Os fiéis, o núcleo duro e os sucessores. O governo de Costa absoluto

23 mar 2022, 21:36
António Costa celebra vitória do PS nas legislativas (Miguel A. Lopes/Lusa)

António Costa escolheu para novos ministros os elementos do seu círculo mais próximo, que são também militantes do partido. E reforçou o poder da grande aliada Mariana Vieira da Silva. Sob sua alçada ficaram também os nomes falados para o suceder no PS. A CNN Portugal ouviu vários politólogos que descodificam os sinais revelados pelas opções do primeiro-ministro

Com os mais fiéis, os potenciais sucessores e os olhos postos nos fundos europeus. Foi assim que António Costa, agora com maioria absoluta, construiu o seu novo governo.

O núcleo duro

"Centralizador e personificado na figura de António Costa". É assim que o politólogo José Filipe Pinto define o Governo apresentado esta quarta-feira, que revela uma aposta nos socialistas que pertencem ao núcleo duro do primeiro-ministro. 

Como novos ministros e para algumas das pastas mais importantes, o líder do Executivo escolheu os políticos do seu partido que lhe são mais fiéis e próximos, como Fernando Medina, que vai para as Finanças, Duarte Cordeiro que colocou no Ambiente e Ana Catarina Mendes, que assume a o cargo de Adjunta e coordenará os Assuntos Parlamentares. Os três vão juntar-se a outros governantes que já fazem parte do círculo governativo mais restrito do líder do Executivo. É o caso de Tiago Antunes, que vai continuar como secretário de Estado, mas numa pasta diferente, sabe a CNN Portugal, e de Mariana Vieira da Silva, que assume grande protagonismo.  A ministra, uma das maiores aliadas socialistas do primeiro-ministro, vai reforçar o seu papel de figura central do Executivo, subindo a número dois de António Costa.

Um dos eixos centrais na construção do atual Governo passou assim por Costa se rodear dos socialistas que o têm acompanhado.  "Ao apostar no seu núcleo duro, António Costa está a preferir dar primazia à confiança política e não à competência técnica”, explica o politólogo José Filipe Pinto. O mesmo identifica o politólogo Bruno Gonçalves Bernardes: “Há duas tendências em Portugal na formação de governo. Uma é colocar pessoas com conhecimentos técnicos e independentes. Outra é recorrer a pessoas ligadas ao partido”. Com a maioria absoluta, diz, Costa pode “procurar satisfazer várias sensibilidades dentro do PS”.

Até agora à frente da bancada socialista, Ana Catarina Mendes, considerada a operacional de Costa no PS, chega agora a funções governativas. A liderança da bancada ficará agora nas mãos de Eurico Brilhante Dias.

Já Duarte Cordeiro, que  foi diretor de campanha das últimas eleições legislativas  e que, durante os últimos anos serviu como o intermediário nas negociações com a geringonça, enquanto secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos parlamentares, sobe agora a ministro.

Fernando Medina, por seu lado, sempre foi um dos maiores defensores públicos da governação de Costa e  foi-lhe entregue as Finanças. “É uma pessoa da confiança pessoal do primeiro-ministro. E é uma politização da pasta das Finanças”, diz o politólogo Adelino Maltez. Até agora, com Mário Centeno e João Leão, as contas do país estavam entregues a personalidades com um perfil mais técnico.

Mesmo com a derrota em Lisboa, nas últimas autárquicas, Medina recebe uma prova de confiança. “Não podemos esquecer que foi uma derrota muito à tangente, mais ligada à desmobilização do eleitorado. Não foi isso que colocou em causa a sua competência política”, explica a politóloga Paula do Espírito Santo.

Duarte Cordeiro foi diretor de campanha do PS nas últimas eleições (Lusa / Mário Cruz)

O poder de Mariana Vieira da Silva

Mariana Vieira da Silva é considerada a estratega do partido, sendo responsável por documentos orientadores da política socialista. Até agora ministra de Estado e da Presidência, é um dos nomes que reforça poder neste núcleo duro. E vai acumular as pastas que já tinha com a coordenação do Plano de Recuperação e Resiliência e a Administração Pública. Ou seja, com o fim do Ministério do Planeamento, fica sob sua tutela a secretaria de Estado que é responsável pelos fundos comunitários, com quase 58 mil milhões de euros para executar até 2029. Além disso, ao tutelar a Administração Pública, terá nas mãos as questões relacionadas com os funcionários públicos.

 

Maria Vieira da Silva é considerada a 'estratega' do PS (Lusa/Miguel A. Lopes)

As estreias que surpreendem

Outro dos sinais do poder absoluto de António Costa é o facto de ter separado o governo por em áreas, tendo ele próprio a tutela de algumas: como os Assuntos Europeus, a Digitalização e Modernização Administrativa.

“É finalmente uma remodelação, embora não traga surpresas de maior. António Costa pôs a carne toda no assador da respetiva influência. Mas este não é um governo feito no Largo do Rato”, traça o politólogo Adelino Maltez.

E onde estão então as maiores inovações deste elenco governativo? “Uma mulher no ministério da Defesa [Helena Carreiras], uma cientista no ministério da Ciência [Elvira Fortunato] e um encantador de palavras no ministério da Economia, que vai aplicar um plano que ele próprio inspirou [António Costa e Silva]”, considera Adelino Maltez.

Do atual Governo, o maior de sempre, há vários ministros que não seguem para a próxima equipa: Augusto Santos Silva (indicado para presidente da Assembleia da República), João Leão, Francisca Van Dunem, Alexandra Leitão, Nelson de Souza, Graça Fonseca, Manuel Heitor, Tiago Brandão Rodrigues e João Pedro Matos Fernandes. E pastas dadas a polémicas, como a Administração Interna ou a Justiça, ganham agora um novo responsável.

António Costa e Silva desenhou o Plano de Recuperação e Resiliência (Lusa/Mário Cruz)

Os sucessores (em teste)

Após a luz verde do Presidente da República ao novo executivo, António Costa descreve a nova equipa como “um governo de combate, mais conciso, com um forte núcleo político”. E há outro detalhe revelador do ‘controlo’ do primeiro-ministro: colocou no executivo, debaixo da sua alçada, todos os nomes mais falados para o sucederem no PS, colocando-os em pé de igualdade. São eles Mariana Vieira da Silva, Ana Catarina Mendes, Fernando Medina e Pedro Nuno Santos – este último, visto internamente, como o candidato mais forte.

“É como se preparasse uma sucessão hereditária”, nota José Filipe Pinto, explicando que desta forma acaba por “não atribuir primazia a nenhum dos candidatos”. O politólogo considera que essa sucessão “até pode ser feita durante esta legislatura”. Entendimento diferente tem Adelino Maltez, ao considerar que António Costa não está a pensar na sucessão a curto prazo”.

Seja qual for o prazo, consolida-se o reconhecimento externo destes militantes socialistas, avisa a politóloga Paula do Espírito Santo: “Estas figuras estão a ser postas à prova, estão a ser examinadas na sua competência política”.

Medina sobe a ministro e fica em igualdade de circunstâncias com outros potenciais sucessores de Costa no PS (Lusa/Miguel A. Lopes)

 

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