansk, a noroeste com Sloviansk e a sudoeste com Kostiantynivka.

Durante várias semanas as rotas para Bakhmut têm vindo gradualmente a ficar sob o controlo das forças russas. Em vez de se dirigirem diretamente para o centro da cidade, os grupos da Wagner procuraram cercar a cidade num amplo arco a partir do norte. Em janeiro, reivindicaram a cidade vizinha de Soledar e, desde então, tomaram uma série de aldeias e vilas a norte de Bakhmut.

Se os russos tomarem o terreno elevado a oeste, as cidades industriais vizinhas de Kostiantynivka e Kramatorsk estarão à mercê da sua artilharia e até de armas de maior alcance. E não é claro para onde exatamente as forças ucranianas recuariam caso se retirassem da cidade.

Mas os especialistas dizem que capturar Bakhmut não alterará, provavelmente, o quadro geral da guerra no leste da Ucrânia, onde pouco território mudou de mãos em 2023. E isso assinalaria, de certa forma, os fracassos da invasão russa: no início do segundo ano de guerra, a captura de uma cidade relativamente pequena exigiu um ataque tão longo e dispendioso.

Porque é que Putin a quer?

Embora a importância estratégica de Bakhmut não deva ser sobrestimada, a sua captura poderia ainda assim ter um impacto simbólico muito bem-vindo para Vladimir Putin.

Quando as tropas russas tomaram a cidade de Soledar em meados de janeiro, isso marcou um primeiro ganho no Donbass durante meses. Seis semanas depois, a captura de Bakhmut representaria a conclusão do passo seguinte.

Também é importante para o oligarca Yevgeny Prigozhin, que dirige o grupo Wagner e tem criticado frequentemente a gestão do Ministério da Defesa russo da "Operação Militar Especial" na Ucrânia.

Os combatentes Wagner, muitos deles ex-reclusos, sofreram pesadas baixas no que se tornou um campo de batalha de trincheiras e lama, reminiscente da Primeira Guerra Mundial. Após meses em que o Ministério da Defesa russo nada fez além de recuar, Prigozhin tem feito questão de mostrar que os seus homens conseguem cumprir o que prometeram, primeiro com a tomada de Soledar e agora de Bakhmut.

No entanto, as questões urgentes permanecerão para Putin mesmo que as suas forças consigam um ataque bem sucedido a Bakhmut.

"O espectro da mão-de-obra russa ilimitada é um mito. Putin já foi forçado a fazer escolhas difíceis e abaixo do desejado para compensar as terríveis perdas que a sua guerra infligiu aos militares russos, e enfrentará escolhas igualmente difíceis em 2023 se persistir na sua determinação de usar a força militar para impor a sua vontade à Ucrânia e ao Ocidente", escreveu o think tank norte-americano Institute for the Study of War [Instituto para o Estudo da Guerra, na tradução para português], no domingo, numa atualização sobre o estado das forças e do poder de fogo russos.

"A Rússia pode mobilizar mais mão-de-obra e Putin, provavelmente, fá-lo-á em vez de desistir. Mas os custos para Putin e para a Rússia das medidas que ele provavelmente terá de tomar neste momento vão começar a aumentar rapidamente", escreveu o instituto.

*Tim Lister, Vasco Cotovio, Olga Voitovych, Jessie Gretener, Eleanor Pickston e Laura Ford contribuíram para este artigo

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