Cada ilha é independente das outras. E todas são muito mais prudentes no recurso a centrais eólicas e solares
Os Açores estão mais seguros do que o Continente quanto à ocorrência de um apagão como o que deixou a Península Ibérica desligada às 11:33 no dia 28 de abril. O arquipélago limita a penetração de energias renováveis, de fonte intermitente e incontrolável, para salvaguardar a segurança do abastecimento às famílias e empresas.
“É tudo uma questão de controlo. Não conseguimos controlar, a cada momento, a potência da energia solar fotovoltaica. E controlamos muito pouco a eólica”, expõe Félix Rodrigues, administrador da EDA Renováveis, braço da empresa pública de eletricidade dos Açores vocacionado para as tecnologias da transição energética.
Na ilha Terceira, por exemplo, a EDA desliga da rede um dos dois parques eólicos durante a noite. E, há uns anos, chumbou uma grande central de painéis solares. “Havia a proposta para a instalação de um sistema fotovoltaico, mas o gestor da rede achava que era excessivo, porque a potência já estava ocupada por outras fontes: as duas centrais eólicas e uma central de cogeração a partir do lixo”, recorda Pinto de Sá, professor do Instituto Superior do Técnico, autor de um estudo técnico com esse propósito.
As restrições às formas intermitentes de energia sobem à medida que diminui a dimensão de cada uma das nove ilhas. “No Corvo, por exemplo, se a energia fotovoltaica resultante do autoconsumo aparece de repente, se não houvesse controlo ela poderia levar ao colapso da rede”, adverte Félix Rodrigues.
Os limiares do descontrolo
O controlo assenta no recurso a centrais termoelétricas e hídricas, com as suas pesadas turbinas mecânicas, que garantem às redes elétricas uma resposta automática a flutuações súbitas e inesperadas. As centrais mecânicas a diesel e geotérmicas, a partir de água quente e vapores extraídos do subsolo, garantem 85% dos consumos elétricos dos Açores, de acordo com o Relatório de Gestão da EDA relativo ao ano de 2023, o mais recente disponível online.
As turbinas hídricas, que também contribuem para a inércia e segurança do sistema, garantem mais 4% da eletricidade. No sentido oposto, juntas, as centrais eólicas e solares representaram, em 2023, apenas 9% da eletricidade do arquipélago.
Félix Rodrigues fala num limite técnico, nas ilhas, de 30% de potências intermitentes. No momento do apagão, 80% da eletricidade de Portugal e Espanha provinha de fontes renováveis, 78% da qual solar e eólica.
As ilhas também têm planos para aumentar a penetração de energias conotadas com a descarbonização e a transição energética. A aposta estratégica, contudo, não passa pela multiplicação de fontes intermitentes, mas antes pela substituição do diesel, nos geradores das centrais termoelétricas, por combustíveis mais amigos do ambiente. “No futuro, quando tivermos excesso de energia renovável nos Açores, poderemos utiliza-la para produzir hidrogénio ou um combustível sintético para as nossas centrais termoelétricas”, antecipa Félix Rodrigues.
O administrador salvaguarda que é preciso fazer contas e esperar pela maturidade dessas tecnologias, porque a EDA Renováveis, muito embora pública, “como qualquer outra empresa não existe para dar prejuízo”.