António José Seguro, a primeira grande entrevista na CNN Portugal: a candidatura à Presidência, a mágoa que não tem de Costa e a vida política que não passa pelo PS

22 nov 2024, 02:00

António José Seguro, 62 anos, foi secretário-geral do PS, derrotado por António Costa, depois de ter vencido duas eleições. E desde então, setembro de 2014, tem estado em absoluto silêncio. É hoje professor universitário e investigador e na próxima semana inicia um espaço de análise e comentário em direto na CNN Portugal, "Liberdade". Mas antes, a primeira grande entrevista ao fim de dez anos, em direto do Instituto de Ciências Sociais e Políticas de Lisboa, com todos os temas em cima da mesa. A entrevista foi conduzida por Nuno Santos e João Póvoa Marinheiro

Bem-vindo de volta. E bem-vindos também a esta universidade. Vamos começar exatamente por aí, a pergunta é essencial. Estamos num local onde dedicou muito tempo nestes últimos dez anos, desde que abandonou a vida política, mas dez anos depois aqui está, de volta, para quebrar um longo silêncio. Porque é que regressa e porque é que regressa agora?

Bem, como se recordam, há dez anos eu cumpri a minha palavra, afastei-me da vida política e fui à minha vida. Regressei à universidade para dar aulas, conclui o meu mestrado, estou na fase final do meu doutoramento e também, simultaneamente, lancei-me, enfim, não direi na vida empresarial, mas criando microempresas na área da alimentação, na área do turismo e também na agricultura. Vejam lá as voltas que a vida dá, portanto, produzindo hoje vinho e azeite. E depois também há uma segunda razão. Eu considero que o meu sucessor na liderança do Partido Socialista devia ter todas as condições e todo o espaço para afirmar a sua alternativa, o seu projeto político, sem constrangimentos e, portanto, esse foi também o meu contributo para a união e a unidade do Partido Socialista.

Este seu regresso está relacionado com uma entrevista recente, a última que Pedro Nuno Santos deu à TVI/CNN Portugal, onde escolheu o seu nome como um nome presidenciável. Quer ser candidato à Presidência da República?

Não está relacionado, aliás, sabem que eu aceitei o vosso convite, dei o sim antes precisamente dessa entrevista, mas o tema, que não estava em cima da mesa, está em cima da mesa, por causa da declaração que muito me sensibilizou do secretário-geral do Partido Socialista, ao me incluir na lista de candidatos à Presidência da República.

E desconhecia que ele ia fazer essa referência?

Completamente. Eu, aliás, nestes dez anos em que saí da vida política, não tive absolutamente nenhum contacto, nenhuma conversa com o Dr. Pedro Nuno Santos, hoje secretário-geral do Partido Socialista.

A minha decisão de vir fazer comentário político, de ter um espaço, é a resposta a uma preocupação que tenho muito grande com a situação do país. Eu olho para o país e não gosto do que vejo, vejo um Estado a abrir fendas, vejo uma sociedade a deslaçar, vejo a qualidade política e da nossa democracia a diminuir, vejo serviços públicos a recuar e a minha obrigação é dar o meu contributo, neste caso no espaço público, através da palavra, do comentário e da análise.

Já poderemos entrar em detalhe nisso tudo, vamos falar de vários temas. Apenas para ficar claro, está a ponderar uma candidatura à Presidência da República?

Está tudo em aberto. Neste momento estou a ponderar porque, naturalmente, depois dessas notícias terem vindo a público e da declaração do secretário-geral do Partido Socialista, várias pessoas têm conversado comigo sobre essa hipótese.

São pessoas que eu considero, são pessoas que são referências na sociedade portuguesa e que ouço os seus argumentos.

Qual é o seu timing para tomar uma decisão?

A decisão é minha e em conversa com a minha família.

E qual é o seu timing para tomar uma decisão?

É quando eu sentir a convicção de que posso servir o meu país e unir os portugueses numa fase extremamente difícil da vida do país e do mundo.

Portanto, não posso concluir que será no primeiro trimestre do próximo ano, que será no primeiro semestre do próximo ano, não me dá o direito de concluir coisa nenhuma.

 Absolutamente nada, depende da minha convicção.

Vamos olhar para a governação da última década, já estendeu alguns pontos que vamos também aprofundar nesta entrevista, e de facto, no ano passado, numa das raras vezes em que falou publicamente nesta última década, disse que quando olha para o país fica perplexo com o que vê, acha que os portugueses merecem melhor, estávamos na maioria absoluta de António Costa, é essa avaliação que faz da maioria absoluta que os portugueses mereciam melhor?

Não, é a avaliação que faço do país.

O país teve um Governo de oito anos do Partido Socialista.

Mas eu posiciono-me como um cidadão que olha para o país e que está preocupado, e que vê um conjunto de problemas que têm passado por sucessivos governos, têm sido em alguns casos diminuídos, em outros nem tanto, e o que é necessário é dar resposta a esses problemas. Dou um exemplo, a questão da saúde, que é hoje uma questão que preocupa os portugueses.

Nós temos vindo a ter um desinvestimento na área da saúde. Os dados, por exemplo, de 2023, apontam para um valor que estava previsto para o investimento e ele ficou sensivelmente por metade em termos de execução.

Mas o senhor sabe que quando ouvimos as pessoas do Partido Socialista, elas dizem que nos últimos oito anos houve sempre mais investimento na área da saúde, mas depois quando ouvimos as pessoas do PSD, elas dizem que o dinheiro estava lá, mas ficou nas cativações.

Mas esse é um dos problemas da política portuguesa, é o passa-culpas, e nós devemos nos concentrar na resolução dos problemas, e é aí que deve haver convergência. Convergência de quem? Convergência de quem quer resolver os problemas das pessoas, porque se os problemas das pessoas não forem resolvidos, isso é um aumento de manancial de argumentos para o populismo. As pessoas precisam de respostas no emprego, as pessoas precisam de respostas na saúde, as pessoas precisam de respostas na educação, as pessoas precisam de respostas nos serviços públicos, as pessoas precisam de respostas na segurança.

Se os partidos tradicionais não conseguem convergir e ver que há necessidade de dar resposta concreta aos problemas das pessoas, as pessoas fogem e vão à procura de outras soluções, porventura instantâneas, que não lhe resolvem os problemas, mas aqui a responsabilidade é dos partidos tradicionais.

António José Seguro, deixe-me também obter aqui uma resposta sua a um dos temas que dominou o dia. Faz hoje [quinta-feira] dez anos desde que José Sócrates, de quem foi líder parlamentar, acabou detido na Operação Marquês, foi um momento transmitido em direto para o país inteiro, nunca falou sobre isto, como é que viu na altura essas imagens?

João Póvoa Marinheiro, já reparou uma coisa? Neste século todos os governos, ou praticamente  todos, tiveram membros do Governo com problemas com a justiça, isto não pode continuar assim, nós temos que ter uma exigência ética quando escolhemos as pessoas e um código ético, porque isto não é... Ir para um Governo é servir o país, não é as pessoas servirem-se dele. Em relação à questão concreta, que não fujo, do engenheiro José Sócrates. A minha resposta é muito simples: julgamento. Num Estado de direito onde se faz justiça é num julgamento, e a necessidade de um julgamento é, do meu ponto de vista, essencial para a justiça e para a sua credibilidade.

Para a democracia, porque é necessário que as pessoas confiem nas instituições da democracia e não fica com a ideia que os atrasos decorrem de uma justiça que protege os poderosos e que é diferente para aqueles que não são poderosos. E por último, talvez até em primeiro lugar, para os próprios visados, porque eles precisam do julgamento para se poder defender. Havia um professor de direito, penso que na Universidade de Coimbra, tinha uma expressão e uma imagem fantástica para poder explicar como é que verdadeiramente os julgamentos são importantes para quem é acusado, para se poderem defender.

Imaginem que alguém agarrava numa almofada de penas, ia ao cimo de uma montanha, rasgava a almofada e deixava-as cair. Por muitas penas que se apanhem, ficam sempre algumas por apanhar, e num julgamento todas as penas estão em cima da mesa.

Mas para ficarmos também completamente clarificados em relação a essa questão, posso concluir que o senhor acha que Sócrates está a fugir ao julgamento ou posso, por outro lado, inferir que a justiça se atrasou de tal forma que ao fim de dez anos não foi capaz de levar o processo a um ponto, de levar o ex-primeiro-ministro a tribunal?

Nuno Santos, eu não conheço o processo em detalhe, apenas sei...

Uma das queixas do engenheiro Sócrates é que houve quatro anos para concluir o inquérito, mais três anos para a instrução, mais um ano e meio de conflito entre juízes, e portanto ele está também a ser acusado de uma coisa, que são as questões das moratórias, pela qual não pode ser responsabilizado.

Vamos lá ver, eu não entro em detalhe no processo, aliás, não tenho conhecimento do processo. A única questão...

A questão é de princípio...

É de princípio e coloco-me na posição de um português, de um cidadão que olha e diz como é que é possível que até ao momento ainda não se tenha realizado o julgamento? Porque é o julgamento onde se faz justiça, não se faz justiça na Praça Pública faz-se no julgamento. E, portanto, o julgamento é algo que é essencial para, volto a referir, para a nossa democracia, para a nossa justiça e para os próprios visados.

Deve ter visto, José Sócrates escreveu hoje que a Operação Marquês foi uma armação política destinada a evitar que ele fosse candidato à Presidência e que o PS vencesse as legislativas em 2015. Tem a mesma opinião?

A opinião que eu tenho é que a justiça precisa de ser mais célebre, mais rápida e, neste caso concreto, tem que haver um julgamento. Não digo mais nada sobre este assunto.

"O que se passou em 2014 ficou em 2014"

Em 2014 há uma competição séria no Partido Socialista, uma eleição direta. O senhor é que a disputou e que perde para António Costa. Que memória tem desse tempo e que mágoas é que guarda? Ou já não guarda nenhuma?

Não guardo nenhuma mágoa. O que se passou em 2014 ficou em 2014. Agora, a memória não se apaga e quem viveu com intensidade aquele momento, naturalmente, guardará as suas memórias.

Teria feito a mesma coisa, isto é, teria feito uma eleição direta...

Deixe-me só dizer-lhe que eu não sou um homem de rancores. Quem me conhece sabe muito bem isso. E, aliás, sou uma pessoa de bem comigo próprio. Sou uma pessoa feliz, bem e muito menos procuro o futuro no avesso do passado. Portanto, o que ficou em 2014, o que se passou, ficou lá em 2014.

Em 2014, ou melhor, antes de 2014, em 2014 também, o senhor tinha ganho duas eleições. Tinha ganho umas eleições autárquicas e as famosas eleições europeias por pouco, ou por poucochinho, como foi dito, lembra-se dessa expressão?

Lembro, perfeitamente.

O senhor não chegou a ir às eleições legislativas. Acha que ganharia essas eleições legislativas se tivesse sido um candidato do Partido Socialista?

Eu tinha essa convicção. E por isso é que queria continuar na liderança do Partido Socialista.

O seu adversário interno, que foi depois o candidato do Partido Socialista, António Costa, perdeu as eleições e desenhou a então famosa geringonça. Se o senhor tivesse perdido as eleições, teria adotado uma solução política parecida?

Eu estava convicto que ganharia as eleições. Mas a resposta a essa pergunta disse na altura, quando, deixe-me aqui buscar, quando afirmei o seguinte. Eu dizia que aspirava a ter uma maioria absoluta. Não para mim, mas o país estava em tal condição que necessitava de ter um respaldo parlamentar de uma maioria, precisava ter estabilidade para fazer o que era necessário.

E não chegava. Era necessário convergir com outras forças políticas, dialogando, como aliás é a matriz do Partido Socialista, convergindo com os parceiros sociais, com parceiros culturais, enfim, mobilizar o país em torno de um projeto que desse um propósito, que tivesse uma estratégia e que pudesse resolver problemas essenciais, como por exemplo o crescimento económico. Portanto, eu verdadeiramente dizia isso.

Mais, dizia que não governava em minoria. Precisamente porque tinha noção dos problemas que o país estava a ter. Então o que é que disse? Disse que se houvesse uma coligação, havia linhas vermelhas para essa coligação e que seriam os militantes do Partido Socialista através de um referendo a decidir se a queriam ou não. Aliás, como o SPD fez na Alemanha. E havia linhas vermelhas muito importantes que eram, primeiro, não podia haver uma coligação com um partido que destruísse o Estado Social ou quisesse destruir o Estado Social. Era preciso, robustecer, como aliás se nota, infelizmente, por tantos casos que são do conhecimento público, esse Estado Social, saúde, educação, segurança social.

Depois não havia coligações com partidos que defendessem a saída da Europa, da União Europeia e do Euro. E também não havia coligações com partidos que advoguem uma política de privatização de empresas públicas em setores chaves do país, como as Águas, a Caixa Geral de Depósitos e a TAP.

Portanto, estava tudo escrito.

Mas os partidos à esquerda do Partido Socialista...

E como calcula, não estava escrito para responder a esta pergunta. Na altura estava escrito mesmo que eu queria concretizar.

Mas os partidos à esquerda do Partido Socialista não colocam em causa no essencial nenhuma dessas questões, porque mesmo a questão da saída da União Europeia ou da moeda única, na verdade são um pró-forma, porque em rigor o Bloco e o PC estiveram coligados com o PS de António Costa e essa questão nunca se colocou, como o senhor sabe, não é? Quer dizer, é enunciada, mas na prática não existe.

Quando se define um programa de governo, é um projeto para o país. Eu não gosto de governos de turno. Eu gosto de governos de projeto. 

E o senhor acha que a geringonça foi um governo de turno?

E portanto, aquilo que eu considero...

Consegue-me responder? O senhor acha que a geringonça foi um governo de turno?

Eu estou a tentar responder à sua primeira pergunta. E o que é que significa? Significa que mais importante do que com quem nos aliamos é o conteúdo do programa de Governo. E foi isso que eu disse.

António José Seguro, da mesma forma, num artigo académico seu, a centralidade do Parlamento Português, admitiu que a entrada em funções do Governo PS restaurou e reforçou a centralidade política do Parlamento Português, que se tornou num local privilegiado para o exercício da função política. Portanto, pedia-lhe que clarificasse o que é que achou da solução da geringonça, que durou uma legislatura.

Esse, como referiu, esse artigo académico, que aliás foi publicado num livro em Londres, tinha um propósito muito claro. Como sabe, o meu objeto de estudo em termos académicos é o Parlamento e o facto de não haver um Governo com maioria no Parlamento, mas ter havido acordos bilaterais com diversos partidos que criaram essa maioria, trouxe centralidade ao Parlamento.

Portanto, já admitiu que a solução funcionou, se calhar o António José Seguro não faria essa solução.

Não, quer dizer, eu acho que há discussões envenenadas em Portugal. E uma das discussões envenenadas é as discussões em função de coligações com partidos em vez de nos centrarmos verdadeiramente naquilo que interessa, que é qual é a proposta governativa que o Governo X tem para o país? Como é que resolve os problemas da educação? Como é que põe o país a crescer? Como é que o país é mais competitivo? Como é que o país retém os jovens? E, portanto, eu concentro-me nas soluções. É esse o meu ponto. Se concentrava, é preciso notar uma coisa, estamos a falar da minha anterior encarnação, não é?

Em 2013, na crise do irrevogável, o Presidente da República, Cavaco Silva, propôs um compromisso de salvação nacional, até ao final do Programa de Assistência Financeira, abrindo caminho a eleições antecipadas em 2014. Hoje arrepende-se de ter rejeitado esse acordo proposto pelo Presidente da República, sendo que poderia ter vindo a ser primeiro-ministro se tivesse aceite?

Mas qual foi o acordo que ele propôs? Ele propôs?

Viabilizar, deixar o Governo aguentar um ano e depois irem para eleições.

Ele propôs que se chegasse a um acordo, mas o acordo não foi definido pelo Presidente da República. Tinha que ser os partidos que estavam no Governo, nesse caso o PSD e o CDS, e o Partido Socialista a tentarem chegar a um acordo. Primeiro, eu discordei que não se envolvessem os outros partidos, que tinham representação parlamentar. Mas, enfim, foi assim que na altura, o Presidente da República entendeu o que deveria fazer.

E depois, nós fomos o partido, na altura, que mais propostas apresentou para que houvesse esse tal programa de Salvação Nacional. Mas era um programa de Salvação Nacional. E a convicção que eu fiquei, não vale a pena agora aqui entrar em detalhe, é que quem não queria esse acordo era precisamente o Governo, quem não queria era a AD.

E porquê? Porque era aquele que do ponto de vista eleitoral tinha menos vantagens. Porque se houvesse um acordo haveria eleições mais cedo. E provavelmente, como disse, o Partido Socialista ganharia as eleições. E eu seria primeiro-ministro. Porque fazia parte das regras que as eleições fossem antecipadas. Ora, o Governo da altura, liderado pelo Dr. Pedro Passos Coelho, precisava de tempo para poder demonstrar que a sua política...

Que os sacrifícios valeram a pena.

Exato. Era essa convicção. Portanto, não havia um incentivo para que o PSD e o CDS pudessem estar a fazer tudo para que nós pudéssemos chegar a um acordo. Portanto, não houve acordo e não foi por mim a causa.

Não se arrepende?

Do que é que me posso arrepender? Eu lutei para que houvesse acordo.

Permita-me ainda esta questão, regressar ao tema das primárias do PS para fecharmos este tema e seguirmos. Na altura deixou críticas ferozes. Já garantiu aqui que não ficaram mágoas, que não é de guardar rancores, mas deixou críticas muito duras. Acusou António Costa de traição e lamentou como tinha vencido um PS associado aos interesses e aos negócios. Essa é a visão que tem desde os quase dez anos de governação do PS?

Como lhe referi, o que se passou em 2014 ficou em 2014. Eu não guardo rancor absolutamente de nada.

Mas mantém estas declarações?

Aliás, nesta vez que quebro o silêncio e que semanalmente teremos o nosso espaço na CNN, quero aproveitar o momento para desejar as maiores felicidades ao dr. António Costa na sua função de presidente do Conselho Europeu. Porque a felicidade dele, do seu mandato, exigente, difícil, será a felicidade de Portugal. Aliás, aproveito também para o fazer para a nova comissária, tudo indica que vamos ter comissão, até ao final deste mês, (19:34) Maria Luísa Albuquerque.

O senhor pode não ter tido uma relação com António Costa ao longo destes dez anos, mas conhece-o. Acha que ele vai ser um bom presidente do Conselho Europeu?

Ele tem características para ser um bom presidente do Conselho Europeu. Não vai ser fácil, porque, como sabe, o Conselho Europeu tem uma esmagadora maioria de primeiros-ministros que são de famílias diferentes da família social-democrata europeia.

Quando diz que ele tem características... por ser um bom negociador? Uma pessoa capaz de fazer pontes?

Em primeiro lugar, ele conhece bem a Europa, tem experiência europeia. Em segundo lugar, é certo que houve alguns primeiros-ministros que levantaram algumas dúvidas, designadamente a primeira-ministra italiana, mas eu estou convencido que ele tem as características políticas e as características pessoais para poder conseguir criar consensos.

Não vai ser fácil, porque nós, para além das duas famílias políticas e do facto da família política do dr. António Costa estar com salvo erro, neste momento, cinco primeiros-ministros, depois ainda temos outras divisões, designadamente perante a situação da Ucrânia e da invasão da Ucrânia pela Rússia. Mas eu estou convencido que ele tem a arte, o engenho, tem características, tem experiência, que podem fazer dele um bom presidente do Conselho Europeu, porque hoje a Europa precisa de ter uma voz. Ele será uma, não será a única. Mas estou convencido que saberá criar os consensos nesse sentido de afirmar uma União Europeia que precisa de maior autonomia, precisa de maior integração para poder responder a problemas concretos.

Melhor presidente do Conselho Europeu do que foi primeiro-ministro?

Não ponho as coisas nesses termos, porque são coisas incomparáveis.

Vamos virar a página, não quer dizer que não voltemos mais à frente a questões ligadas ao Partido Socialista, e até temos que falar, obviamente, do atual secretário-geral e do caminho que o PS segue neste momento. Mas falemos do Governo que temos, que é um Governo recente, tem meia dúzia de meses, digamos assim. Está a passar agora as primeiras situações difíceis, ligadas com os casos da saúde, o INEM está aqui na ordem do dia. Que primeira leitura é que faz deste Governo da Aliança Democrática?

Bem, insere-se claramente num Governo de turno, que é um Governo que mal chega tem que resolver problemas, tem que resolver emergências.

Mas começou por resolver bem, ou não?

Sim. É inegável, isso são factos.

Não acha que isso é crédito a favor do primeiro-ministro?

Claro que sim, claro que é. Quando há um Governo que entra e que resolve problemas, o crédito naturalmente tem que ser associado neste caso ao dr. Luís Montenegro e ao Governo. Agora, os problemas essenciais do país, esses continuam por resolver, e é aí que eu não vejo estratégia. Mas atenção, não estou a assacar responsabilidade só a este Governo. É um problema que o país tem e que nós temos que olhar para esses problemas em conjunto, e para evitar a trica política, e para evitar o passa-culpas.

Esses acordos com várias carreiras da função pública podem ser um problema para o PS e para Pedro Nuno Santos? 

Eu não vejo as coisas desse ponto de vista. Eu olho para os problemas do país e vejo que eles precisam de resposta.

Mas eleitoralmente não ocupa o espaço do PS?

Eu não vejo... Podemos falar sobre o que são hoje os posicionamentos políticos do Partido Socialista, dos outros partidos. A questão essencial é: nós precisamos de um Governo para quê?...

Eu gostava só que precisasse uma coisa. Quando o senhor diz em conjunto, isso significa...

É que eu sou tão bombardeado com tantas perguntas e depois tenho dificuldade em conseguir aprofundar...

Eu só gostava de perceber isto: quando o senhor diz que temos que olhar para os problemas em conjunto, isso significa o quê? Há pouco falámos de 2013, 2014, da salvação nacional, essa expressão que nos remete quase para os primeiros anos da democracia. Resolver os problemas em conjunto significa o quê, do ponto de vista do cidadão?

Significa não meter a cabeça na areia e parar de fingir. O país tem problemas sérios. Nós temos um problema de crescimento económico. Neste século, o crescimento médio anda na ordem de 1%. Isto é um problema, não é? Claro que é. Temos um problema de produtividade no nosso país. Os nossos trabalhadores trabalham mais horas do que, por exemplo, a média dos trabalhadores na União Europeia, mas somos menos produtivos. Temos ou não temos um problema? Como é que podemos querer melhores salários se não somos mais produtivos? Se nós perdemos lugares na competitividade, num mercado que é cada vez mais global? Então, para esse problema tem que haver respostas.

Em conjunto?

Claro, em convergência.

Mas o que é que significa na aplicação prática esta convergência?

Hoje a nossa economia é uma economia muito dependente. Sempre foi, sempre foi dependente da energia, sempre foi dependente do capital, sempre foi dependente do mercado, só temos dez milhões de consumidores, mas também passou a ser dependente da mão de obra. Ora, o que é que nós precisamos? Nós precisamos de encontrar soluções que sejam soluções duradouras e estáveis, que resistam aos ciclos políticos do Governo.

Quer dar um exemplo?

Todas as políticas, por exemplo, política fiscal. Mas posso dar outro exemplo, as pendências nos tribunais administrativos e fiscais. Um investidor estrangeiro que queira investir no nosso país perante situações de políticas que estão sempre a alterar, ou de pendências que demoram 5, 6, 7, 8, 9, 10 anos...

Está a falar de acordos de regime, essencialmente.

Não, o que eu estou a falar é... chame-lhe o que quiser chamar, eu estou-lhe a chamar de problemas que precisam de ter soluções.

Isso significa entendimento entre as lideranças políticas. O que está também a dizer é que não tem havido entendimento entre as lideranças políticas. Porque isso não nasce do nada. Quando nós falamos de entendimentos, tem que haver entendimento entre as lideranças políticas.

Este ponto é bastante importante, o que refere. A democracia é entendimento. Nós temos visões diferentes, mas não temos inimigos, temos oponentes, temos adversários. Não se pode governar metade do país contra a outra metade. O que é que isso significa? Significa que tem que haver diálogo. Tem que haver convergência. Nós temos uma política, atualmente, que é de trincheira. Parece que é uma traição as pessoas poderem conversar com um partido diferente.

Está a falar de todos os partidos? Incluindo o PS?

Vamos lá ver. Hoje é a entrevista talvez mais difícil para mim. Porque quando eu dava entrevistas, sabia-se quem eu representava. Eu estou aqui como cidadão e posiciono-me como um cidadão que está preocupado. Razão pela qual aceitei o vosso convite e o usar da palavra. E aquilo que eu assisto é que há problemas concretos para os quais não há resposta. E não é possível que haja uma convergência? As pessoas têm momentos para as escolhas, que são os momentos das eleições. Têm momentos para afirmar as suas posições diferentes como houve recentemente em matéria de Orçamento do Estado.

Mas, no essencial, temos que perceber que há problemas aos quais não estão a ser dada resposta. Faz sentido que este país passe pela crise que o INEM está a passar? Faz sentido que neste país todos os anos haja falta de professores nas escolas do ensino secundário? Isto faz algum sentido?

Mas de quem é a responsabilidade?

Eu não coloco a questão no passado. De quem é a responsabilidade, é de todos. Eu coloco o problema no futuro: de quem é a responsabilidade de resolver estes problemas? Um dos problemas do aumento do populismo é precisamente porque os partidos tradicionais são incapazes de se entender para encontrar respostas e as pessoas ficam desiludidas. E as pessoas passam a ter outras escolhas e outras opções. E, portanto, se nós queremos verdadeiramente dar qualidade à nossa democracia, que as pessoas se reconciliem com as instituições, temos que ter políticas públicas e serviços públicos que respondam aos problemas das pessoas. Veja as listas de espera na saúde, veja os problemas que existem com as pessoas quando muitas das vezes querem ir a algum serviço público e têm dificuldade em ter acesso a tempo e horas

Veja os jovens que imigram. Como é que este país pode ter futuro se não é uma terra de oportunidades para os jovens, a geração mais qualificada de talentos portugueses? Então não são estas as preocupações que nos devem motivar? Então para que é que serve a política se não for para responder aos problemas concretos das pessoas?

Nós estamos a falar de questões estruturais. de facto. Mas também há questões que são conjunturais. Por exemplo, falou do caso do INEM. Do seu ponto de vista há ou não uma responsabilidade política que pode ser assacada à ministra, à secretária de Estado ou ao presidente do INEM, isto talvez seja um caso concreto. Mas depois se me vem dizer que nós temos um problema global no Serviço Nacional de Saúde. Isso é uma questão mais estrutural, que talvez tenha que ser resolvida com entendimentos. São coisas distintas, sim ou não?

Vamos ver esta questão. Primeiro...

Os cidadãos estão talvez também um pouco cansados que os governos, só para lhe dar esta achega, que os governos, eu não estou a falar deste em concreto, porque agora estamos a falar deste caso, deste Governo, mas podemos andar meia dúzia de meses para trás e falar de casos do Governo do Partido Socialista. Os cidadãos às vezes estão cansados que os responsáveis políticos não assumam os seus deveres, digamos assim.

Isso é verdade, mas estão mais cansados por ver os seus problemas agravarem-se e não serem resolvidos. Vamos à questão da saúde e à questão do INEM. A questão isolada do INEM é muito simples. Houve mortes, que lamentamos todos. São tragédias. Estão investigações a decorrer para saber se há uma relação direta entre o INEM e, precisamente, essas mortes. Mas aquilo que ficou demonstrado é que o Serviço de Emergência Médica não responde a tempo e horas às pessoas. E veja uma coisa, eu ouvi a ministra da Saúde dizer o seguinte: agora 70% do meu tempo é dedicado ao INEM.

Achou uma declaração razoável?

Eu levei aquela declaração a sério. Porquê? Os membros do Governo, e neste caso a ministra da Saúde, eu não tenho dúvidas que ela estaria dedicada ao INEM. Se ela está dedicada a 70% ao INEM, 10% ao Amadora-Sintra, mais 5% a outro problema, quem é que define as políticas de saúde? Portanto, nós temos aqui um problema de governabilidade do país e de resolução dos problemas concretos. É evidente que o INEM pode-se resolver e deve-se resolver.

No seu entendimento, não faria sentido a ministra sair?

Eu não olho para os problemas dessa forma. Eu olho para os problemas como necessidades que precisam ser solucionadas para quem que telefona para o INEM tenha certeza que está alguém do lado de lá, e que em segundos responde e que encaminha e que resolve o problema. É isso que as pessoas que estão em casa querem. É isso que as famílias precisam. É por isso que os portugueses pagam impostos. E, portanto, se há um setor que não pode falhar às pessoas, é o setor da saúde. Um país com poucos recursos como o nosso precisa de crescer para gerar mais recursos, mas precisa de ter prioridades. Não pode ser tudo prioridade. E nós temos de dar respostas às pessoas.

Quais são as prioridades, do seu ponto de vista? Consegue hierarquizá-las? Ou quer hierarquizá-las?

Quer dizer, há uma prioridade óbvia.

A saúde?

A saúde é uma prioridade óbvia, obviamente. Mas nós temos de colocar o país a crescer, de ser mais produtivo, aquilo que eu referi há pouco. Mas faço-vos uma pergunta. São capazes de dizer, daqui a dez anos, onde é que nós estamos como país? Qual é o caminho que estamos a seguir? Não consegue, nem eu, nem ninguém. Então não há um projeto que nos seja capaz de mobilizar, no sentido de termos causas, termos metas, termos objetivos, termos estratégia, e para todos contribuirmos nesse sentido? Já repararam quantos planos se elaboram e depois são substituídos por um outro plano?

Este Governo tem anunciado muitos planos, tem levado a sério estes planos de ação para vários setores, que o primeiro-ministro tem anunciado ao país?

Eu recordo-me de um plano, que era, salvo erro, acelerar a economia, que foi um conjunto de medidas. Portanto, eu tenho assistido a mais medidas do que políticas. Segundo, no Concertação Social, um dos pontos do Acordo de Concertação Social foi a criação de uma estrutura de missão para aprofundar essas 60 medidas. E davam 45 dias para se criar essa estrutura de missão. Passaram 45 dias e não está criada.

São planos de intenções, é isso que está a dizer.

Eu chamo este exemplo para, no fundo, testemunhar que nós, em planos, em intenções, em estruturas de missão, não sei se somos campeões, mas fazemos muitas ao longo das décadas. O que nós precisamos, verdadeiramente, é de atacar os problemas e de os resolver. É isso que as pessoas pedem à política e é isso que pedem aos governos.

Regresso à política sim, ao PS não

Tenho uma pergunta que é também uma provocação. Estava a ouvi-lo e remetendo-me ao princípio da nossa entrevista, quando o João lhe perguntou sobre a questão presidencial. Eu estou a ouvir alguém que, no fundo, se podia posicionar para uma função executiva e não para o que significa uma função presidencial, ou não?

A culpa é dos dois, porque me fazem perguntas que são do âmbito do Governo e eu dou respostas porque sou um cidadão que se preocupa com isso. Sabe que uma das disciplinas que eu ensino é de políticas públicas. E as políticas públicas, muitos dos trabalhos dos meus alunos é: identifique um problema e encontre uma política pública para lhe responder.

A minha pergunta seguinte é se o regresso a funções executivas está completamente posto de lado na sua cabeça.

O que está completamente posto, não tenciono, é a vida partidária. Eu olho para a participação e vejo vida pública, vida política e vida partidária. Neste momento, dei um passo no sentido da vida pública. Estou a ponderar no sentido da vida política e não tenciono voltar à vida partidária.

Colocamos esta questão porque, de facto, quando o último Governo de António Costa caiu, António José Segura admitiu que recebeu muitas mensagens e telefonemas na altura. Portanto, está descartada uma tentativa de regresso ao Largo do Rato?

Lembro-me, nessa altura, de ter até brincado dizendo que não tinha nenhum Citroën para fazer a rodagem.

Mas estes telefonemas e essas mensagens não fizeram pensar no assunto?

Não, quer dizer, há sempre coisas que nos fazem pensar no assunto, mas, verdadeiramente, eu nestes dez anos, sabe, uma das coisas que aprendi na universidade, com este distanciamento que também se ganha, é olhar verdadeiramente para os problemas e é isso que me preocupa. Portanto, se eu puder dar um contributo para ajudar a resolver os problemas do país, darei. Para isso, não preciso ter nenhum cargo. E o facto de ter opinião também não faz de mim candidato absolutamente a nada. A circunstância é que se juntou e conjugou, e eu percebi a vossa pergunta.

Portanto, Pedro Nuno Santos, que em janeiro de 2026 pode ter de ir a votos para ser reconduzido, se alguém aparecer, pode ficar descansado? 

O líder do PS precisa de tempo. É uma nova geração que assumiu a liderança do Partido Socialista, precisa de tempo, precisa de espaço, precisa de estabilidade para poder afirmar a sua alternativa. Ele anunciou que vai lançar uns estados-gerais para, no fundo, discutir, apresentar a sua proposta e tem todo o direito de ir a eleições legislativas, apresentar-se e os portugueses decidem e avaliam.

Podemos entrar nesta liderança da oposição feita por Pedro Nuno Santos, como é que tem avaliado o trabalho de Pedro Nuno Santos como secretário-geral do PS?

Ele está há seis, sete meses, ele foi candidato às eleições legislativas, o Partido Socialista perdeu, por pouchinho, por uma diferença pequena, depois ganhou as eleições europeias...

As autárquicas serão determinantes para a continuidade de Pedro Nuno Santos?

Como calcula, defendo que as lideranças devem disputar, pelo menos, uma eleição legislativa.

No fundo, o que o senhor está a pedir para ele foi o que não lhe deram a si.

Bem, o que eu estou é a analisar aquilo que eu considero e sempre considerei que são os meus critérios e os meus padrões de comportamento e aquilo que eu quero para mim, também quero para os outros. Não há aqui uma diferença.

Mas o seu regime político, o que é que lhe diz? Depois de perder as legislativas à tangente, depois de vencer as europeias à tangente, perder as autárquicas significaria o fim para Pedro Nuno Santos?

Vamos lá ver. Lembra-se do último líder político a quem lhe criaram essa fasquia? Chama-se Luís Montenegro. Sabe onde é que está? Portanto, devemos ter mais cuidado nas previsões que fazemos.

Já vamos voltar a questões ligadas ao Partido Socialista, porque não tratámos todos os temas relacionados com o Governo e com a governação, mas com o Governo em concreto, porque nós temos um, o senhor chamou-lhe um Governo de turno. Mas o que é facto é que foi muito difícil também concretizar esta solução governativa, desde logo porque o PSD ou a AD, para sermos mais rigorosos, ganhou com uma margem muito escassa e isso significa que é um Governo muito frágil no Parlamento. Isso torna a ação governativa também muito mais difícil. Talvez seja complexo para o partido principal dessa coligação conseguir materializar uma visão de futuro tendo que acudir permanentemente a questões de natureza tática, sim ou não?

Sim, claramente. Aliás, em coerência com aquilo que eu defendia há dez anos, quando disse que eu não aceitava, caso ganhasse as eleições, liderar um Governo minoritário. As tarefas e a missão que são necessárias a realizar neste país, perante a dimensão dos problemas, exigem estabilidade política e a estabilidade política significa criar condições para mobilizar tudo aquilo que o país tem disponível, em todos os setores, para nós podermos responder aos problemas.

Eu falei do crescimento económico, falamos do problema demográfico. Nós temos um país com um duplo envelhecimento, porque temos cada vez, ainda bem, pessoas com mais idade a viverem mais tempo, mas temos cada vez menos jovens, agravado com o facto de haver muitos jovens que emigram de Portugal, e também da taxa de fecundidade em Portugal ter vindo a diminuir, e portanto isso também significa o nascimento de menos bebés. Este é um problema grave que nós temos. Como é que nós resolvemos o problema da nossa economia? Qual tem sido a resposta? A imigração, ou seja, a entrada de mão de obra. Mas nunca perguntámos à economia se ela não podia fazer alterações para que precisasse de menos mão de obra, designadamente com a introdução de novas tecnologias, com a introdução de inteligência artificial. Nós precisamos de pensar a nossa economia de uma outra forma.

O mundo está a mudar, está em transição. Nós não voltamos a ter o mundo que tínhamos antes. E aquilo que nós precisamos, deixe-me só concluir, é de um novo propósito e uma estratégia, chamem-lhe planos, chamem-lhe acordos, chamem-lhe convergências, chamem-lhe um novo contrato social...

Bloco central?

Não, não se trata de bloco central. Isso é que envenena depois a discussão...

Ou seja, que conselho é que daria a Pedro Nuno Santos e a Luís Montenegro?...

O que nós precisamos, a minha preocupação, e o meu ponto de vista é muito simples, é há problemas, há problemas estruturais que se arrastam há décadas, alguns têm vindo a agravar-se, e se nós continuarmos a parar de fingir, não o resolvemos.

E a minha preocupação como cidadão, deixe-me só concluir, a minha preocupação como cidadão...

É que o orçamento já foi difícil no entendimento em duas medidas. Ou seja, que conselhos é que dá a Luís Montenegro e a Pedro Nuno Santos, que representam as forças maioritárias, para conseguir essas soluções?

Mas quem sou eu para dar conselhos? Há instituições em Portugal que podem ajudar, que podem contribuir. Fale com os parceiros sociais, veja os documentos que eles escrevem, as necessidades de que eles falam. Ninguém olha para os problemas concretos? Ninguém é capaz de parar um pouco da política partidária, da política da luta pelo poder e dizer: vamos agora concentrar-nos aqui, somos capazes de ter três ou quatro questões, na justiça, no crescimento económico, na demografia, de nos pormos de acordo.

Não coloquemos isto na pequena política. A questão é como é que se materializam maiorias em Portugal com a fragmentação do Parlamento? Se pensarmos no partido que está no Governo, esse partido só pode fazer maioria ou à sua direita com o Chega, e é conhecida a posição do primeiro-ministro, e tem sido clara, e ele tem sido coerente, isso é indiscutível, ou à sua esquerda com o Partido Socialista. Não há outra maioria que se possa materializar. Ou à direita ou à esquerda.

As condições de governabilidade deterioraram-se em Portugal.

E na Europa em geral, não é um problema exclusivamente português.

Mas isso não nos alegra.

Certo. E não nos diz diretamente respeito, embora indiretamente diga.

E mais, e não foi por falta de aviso, porque começou primeiro em muitos países europeus e só depois é que chegou cá. Porque a pulverização do Parlamento, neste momento nós tínhamos nove representações parlamentares no Parlamento, é uma coisa recente dos últimos anos.

Isto pode parecer uma questão da pequena política, mas na verdade não é. Como é que se materializa?

Pelo amor de Deus, porventura interpretou-me mal em relação a isso. Portanto, nós temos este problema. Depois temos um segundo problema, que é a velocidade e o ritmo em que há eleições. Ou seja, se nós compararmos a média de eleições em que ocorriam, o período de tempo em que ocorriam eleições até 2019, era muito superior, quase o dobro, do que ocorreram a partir de 2019. Terceiro, nós temos que discutir as condições da governabilidade.

Dou-lhe um exemplo, Programa de Governo. A Constituição de 1976 exigia um voto no Programa de Governo. O que era uma coisa estranha. Os partidos andavam na campanha eleitoral a dizer o meu programa é que é o adequado, o teu não é, e depois chegavam ao Parlamento e votavam como numa situação em que o Governo tinha maioria relativa no Parlamento. Então, o que é que se fez? Uma revisão da Constituição em que não é obrigado o Programa de Governo a ser objeto de votação. E, portanto, se até ao final ninguém apresentar uma moção de rejeição, ele não é votado.

Ora, nós temos que discutir como é que nós garantimos, por exemplo, que em matéria do orçamento, poderíamos ter uma situação que garantisse alguma estabilidade governativa. Uma das possibilidades, mas atenção, eu estou a dar este contributo para a discussão, não estou a dizer que tenha que ser este, uma das possibilidades era que só haveria, digamos, chumbo do orçamento proposto pelo Governo se houvesse um orçamento alternativo. Ou seja, numa lógica que a democracia precisa de construção, precisa de oposições construtivas. Mas poderiam dizer: assim o Governo nunca saía de lá. Não, porque havia sempre a moção de censura que poderia ser apresentada. Portanto, este é um problema. Segundo, eu penso que o Presidente da República agiu muito mal quando equiparou o chumbo do orçamento à dissolução do Parlamento. Vejam, nem sequer foi à queda do Governo, foi logo à dissolução do Parlamento. E isso tem que ser revertido. 

Portanto, aqui temos dois exemplos de como nós devemos discutir as condições de governabilidade. Definir estas questões da governabilidade, mas numa decisão não em causa própria. Ou seja, podia decidir-se, queremos estas condições de governabilidade que se aplicam depois das próximas eleições. Nós temos de discutir estes assuntos com profundidade para podermos ter condições para resolver os problemas dos portugueses. Isto é que é o essencial.

Marcelo, de "coprimeiro-ministro" ao "exame oral"

Regressando à minha questão, o que é que, então, Marcelo Belo Sousa poderia ter feito em 2021, no seu entender?

Bem, porventura ter uma atitude mais discreta, no sentido de conseguir criar condições para que pudesse haver um entendimento em termos orçamentais. Uma das grandes conquistas do período entre 2015 e 2019 foi o de trazer o Partido Comunista e o Bloco de Esquerda para aquilo que se chama o espaço da governação e terem aprovado orçamentos apresentados por um Governo do Partido Socialista. Eu julgo, posso estar errado, mas julgo que nessa altura exigia-se ao Presidente da República mais descrição para tentar criar as condições e eu julgo que ele optou por uma situação diferente, que foi avisar: 'olhe, se os senhores não votam o orçamento, vamos para eleições', porventura pensando que, com isso, era capaz de forçar, dou-lhe esse benefício de dúvida, que esses partidos aprovassem, ou um deles aprovasse o orçamento. Mas não aconteceu.

E não foi para tentar forçar uma mudança de ciclo político? À direita, talvez?

Não sei, não estou na cabeça do sr. Presidente da República.

Entre forças e fraquezas desta Presidência, deste Presidente da República, a falta de descrição será uma fraqueza. Encontra forças?

Encontro. Em primeiro lugar, o sr. Presidente da República andou muito bem no início do seu primeiro mandato. Descrispou a vida política e a vida social em Portugal, uma relação de proximidade com os portugueses. Mas eu acho que no segundo mandato ele banalizou um pouco a palavra. Teve, a meu ver, este erro de equivaler o chumbo do orçamento a uma dissolução do Parlamento.  Ele teve um papel muito importante, conjuntamente com o Governo, no sentido da gestão da pandemia e de se falar a uma só voz num momento muito crítico da vida do nosso país, outro aspeto que me pareceu bastante relevante. Depois teve um aspeto, a colagem ao primeiro Governo foi tanta que ele parecia um coprimeiro-ministro, e isso retirou espaço ao PSD, que era o principal partido da oposição, em particular ao dr. Rui Rio.

E numa democracia nós precisamos ter governos e precisamos de ter oposição. Portanto, eu diria, relembrando um velho comentador aqui desta casa, da nossa casa, que ele passaria no primeiro mandato, mas a continuar assim vai a oral no segundo mandato. Portanto, ele precisa que estes dois últimos anos de mandato, ele precisa de melhorar a performance para também passar.

Como é que acha que Marcelo Rebelo de Sousa geriu o caso que levou ao fim da maioria absoluta do Partido Socialista? O Partido Socialista entendia que não havia razão para eleições antecipadas. Indicou até um nome para primeiro-ministro?

Sim, quer dizer, vamos lá ver, o Partido Socialista em 2022 teve uma maioria absoluta. Essa maioria absoluta foi uma conquista do Partido Socialista ou do líder do Partido Socialista?

O presidente colou ao líder do Partido Socialista. 

Portanto, se colou, o Presidente agiu na interpretação daquilo que ele fez.

Mas agiu bem, no seu entender?

Foi a interpretação dele.

Há pouco António José Seguro falava sobre, ou pelo menos mostrava aqui as suas críticas ao facto de haver muitas eleições. Portanto, estamos a falar de mais uma eleição. Poderia ter sido evitada? O Presidente da República poderia ter feito outros juízos?

A crítica que eu dirigi ao sr. Presidente da República foi a de equivaler o chumbo do orçamento a uma dissolução do Parlamento. O facto de haver muitas eleições isso decorre de outro tipo de razões. Aquilo que aconteceu há um ano foi uma situação, digamos, excepcional, em que um primeiro-ministro em consciência se demite em função do comunicado da Procuradoria-Geral da República. Portanto, eu não tenho mais informações para poder ter uma avaliação e não quero ser injusto quanto àquilo que foi a decisão do Presidente da República.

O fim dessa maioria absoluta foi culpa pessoal de António Costa? 

Não ponho as coisas desse ponto de vista. E quem sou eu para julgar a consciência de uma pessoa. Quando o primeiro-ministro do meu país diz: eu em consciência devo sair, quem sou eu para julgar? 

Mas os acontecimentos precipitaram aquilo que sabemos. Houve buscas que encontraram quase 76 mil euros no chefe de gabinete do primeiro-ministro. Aquilo que lhe pergunto é se António Costa poderia ter antecipado estas situações? Ele sabia de quem estava rodeado.

Não tenho elementos, não tenho informação para poder responder a isso. A única coisa que me parece é que o primeiro-ministro explicou publicamente porque é que em consciência tomava essa decisão e nós devemos respeitar.

Eu voltava só um pouco atrás naquela que foi a decisão da altura do Presidente que foi a de convocar eleições e, de facto, as eleições ditaram a mudança do ciclo político, isto é, o PSD ganhou as eleições, o PS perdeu, embora o resultado tivesse sido tangencial, mas houve uma mudança de ciclo político, portanto desse ponto de vista o presidente parece ter tomado uma decisão acertada. Mas o que é facto é que nessa linha de sucessivas eleições, o presidente podia ao abrigo da Constituição não as ter convocado e até houve uma reunião do Conselho de Estado em que digamos, não a decisão mas o aconselhamento dos membros do Conselho de Estado, dos conselheiros de Estado, foi nesse sentido, porque é que o Presidente da República não seguiu essa linha, consegue, eu sei a resposta que deu, mas consegue ir um pouco mais além na análise, no seu novo papel de analista que vai ter?

Não consigo ir mais longe porque me falta informação.

Ou seja, não consegue descodificar...

Não consigo descodificar, talvez se encontre um paralelo com o que se passou com Barroso quando foi presidente da Comissão Europeia, mas nem sequer aí há um grande paralelo porque foi uma mudança para um cargo europeu. Aqui foi um primeiro-ministro que em função de uma situação, digamos judicial, toma esta decisão. Talvez num dos próximos programas eu recolha a informação e consiga pronunciar-me sobre esta questão.

Já disse que não queria falar porque não tinha informação suficiente sobre a questão que levou António Costa em consciência a tomar a decisão que tomou, mas sobre a questão em geral, isto é, o facto de um comunicado da Procuradoria-Geral da República, assinado pela procuradora à época, a dra. Lucília Gago, que inclui aquele parágrafo que origina a demissão do primeiro-ministro e portanto a mudança do Governo, e passado um ano nós não sabemos nem muito nem diria que não sabemos nada a não ser que o processo, de acordo com o novo procurador, continua a investigação e que o próprio António Costa continue a investigação, isso não é no mínimo inquietante para o cidadão comum?

Na minha perspectiva é.

E que perguntas é que nós devemos fazer e que respostas é que devemos exigir?

Bem, a Justiça deve responder porque é que se leva tanto tempo. Vamos lá ver, eu não defendo que haja uma Justiça para uns e uma Justiça para outros. A Justiça é igual para todos e todos são iguais perante a Justiça, mas ali não era a pessoa em causa ou o visado, era o titular de um órgão de soberania, um primeiro-ministro que se demitiu, um Governo que se demitiu, um Parlamento que foi dissolvido, eleições legislativas e isto não interpela à Justiça no sentido de acelerar o processo? É por falta de meios? Então deem-se meios, porque caso contrário cria-se um alarme público que não é bom nem para a Justiça nem para a democracia nem para os visados.

Está a falar de uma aceleração?

A Justiça deve ter os seus trâmites, os seus processos, as suas regras, não é isso. Mas se o tempo está associado à falta de meios então que se deem meios, porque estamos a falar de um primeiro-ministro.

Isto não merece um caráter distintivo para acelerar as investigações.

As democracias não são eternas e se as instituições da democracia, das quais a Justiça são um pilar essencial, não cuidarem tão bem da democracia, alguém ocupa o lugar e cuidará de nós, mas não é um democrata.

O senhor conhece certamente uma expressão tão usada nestes dez anos em que esteve fora da vida pública que é 'à política o que é da política, à Justiça o que é da Justiça', mas depois há um reverso dessa moeda que é os políticos não querem mexer na Justiça porque é uma espécie de vespeiro, digamos assim. E portanto não querem mudar as leis e isso também não permite que a Justiça seja mais rápida, mais eficaz para todos os cidadãos, nem sequer estou a falar dos titulares de cargos políticos. A política não devia fazer alguma coisa na Justiça?

Claramente que devia.

Porque é que os políticos não fazem? 

Nós falamos geralmente em termos públicos de todos os processos, digamos penais. Mas há o cível, há o fiscal, há o administrativo e esses dizem respeito à vida concreta das pessoas e das empresas, que passam sérias dificuldades, e aí está a imensa morosidade. Portanto, nós precisamos que a Justiça seja Justiça, ou seja, que faça Justiça em tempo certo, em tempo adequado, em tempo oportuno, aqui tem um ponto de convergência. Vamos lá ver, nós temos que juntar os interessados, não numa lógica corporativa, mas numa lógica de aproveitar o pensamento, as propostas de cada um. Ninguém é dispensado desta questão, agora temos é de o resolver. Dou-lhe um exemplo: há quantos anos se fala que é preciso combater a violação do segredo de Justiça? E o que é que se tem feito sobre isso? Podem ser alguns países, talvez, a Holanda, a Alemanha, verificar como é que se faz, garantir que haja uma rastreabilidade de todo o processo, portanto há coisas que podem ser feitas e algumas nem precisam de dinheiro, mas há sobretudo uma coisa que é essencial para se mudar o país: coragem política

Antes de encerrarmos este assunto, o novo procurador-geral da República, Amadeu Guerra, admitiu recentemente que António Costa continua a ser investigado. Já aqui tivemos as suas declarações sobre um assunto na ordem do dia, mas dois ex-primeiros ministros do PS com questões na Justiça isso prejudica a imagem do seu partido?

Vamos lá ver, se prejudica já prejudicou. Agora, aquilo que eu considero que para mim é mais relevante é que a democracia, neste momento, tem uma espessura muito fina e todas as instituições da democracia e do Estado de Direito e da Justiça devem ter bem presente isso e poder fazer com que determinados processos possam rapidamente ou ir a julgamento ou não ir, conforme as situações, no caso da Operação Marquês claramente ir a julgamento para que haja uma reconciliação dos portugueses com as instituições da democracia, porque, não tenham dúvidas, há muitos portugueses que não confiam nas instituições e o nosso dever como democratas é dar contributos para que essa relação de confiança...

E estão a votar em quem?

Alguns vão para a abstenção, já não acreditam, estão desiludidos com as promessas não cumpridas,

Mas muitos saem dessa abstenção...

Outros saem da abstenção para ir votar e muitas das vezes os movimentos populistas aproveitam-se precisamente destes casos, destas situações, de tudo isto e portanto isso é mais um alerta para as instituições da democracia...

Está a falar do Chega e do crescimento do Chega?

Sabe que o populismo tem o mesmo referente que a democracia, que é o povo, e todas as democracias, todos os regimes democráticos têm o seu quê de populismo, como todos os políticos, há populismo à esquerda, há populismo à direita. O problema é da quantidade. Se uma pessoa ingerir um bocadinho de veneno, enfim, pode ter um problema, uma lavagem ao estômago e tal, resolve-se, o problema é a dimensão do populismo e em Portugal o populismo tem vindo a crescer muito. E a meu ver uma das formas de o combater é resolver os problemas das pessoas e ter dimensão ética no exercício dos cargos públicos.

O que eu queria perguntar, provavelmente tem uma resposta simples, é se os partidos com essa matriz também muitas vezes cativam efetivamente um descontento que existe por parte das pessoas, um descontentamento real.

Claro.

E isso não é um risco em crescendo?

É um risco em crescendo.

Está à vista nos resultados eleitorais. Mas isso é o que tem a ver com a tal espessura fina da democracia?

É muito simples. Primeiro as pessoas escolhem entre as alternativas da democracia e quando não encontram aí respostas vão à procura de outras alternativas. E pode às vezes haver alternativas que estejam a jogar o jogo democrático, mas verdadeiramente para destruir a própria democracia, é o tal vírus que está muito bem exposto no livro 'Como Morrem As Democracias'. Antigamente como é que as democracias morriam? Geralmente por um golpe de Estado, hoje já não é, também é por dentro. Veja o que se está a passar nos Estados Unidos.

Estamos a terminar mas ainda temos uns instantes. Tocámos em muitos temas que acabam por ser matéria de um Presidente da República e portanto gostava de voltar ao início, entrando aqui no detalhe de cenários que é algo que um político também detesta, mas olhando para o caso de nomes à esquerda, sabemos que um dos nomes mais falados à esquerda é o nome de Mário Centeno, por exemplo, aquilo que lhe pergunto é muito simples, se a opinião do PS se inclinar para Mário Centeno, mas se António José Seguro tiver a intenção de avançar, faz como Jorge Sampaio em 95, avança à revelia, sem pedir licença?

Aquilo que eu lhe posso dizer é que não quero contribuir para perturbar a reflexão de candidatos a candidatos. Acho que este é um tempo em que as pessoas avaliarão, decidirão, quando houver candidatos pode ter a certeza que terei muito gosto no nosso espaço semanal de falar sobre eles, porque o estado em que o país está não basta a personalidade, é também saber qual é o compromisso que se quer assumir com os portugueses, qual é a razão que faz com que uma pessoa se candidate ao mais alto cargo da Nação. Nessa altura, quando houver candidatos, falaremos.

Se existir um candidato que é ou na altura terá sido militar, isso não é um problema para o regime, ou é?

É uma maneira inteligente de pôr a mesma questão. 

E se o candidato for um velho conhecido seu, Pedro Passos Coelho?

Quando houver candidatos, nós falaremos.

Já que nos está a desafiar, vou fazer-lhe também um desafio final. Com um deles trabalhou enquanto líder do Partido Socialista, mas com o outro não, conhece-o. Olha para a função presidencial mais próxima daquilo que foi o exercício por parte de Cavaco Silva ou de Marcelo Rebelo de Sousa, para pegar nos dois últimos exemplos, ou quer ir mais atrás na história e pegar noutras figuras?

É muito difícil fazer o trajeto que me propõe porque a nossa preocupação é com o futuro. E o futuro de hoje não tem comparação com os últimos dez anos, nem com os últimos 20, nem com os últimos 30.

O próximo Presidente da República terá de ter uma ação diferente?

Tem de ter uma ação diferente. Estamos numa situação de guerra na Europa, estamos numa situação de alteração de liderança nos Estados Unidos para uma liderança mais protecionista e menos, digamos, multipolar em relação ao mundo, que porventura terá a imprevisibilidade como marca da sua ação internacional. O país tem problemas gravíssimos que já tive a oportunidade de referir e, portanto, o futuro Presidente da República tem de se posicionar em relação ao futuro e do compromisso que ele for capaz de fazer com os órgãos de soberania em primeiro lugar, com as forças políticas, com as forças sociais, e a capacidade de mobilização necessária para resolvermos dois ou três problemas estruturantes. São só dois ou três, mas são os mais importantes.

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