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Explica-me, Sérgio: como é que aguentas tantos tratamentos de polé?

14 set 2022, 13:37
Sérgio Conceição no Gil Vicente-FC Porto

Rui Santos escreve sobre a pesada derrota do FC Porto perante o Brugge (0-4) e diz que há um momento em que o grito e a energia não substituem a falta de qualidade. O comentador da CNN/TVI elogia o treinador portista e diz que tem aguentado o que outros não aguentariam

Leio que a viatura onde seguiam a mulher e dois filhos de Sérgio Conceição à saída do estádio do Dragão, após a pesada e inesperada derrota do FC Porto perante o Brugge (0-4), foi apedrejada.

Continua a existir no futebol, em todo o lado mas também no FC Porto, por força do poder que Pinto da Costa deu às claques, gente que não consegue perceber que todas as equipas, as mais e as menos apetrechadas, têm maus momentos.

Não se sabe ainda se foram indivíduos relacionados com claques que protagonizaram o inaceitável episódio, que qualquer pessoa de bem não pode deixar de condenar, mas há um fenómeno de violência há muito enraizado no futebol com o qual o país e as suas instituições de uma maneira geral têm pactuado.

Não é uma coisa de uma derrota. É um fenómeno de proteção que gera bolsas de impunidade inaceitáveis.

A copiosa derrota do FC Porto merece ser explicada.

A equipa do FC Porto não jogou de acordo com os seus princípios. Abdicou da sua identidade, não lutou de uma forma generosa e abnegada como costuma fazê-lo, foi mais do que uma caricatura de si própria.

Estranhamente.

Nos últimos anos, perante a indiscutível perda de qualidade do plantel do FC Porto, que Sérgio Conceição tem disfarçado até ao tutano mexendo nas vísceras dos jogadores, apelando ao seu carácter e a todo o suor que é proibido regatear, foi possível camuflar a realidade.

No plano interno é mais fácil porque há um conjunto de vicissitudes em que os grito e as pressões fazem o seu trabalho.

Os comportamentos também mudam. Aqui, mais faltas e mais ruído. Quando se entra na competição internacional, a abordagem é diferente: menos ruído, menor pressão, outro comportamento perante os agentes e, no fim, melhores ou piores desempenhos.

Ontem, o FC Porto teve um apagão. Um apagão estranho. Não foi estranha a ausência de classe e talento. Foi estranha a ausência de atitude competitiva. 

Com a sua energia e grau de exigência, Sérgio Conceição costuma estar com a equipa em campo, como dizer?, dentro de cada um dos jogadores. Ontem, os atletas estavam amorfos, desvitaminados, anémicos.

Todos uma sombra - e até David Carmo “dos 20 milhões” não fez exibição que valesse 1 euro.

O episódio que envolveu a viatura onde seguiam a mulher e dois filhos do treinador é inaceitável, fosse qual fosse o contexto e muito menos quando se quer visar é o treinador Sérgio Conceição.

O FC Porto fez o que tinha de fazer, assumir uma posição oficial de repúdio, mas a injustiça não se apaga porque Sérgio Conceição tem sido, nos últimos anos, a base de sustentação dos êxitos do FC Porto.

A SAD continua a viver faustosamente com o clube ‘no vermelho’, porque não soube gerir — no tempo das vacas gordas — as receitas extraordinárias que fez com a venda de alguns dos jogadores de grande nível que passaram pelo clube, muito por força de uma política de intermediações proibitiva, e Sérgio Conceição tem sido o garante da rentabilidade de um balneário que tem cada vez menos qualidade.

À grande instituição que é o FC Porto falta uma político de verdade ou quem, nos seus quadros, não pactue com quem ajuda a veicular a falta de verdade, como foi o caso escandaloso das duas costelas de Otávio, que andaram pelo campo a par com a falta de inspiração de todos os jogadores.

Não sei, Sérgio, como aguentas (o episódio da saída do Francisco para o Ajax gerou comentários de quem se sentiu legitimado para os fazer) mas há uma coisa que sei: és de excessos, já fizeste coisas — no calor da competição — das quase tenho a certeza de que não te orgulhas, mas não mereces. Não mereces estes tratamentos de polé. Como é que aguentas?!

Vejo-te num colete de forças, a lutar contra um pequeno mundo que te rodeia, um pequeno mundo que não merece estar na posição de te dar, ou não, uma carta de alforria.

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