"Foi constrangedor": como o PS foi à TV e às rádios defender Pedro Nuno antes de Costa parar tudo

1 jul 2022, 22:40
Pedro Nuno Santos e António Costa

Quarta-feira à noite: Pedro Nuno Santos dá duas entrevistas televisivas a anunciar três aeroportos para Lisboa. Quarta-feira à noite: um dos mais conhecidos deputados do PS fala na TV a defender a decisão de Pedro Nuno e respetivos argumentos. Quinta-feira de manhã: um deputado do PS fala em duas rádios a defender a decisão de Pedro Nuno e respetivos argumentos. Quinta-feira de manhã depois disto: Costa envergonha Pedro Nuno. Envergonhou o PS?

O despacho que indicava a estratégia do Ministério das Infraestruturas e da Habitação para o novo aeroporto de Lisboa foi publicado ao final da tarde do dia 29 de junho e apanhou o primeiro-ministro e o Presidente da República de surpresa. Mas enquanto os partidos da oposição se uniram para criticar a decisão tomada sem consulta prévia, dois deputados do PS seguiram a mesma via de Pedro Nuno Santos e, durante o curto prazo de validade em que o despacho constou das folhas do Diário da República, foram à comunicação social elogiá-lo e garantir que o maior partido da oposição não foi auscultado porque “se autoexcluiu”.

Nas horas entre a publicação do despacho e o comunicado de António Costa a pedir a sua revogação por não ter sido “negociada e consensualizada com a oposição” e por não ter sido concedida “a devida informação prévia ao senhor Presidente da República", os deputados Pedro Delgado Alves e Carlos Pereira, do PS, estiveram na rádio e na televisão a defender a decisão do Ministério de Pedro Nuno, louvando o “Governo” que “está a ancorar uma situação que se espera que fique enraizada”, como salientou Pedro Delgado Alves no programa Linhas Vermelhas da SIC.

Pedro Delgado Alves expressou a sua opinião, sabendo que António Costa já tinha insistido que a decisão sobre o novo aeroporto dependia de um acordo com o PSD. Quando confrontado com isto, garantiu que a publicação do despacho “não é contraditória com as declarações de Costa” porque o contexto “em que havia um compromisso assumido com o ainda líder da oposição mudou”, entre outras coisas, devido ao “ritmo que estamos a ter do aumento de procura do turismo”. “Mais cedo do que mais tarde é uma vantagem para todos”, garantiu ainda.

Pedro Delgado Alves anunciou também que Luís Montenegro, que toma posse no congresso do PSD , “não foi incluído, porque se autoexcluiu”. “O líder da oposição disse e sublinhou que isto é algo que compete ao Governo resolver. Autoexcluindo-se, ser parte da solução”, disse no programa Linhas Vermelhas, acrescentando que, “quando se fala de decisões unilaterais ou da ideia do rolo compressor da maioria, isso não se verifica. "O Governo foi eleito com uma maioria e, nesse sentido, tem capacidade de tomar uma decisão legítima com o mandato que tinha para decidir.”

Na mesma linha, o deputado Carlos Pereira, vice-presidente do Grupo Parlamentar do PS e que integra a Comissão de Economia e Obras Públicas, foi, já durante a manhã de quinta-feira, a poucas horas de Costa comunicar a sua intenção de revogar o despacho, reforçar o seu apoio a Pedro Nuno Santos. Em participações na TSF e na rádio Observador lembrou que Luís Montenegro, pouco depois de tomar posse e ter sido informado que Costa queria contar com a sua opinião para a resolução do dossier aeroporto, chamou ao governo “incompetente”.

"Apesar do repto do primeiro-ministro para que Luís Montenegro pudesse, agora que tomou as rédeas do PSD, contribuir para a solução, ter um sentido de responsabilidade para que houvesse um maior consenso sobre esta matéria e se pudesse avançar o mais rápido possível, o que se verificou foi que Luís Montenegro entrou a pés juntos e resolveu insultar o Governo e dizer que era incompetente”, disse o deputado do PS à TSF. 

Em declarações à CNN Portugal a propósito desta postura do PS, o politólogo José Fontes sublinha que são notórias as semelhanças entre o discurso dos dois deputados e a entrevista que Pedro Nuno Santos deu à RTP pouco depois de o despacho ter sido publicado. Por outro lado, para Fontes, há uma “enorme desilusão” ao ver “toda essa pressa de ir acudir Pedro Nundo Santos”. “Foi constrangedor”, diz à CNN Portugal, ver como os deputados “foram a correr defender uma decisão perante repetidas afirmações que pediam o contrário, que pediam uma consensualização sobre a solução para o aeroporto de Lisboa”.

O politólogo afirma que aos deputados “exige-se mais autonomia e menos seguidismo” e sublinha que “mandava a prudência aguardar horas, ou dias, antes de aplaudirem uma decisão que deixou perplexa toda a gente menos os deputados”. Os deputados do PS, critica ainda, estão “permanentemente a querer defender os ministros sem perceber o que faz sentido ou não”. “Há uma dependência face ao Governo. Não há espírito crítico”, aponta ainda.

Já a politóloga Paula do Espírito Santo considera estas movimentações “contraditórias” em volta de uma decisão “pouco democrática e com pouca ética democrática”. A forma como os deputados do Partido Socialista defenderam a decisão do ministro mostra como medidas estruturais para o país “não podem ser tomadas de forma precipitada” e indicam “falta de concertação interna dentro do próprio partido”. 

Espírito Santo garante também que a crise política colocou uma “mancha” sob Pedro Nuno Santos, dando, ao mesmo tempo, “um grande empurrão ao PSD num momento em que elege o seu novo líder”. A politóloga acredita também que o próprio futuro político de Pedro Nuno Santos como sucessor de Costa está afastada num futuro próximo: “Mesmo que a memória política seja fraca, não me parece que este puxão de orelhas que o fez ser diminuído politicamente seja recuperável”.

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