Um serviço de café e duas camisolas. Apenas três presentes a deputados foram registados em toda a legislatura

13 fev 2022, 17:00
Rui Rio com Fernando Gomes (2020)

Nenhuma das ofertas ultrapassava o limite dos 150 euros. Mas, ainda assim, foram ao crivo da secretaria-geral da Assembleia da República. Foram aceites por cortesia a quem os ofereceu, dizem os deputados que fizeram o registo

O tema gerou muita discussão: a partir de que valor deviam os deputados comunicar as ofertas recebidas? Os parlamentares iniciaram a legislatura, em outubro de 2019, já com novas regras, tendo de registar todas as ofertas superiores a 150 euros.

Mas, nos casos em que exista dúvida sobre o valor, os deputados também devem recorrer à secretaria-geral da Assembleia da República (AR) para a respetiva avaliação. Foi isso que aconteceu nos três casos identificados no Registo de ofertas, deslocações e hospitalidades. Não houve qualquer deputado a fazer o registo de presentes sabendo, à partida, que estavam acima do limite permitido.

Fonte oficial da AR confirmou à CNN Portugal que os dados disponíveis “online” são os mais atualizados nesta matéria. Ana Catarina Mendes, André Coelho Lima e Rui Rio foram os três únicos deputados a registar, durante a última legislatura, presentes que lhes foram oferecidos. Nenhum tinha um valor superior a 150 euros, mas quiseram “dar o exemplo”, segundo admitem à CNN Portugal. 

Foi enquanto presidente do Grupo Parlamentar de Amizade Portugal-China que a Ana Catarina Mendes recebeu “um serviço completo de café” da parte do embaixador da China em Portugal, em março de 2021. O presente acabou avaliado pela AR em 60 euros, com indicação de “devolução ao deputado”. Mas, à CNN Portugal, a socialista diz que não sabe onde acabou a oferta. “Nem nunca mais me lembrei disso. Até deverá ter ficado na secretaria-geral”, conta. A então líder parlamentar reforça que se limitou a cumprir a lei: “Mesmo sendo abaixo do valor, declaro. Fiz aquilo que me compete”.

Os outros dois presentes registados são (praticamente) iguais: uma camisola da seleção nacional personalizada. Em junho de 2020, Rui Rio e André Coelho Lima visitaram a Cidade do Futebol, a convite do presidente da Federação Portuguesa de Futebol, Fernando Gomes. Embora o tenham feito enquanto “dirigentes partidários”, como presidente e vice-presidente do PSD, optaram por registar o presente para “dar o exemplo”. Os serviços da AR acabaram por avaliar o presente em 100 euros, abaixo do limite definido. “Foi uma visita do presidente do presidente do PSD à FPF, que teve a delicadeza de as oferecer”, recorda André Coelho Lima à CNN Portugal.

Novas regras entraram em vigor no início da atual legislatura, que está praticamente a terminar

As regras, à boleia do GalpGate

Para não “condicionar a independência” dos deputados, as regras definem que devem abster-se de receber ofertas acima dos 150 euros. Não aceitar é a regra. Contudo, há exceções a ter em conta: se existirem dúvidas sobre o valor ou quando a recusa puder ser entendida como falta de consideração por quem oferece.

Nestas condições, ao aceitarem prendas acima dos 150 euros ou cujo valor desconheçam, os parlamentares devem apresentá-las ao organismo definido no código de conduta. É a secretaria-geral da Assembleia da República que avalia o destino desses presentes, que podem terminar na biblioteca ou no Museu do Parlamento, por exemplo. Se o valor for inferior ao definido, podem também ser devolvidos aos deputados – o que aconteceu nestes três casos, segundo os registos.

A criação de códigos de conduta para os titulares de cargos públicos foi precipitada pelo caso GalpGate, depois de três secretários de Estado terem viajado em 2016 até França para assistir a jogos do Europeu de Futebol a convite da Galp. Foram eles Fernando Rocha Andrade (Assuntos Fiscais), Jorge Costa Oliveira (Internacionalização) e João Vasconcelos (Indústria), que acabaram por apresentar a demissão. À boleia desta polémica, os governantes passaram a estar proibidos de aceitar presentes acima dos 150 euros. Um patamar que se replicou mais tarde para os deputados.

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