Trocar as papas e as sopas pelos alimentos inteiros não é uma novidade no mundo da alimentação infantil, mas as redes sociais têm feito do método BLW uma verdadeira tendência entre os pais. Há riscos? Há. Sobretudo quando a pressa é muita. Mas os benefícios são superiores
Um pedaço de brócolos cozidos numa mão, uma fatia de manga na outra. Há cada vez mais pais a trocar as papas e sopas raladas por alimentos sólidos mesmo quando os bebés ainda não têm dentes para os mastigar. Esta introdução alimentar guiada pelo bebé tem o nome de método Baby Led-Weaning (BLW), não é de agora, mas faz furor nas redes sociais. Só no Instagram são mais de três milhões as publicações marcadas com #BLW e quase um milhão as dedicadas apenas a dar ideias de refeições sólidas para bebés.
Há riscos? Há, sobretudo, quando a pressa é muita. Mas os benefícios são superiores, mas é preciso supervisão e perceber se o bebé está ou não apto para aderir. Afinal, é ele quem manda.
“O bebé dirige o processo desde o início, de forma autónoma, de acordo com o seu ritmo e escolhas no momento da refeição”, começa por explicar Mariana Capela, médica pediatra e pós-graduada em Nutrição Pediátrica, que diz que este método pode promover uma “boa relação com a comida”. “Assume-se que o bebé tem capacidade para se autorregular, consegue alimentar-se sozinho e sabe que quantidade de comida necessita”, acrescenta Ana Rita Silva, especialista em Nutrição e Saúde Materno-Infantil.
Como saber se o bebé está pronto para comer sozinho
Criado por Gill Rapley - que falou pela primeira vez desta técnica há 23 anos -, o método Baby Led-Weaning estimula a autonomia do bebé, dando-lhe a possibilidade de explorar (a nível de tato e palato) alimentos por sua conta própria, levando-os à boca como e quando quer, manuseando-os como bem entender. O aconselhado é que esta forma de alimentar seja feita a partir dos seis meses - e não antes - e o prato deve ser composto por pedaços - não muito pequenos nem duros - de vegetais e proteínas (como frango) cozidos e fruta, devendo a variedade e a quantidade dos alimentos ser adaptada ao crescimento da criança. No entanto, adianta a pediatra do Hospital Lusíadas Porto, “mais do que uma data, o importante é que o bebé apresente sinais de prontidão para esta nova etapa”, sendo que, diz, “raramente aos quatro meses um bebé está pronto e o BLW não está aconselhado nesta idade”.
Entre os sinais de prontidão estão a capacidade de o bebé “ficar sentado, direito, no colo sem ou com algum apoio” e de “agarrar o alimento e levá-lo à boca”, esclarece a nutricionista Ana Rita Silva, que diz que é ainda fundamental que o bebé consiga fazer “movimentos mastigatórios”, mostre “interesse pelos alimentos” e que não apresente “reflexo de extrusão, que consiste em rejeitar qualquer alimento que não seja leite, expulsando-o da boca com a língua”.
O bebé come sozinho, decide quando e que alimento leva à boca, mas jamais o deve fazer sem supervisão. É aconselhado que os pais ou cuidadores tenham a menor interferência possível quando o bebé se alimenta, mas importa estar atento.
O que incluir no BLW
Mais do que o tipo de alimento, importa a forma e a textura do mesmo. No prato devem estar alimentos cortados em pedaços não muito pequenos e aconselha-se que não sejam também muito redondos, pois podem ‘escorregar’ nas gengivas quando o bebé os tenta morder. “Os alimentos devem ser apresentados com uma consistência adequada, de forma que o bebé os consiga desfazer com a boca (gengivas), devem por isso desfazer-se facilmente entre os nossos dedos”, adianta Ana Rita Silva.
“Banana madura, brócolos, abacate, manga madura ou batata-doce” são algumas opções, exemplifica a nutricionista. Há ainda em que opte por panquecas de frutas ou vegetais, acrescentado uma outra fonte de hidrato de carbono à refeição.
O tamanho do que é colocado no prato deve ser adequado à idade ao bebé. Até aos nove meses, os bebés devem apenas ingerir alimentos com “a largura de dois dedos e o comprimento de um dedo”, de forma que “sobressaia o equivalente ao tamanho de um polegar” assim que o bebé agarra o alimento com a mão, esclarece a nutricionista. A partir dos nove meses, se o bebé se mostrar pronto, é possível começar a incluir pedaços um pouco mais pequenos.
Deve-se evitar “frutos secos, grãos crus, azeitonas, uvas, mirtilos ou cerejas inteiras”, diz a nutricionista. É ainda desaconselhado incluir alimentos muito duros, como cenoura crua e maçãs. É importante que o bebé não tenha sono durante a hora da refeição, assim como não é recomendado que tenha “demasiada fome, pois vai comer muito depressa”, continua.
Benefícios de deixar o bebé aos comandos
O estímulo de uma “boa relação com a comida” é apontado como um dos principais benefícios deste método, que dá ao bebé o poder de escolha e não uma alimentação por imposição, vinca a pediatra Mariana Capela.
Ana Rita Silva afirma que “existem estudos que referem que este é um método que promove a autonomia e autorregulação” do bebé, pois dá-lhe um “papel ativo” na sua alimentação: “sabe o que comer, em que quantidade e em que ritmo o vai fazer”. E para que haja, logo desde cedo, esta consciência, é importante que os pais não tirem alimentos da boca do bebé, uma vez que assim “nunca aprenderá a quantidade que consegue gerir”.
Além disso, continua a nutricionista do Hospital Lusíadas Lisboa, dar esta autonomia ao bebé “favorece a estimulação sensorial”, em que desde cedo lida com a textura do alimento, seja nas mãos ou na boca, o que não acontece se o comer apenas triturado. A “psicomotricidade fina” fica também melhorada, assim como “a coordenação olho-mão” e “a musculatura oro-facial durante a mastigação, que estimula o desenvolvimento adequado da dentição e melhora a linguagem”, continua Ana Rita Silva.
Mas é este um método para todas as crianças? Não. Assim como não é para todas as famílias, dizem as especialistas. Embora apontem vários benefícios a este método, alertam que pode até nem fazer sentido ser a única forma de o bebé se alimentar. Ana Rita Silva é mesmo apologista da inclusão da sopa, “um alimento tradicional na nossa cultura e que não devemos deixar de o introduzir mesmo escolhendo o método BLW”.
Há riscos? Sim. E o principal é a falta de informação
“Os riscos estão associados essencialmente à falta de informação. Caso os pais não saibam os sinais de prontidão, a forma como os alimentos devem ser cozinhados e apresentados ao bebé, que alimentos oferecer e quais os alimentos proibidos”, alerta Ana Rita Silva. Também a pediatra Mariana Capela defende que os pais devem informar-se antes de adotar este método em casa. “O que verifico é que os pais altamente motivados para o BLW por vezes estão mais informados e preparados”, reconhece a médica.
“Devem estar devidamente informados, como todos os pais que iniciam a diversificação alimentar. É o mais importante. Devem conhecer os cortes seguros e métodos de confeção dos alimentos, para evitar risco de engasgamento. E devem estar a par do que é necessário para uma alimentação variada e saudável, como todos os pais”, frisa a pediatra.
Sobre este ponto da variedade alimentar, a nutricionista Ana Rita Silva afirma que existem “alguns autores” que reportam que no início da introdução alimentar “há défice quanto à ingestão de ferro e de energia em bebés que fazem exclusivamente BLW quando comparados com o método tradicional”, porém, assegura que “estas diferenças não são significadas, e perto dos nove meses essas diferenças deixam de existir”.
O risco de o bebé se engasgar é também uma das principais preocupações, mas sobre isto, a pediatra diz que, se forem seguidos os conselhos e o bebé estiver pronto, o método é seguro. “O risco de engasgamento está presente em todos os bebés. Porque mesmo que o método adotado não seja o BLW, o bebé vai ter de variar texturas na sua alimentação e vai ter de introduzir os sólidos”, diz. E “se se engasgar”, continua a nutricionista, deve-se “retirar o bebé da cadeira, colocá-lo no seu colo e dar-lhe uma pancada forte entre as omoplatas”, aconselha Ana Rita Silva.
No entanto, este método acaba por ter um efeito completamente oposto a longo prazo. “Ao deixar a criança comer com autonomia, ela descobre por si que quantidade de comida pode ingerir e adquire precocemente a prática de mastigar antes de engolir”, reduzindo, assim, o risco de se engasgar.