Decisão surge num contexto em que Luís Montenegro foi acusado de "atacar deliberadamente a RTP". Por outro lado, António José Teixeira, o diretor demitido, desmente um dos argumentos do presidente do conselho de administração do canal, que apontou a queda de audiências da RTP3 como um dos fatores para o despedimento de toda a direção de informação do canal público
O ex-diretor de informação da RTP António José Teixeira considera “falso” o argumento apresentado pelo presidente do conselho de administração do canal, Nicolau Santos, que justificou a demissão da direção de informação com a queda de audiências da RTP3.
Num artigo de opinião assinado esta quarta-feira no jornal Público, intitulado “Em nome da verdade”, o jornalista diz que a sua demissão e a dos seus restantes colegas da direção de informação “parece estar apenas em causa a audiência de um só canal, a RTP3, que se diz continuar a afundar - é falso”. Para António José Teixeira, esta “não é uma questão de opinião. É factual” e apresenta dados: “No presente trimestre está acima do período homólogo de 2024. Em 2024, teve o mesmo share de 2023. Em 2024, os nossos concorrentes diretos perderam audiência, ao contrário da RTP3”.
Com esta declaração, o ex-diretor de informação da RTP desmente o que Nicolau Santos, que lidera do conselho de administração, escreveu há dois dias, também num artigo de opinião no Jornal Público e no qual se lê que “a RTP3 continuou a cair nas audiências, foi ultrapassada por um canal recém-chegado ao mercado e tornou-se o canal informativo diário que menos interessa aos espectadores portugueses” e que, por isso, “recuperar as audiências da RTP3” foi um dos motivos “que estiveram na base da decisão do CA de provocar uma alteração profunda no organograma da empresa”.
António José Teixeira escreve que “há vários anos que alertamos e insistimos na necessidade de renovação dos estúdios, das condições de trabalho na redação, da sua organização e da imagem da informação” e que foi por “iniciativa” da direção de informação “que se avançou para um novo estúdio de informação no Porto, dois estúdios completamente remodelados em Lisboa, uma nova imagem para a informação e a reformatação do canal de informação, incluindo a sua marca”. No entanto, revela que, “por alguma razão, até agora por explicar, se quis interromper este processo”, embora estivesse a ser trabalhado, segundo diz, “com todas as áreas da empresa e com o acompanhamento permanente de um vogal da administração da RTP e a assessoria técnica e editorial da EBU”.
No final do seu texto de opinião, o ex-diretor de informação da RTP diz ter “orgulho no trabalho realizado” e defende que “os portugueses precisam de uma RTP livre e independente, que não mude ao sabor de equívocos ou dos ciclos políticos”. Embora não mencione diretamente qualquer pressão política na decisão da demissão, admite que as “pressões existiram, existem e existirão sempre”.
A questão de uma eventual pressão política na mudança da direção da RTP - agora a cargo de Vítor Gonçalves - foi levantada no dia 27 por Pedro Adão e Silva, que escreveu também no jornal Público um artigo de opinião no qual diz que estamos perante “um despedimento na RTP que nos deve preocupar”. O sociólogo e ex-ministro da Cultura diz que “após a sucessão de ataques de que a RTP foi alvo, vindos diretamente do centro do poder, é um sinal errado exonerar o seu diretor de Informação”. Pedro Adão e Silva refere-se a uma notícia do Observador de “que ‘no núcleo duro do Governo se suspeitava de uma estratégia concertada de alguns órgãos de comunicação social, em especial a RTP’, que revelava uma ‘atitude hostil’”. “Em campanha, recordamos a indignação de Montenegro ao reagir a uma questão sobre a Spinumviva, acusando a RTP ‘de estar empenhadíssima’ no caso. A pergunta fora feita por um repórter da SIC”, dá também como exemplo.
Em resposta a Pedro Adão e Silva, Nicolau Santos, presidente do conselho de administração da RTP, vincou: “Pois que fique desde já muito claro: nas mudanças que agora ocorreram na RTP não houve qualquer interferência do poder político. Tratou-se de decisões absolutamente soberanas e de responsabilidade exclusiva dos três membros do conselho de administração”. Estas declarações já mereceram uma nova resposta por parte de Adão e Silva, que esta quarta-feira volta a falar em “ataque político dirigido à RTP”, num texto no "Público". “Isto é tão óbvio que custa a compreender como é que o presidente do conselho de administração da empresa, Nicolau Santos, num artigo que me dirige, insiste em não perceber nem os riscos nem os sinais dados quando demite o diretor de informação com argumentos trôpegos, sem consultar o conselho de redação e na ressaca de um ataque político dirigido à RTP, perpetrado pelo primeiro-ministro”, lê-se no texto, no qual volta a dizer que “Luís Montenegro atacou deliberadamente a informação da RTP”.