«Quando aprendi a gostar do Lourosa, o sentimento foi mais verdadeiro»

24 jun 2020, 09:10

De uma viagem de quase 30 horas sem dormir para ver um jogo na Madeira a sair a meio do trabalho. Hélder Silva e uma ligação incondicional ao clube da terra

«Até ao Fim» é uma rubrica do Maisfutebol que visita adeptos que tenham uma paixão incondicional por um clube e uma história para contar. Críticas e sugestões para rjc.externo@medcap.pt

O leão plasmado no símbolo do Lusitânia de Lourosa é igual união de Hélder Silva ao clube da terra.

Foi atleta das camadas jovens durante três anos. Via jogar a equipa principal, foi sócio e depois deixou de ser, até voltar após algumas incompatibilidades em acompanhar, fruto da atividade profissional. Hoje, vive o renascer do Lourosa, de há uns anos a esta parte, com o regresso aos campeonatos nacionais e estádios praticamente cheios em várias jornadas.

«Neste sucesso mais recente, desportivamente e em infraestruturas, houve mérito da direção em adaptar-se à nova geração, que tem mais interação pelas redes sociais. E terem ido às escolas, aproximarem-se dos miúdos… também ofertas de bilhetes na compra de merchandising do clube. Tudo acaba por aproximar o adepto. Claro que o resultado desportivo é importante, mas sempre tivemos a rotina de, ao domingo à tarde, ver o Lourosa. Se calhar, se mudarmos a hora do jogo para sábado à tarde, temos menos pessoas a ver, porque é rotina ir ao domingo», nota Hélder.

Ver o Lourosa ao domingo é como um ritual. Aquele que trás histórias e memórias de tarde de glória e apoio aos leões.

Lembra-se de jogos contra o Leixões, Varzim ou Vila Real quando era miúdo: «tenho essas memórias porque os meus pais trabalhavam muito e ao domingo deixavam-me ir ver futebol». Mais recentemente, fazer mais de 300 quilómetros e mais de três horas de viagem, entre ida e volta, para ver um jogo em Leiria que foi… à porta fechada. Foi no play-off de subida à II Liga, na época 2018/2019, na segunda mão dos quartos de final. Apoio não faltou, mesmo na hora da derrota por 2-0.

«Em casa perdemos 3-2 e eu acreditei que era importante estarmos lá, que íamos ganhar ao Leiria, já tínhamos conseguido boas vitórias fora. Como eu, estavam lá mais adeptos, a equipa recebeu-nos e sentiu que não estava sozinha. Tivemos a sorte de ver o jogo, foi transmitido nos ecrãs fora do estádio. Quando viemos embora, estive no estádio com mais pessoas à espera da equipa», recorda.

Entre as «coisas fora da caixa» que já fez, está uma viagem para ver o Lourosa na Madeira, ante o Marítimo B: mais de um dia inteiro sem dormir, entre duas viagens de avião e jogo. «Estive cerca de 30 horas sem dormir, saí de cá, fui ver o jogo e vim embora na mesma madrugada. Em termos profissionais, vou tendo alguma vantagem no controlo de horários, mas já aconteceu sair a meio do dia do trabalho, ver um jogo e regressar para trabalhar… nem sempre com boa disposição», acrescenta.

E também caminhadas a pé até Fiães para assistir a um jogo frente ao Sp. Espinho, repetindo o que já tinha sido feito para jogos ante o Lamas ou o Fiães. «Na época passada, chovia torrencialmente em Vildemoinhos e estávamos lá», completa.

«Eu levo a família a ver futebol e não estou à beira dela»

É nessas ações de paixão pelo clube e na forma como vive o futebol que, assume, é uma pessoa «completamente diferente a ver um jogo».

«Eu se pudesse - poder até posso - medir o batimento cardíaco, o número de passos, de degraus que desço e subo… eu não paro quieto. Eu salto, eu grito, transformo-me. Eu sou calmo, mas no futebol sou uma pessoa transfigurada. Durante aqueles 90 minutos, vivo para aquilo. Tenho responsabilidade no trabalho e peço, entre as 15 e as 17 horas, se possível, para não interromperem. Porque é o meu momento. A minha família já sabe. Eu levo a família a ver futebol comigo e não estou à beira dela, porque a pessoa que eles conhecem, dentro do futebol é outra», assinala.

«Fui ensinado a gostar de uma coisa, mas aprendi a gostar de outra»

Hélder vinca: não há, para si, outro clube a apoiar além do Lourosa.

Cresceu e foi educado por pessoas da cidade do Porto e com ligação emocional ao FC Porto. Contudo, o gosto divergiu com o tempo. «Quando aprendi a gostar do Lourosa, o sentimento foi mais verdadeiro. Gosto de ir ver o Lourosa, estou com as pessoas da Armada Lusitana [ndr: claque], com os outros adeptos, conhecemo-nos. É gratificante, é outro sabor. O sucesso desportivo ajuda, mas já vi o Lourosa a descer duas ou três vezes. Custou, mas mesmo sabendo que o Lourosa estava matematicamente descido, eu ia, é a paixão. Em quatro, cinco épocas, perdi um ou dois jogos por época, se tanto», atira.

À filha, de quatro anos, vai tentando, entre brincadeira, criar o «bichinho» para que ela o acompanhe nos domingos de bola. Se não for por mais, pela importância de «mostrar do que gostamos».

Retém na memória vitórias ante o rival União de Lamas, subidas dos campeonatos distritais aos nacionais, a festa em Padrão da Légua com a subida da III à II B em 2006. A história meia-final da Taça de Portugal ante o Sporting em 1994. Ou uma «época fantástica» com o atual técnico do Olympiakos, Pedro Martins, ao leme dos leões, em 2009. «Foi uma época positiva para nós. Subiu o Penafiel, curiosamente o treinador era o Rui Quinta [atual técnico do Lourosa]».

No meio de tudo e tanto, um desejo inegável de chegar pela primeira vez às ligas profissionais. «Tenho o sonho de ver o Lourosa na primeira, a receber equipas como o V. Guimarães, que a defender a sua terra é do melhor que temos em Portugal. Receber FC Porto, Benfica ou Sporting no nosso estádio, no mesmo campeonato. Até porque temos aquela curiosidade: será que vamos ter a mesma falange de apoio? Nós acreditamos que sim», remata.

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