Partidos angolanos criticam-se entre si: MPLA diz que manifestações da oposição são “comportamento de mau perdedor” e UNITA denuncia ameaças

Agência Lusa , FMC
9 set 2022, 19:45
Eleições em Angola (Getty Images)

O MPLA desvalorizou esta sexta-feira a convocação de manifestações pelos partidos da oposição angolana, que contestam os resultados eleitorais, considerando tratar-se de um “comportamento reiterado do mau perdedor” e minimizou a forte presença das forças de segurança nas ruas.

Para o secretário para a Informação e Propaganda do bureau político do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), declarado vencedor das eleições de 24 de agosto, a convocação de manifestações pela oposição reflete o “comportamento do mau perdedor”.

“Este é sempre o comportamento do mau perdedor, infelizmente as pessoas falam em democracia, mas não sabem estar nela e isso é visível no comportamento de cada um, então nós não temos de ter essa preocupação”, afirmou esta sexta-feria à Lusa Rui Falcão.

O MPLA “foi um dos atores deste pleito eleitoral, venceu a corrida, naturalmente vai governar, o seu executivo vai tomar posse e em função disso nós vamos implementar o programa que foi sufragado, agora o demais não é um problema do nosso partido”, apontou.

“O Estado tem instituições próprias que devem tratar deste assunto (manifestações públicas) e não nós. Somos apenas um ator eleitoral, um ator do processo democrático do país, não vê esse comportamento nos nossos militantes”, realçou o político.

“Nós temos uma maneira diferente de estar em democracia e é isto que nos diferencia”, disse

A oposição angolana manifestou, na quinta-feira, “inquietação” face à marcação de datas para investidura do presidente da República sem validação dos resultados eleitorais, que entretanto foram validados na quinta-feira ao final da tarde, e anunciou a criação de um grupo de trabalho para convocar manifestações que expressem “a repulsa” dos eleitores.

A pretensão consta de um comunicado subscrito por cinco partidos da oposição angolana: União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), Convergência Ampla de Salvação de Angola - Coligação Eleitoral (CASA-CE), Partido de Renovação Social (PRS), Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA) e Bloco Democrático.

Os subscritores afirmam também estar atentos “ao clamor e ao sentimento da população”, pelo que decidiram criar um grupo de trabalho “para estudar o quadro e as condições para a organização e convocação de manifestações como expressão do sentimento de repulsa dos cidadãos eleitores”.

Essas manifestações, destacaram, terão “um caráter estritamente pacifico e ordeiro”, realizando-se em coordenação com os órgãos de ordem pública e “enquadram-se no espírito da ordem constitucional, da lei e do interesse publico”.

Rui Falcão disse que o seu partido não está preocupado com a convocação de manifestações, porque “acompanha e respeita tranquilamente as normas que a democracia impõe”.

“Nós acompanhamos o que vai sendo dito, mas não somos parte disso, não temos nada a fazer em relação a isso, vamos acompanhando o processo tranquilamente e como sempre respeitando as normas que a democracia impõe”, frisou.

“Quem violar a lei assume individualmente com a responsabilidade, somos um partido com sentido de Estado, com vocação para o exercício de poder de governação, e não vamos baixar o nível a esse ponto, nós estamos já noutra galáxia, nós vemos o país com outros olhos”, assegurou.

Sobre a presença considerável de efetivos das forças de defesa e segurança nas principais ruas e avenidas de Luanda, exibindo artilharia e vários meios militares, em cumprimento do “estado de prontidão combativa”, Falcão insistiu que o MPLA não é parte deste processo.

O Estado, argumentou, “tem mecanismos próprios, o MPLA não controla esses mecanismos”. “Como sabe há órgãos que são apartidários e em relação aos quais nós não exercemos quaisquer influências”.

“Como cidadãos preocupa-nos quem fale de democracia e continue a ser o arruaceiro de sempre e isso é que me dá pena, gostaríamos de ter uma oposição mais construtiva que contribuísse mais para o desenvolvimento do país e que não, permanentemente, o levasse para esse retrocesso que é visível no comportamento das pessoas”, notou.

UNITA denuncia ameaças e apela à intervenção das autoridades

O secretário provincial da UNITA em Luanda, Nelito Ekuikui, acusou o partido no poder em Angola, MPLA, de estar a divulgar uma lista de “alvos a abater” e desafiou o regime a “matar mesmo” em vez de fazer ameaças.

O também deputado publicou nas suas redes sociais um vídeo exortando as autoridades - desde o presidente da República, órgãos de defesa e segurança, Procuradoria-Geral da República e o chefe dos serviços de Informações, general Garcia Miala - a agirem, perante as ameaças à integridade física às figuras ligadas à União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA, oposição angolana) desde as eleições.

Segundo disse à Lusa Nelito Ekuikui, que atribui a divulgação das ameaças nos grupos do Whatsapp à direção de informação e propaganda do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), a polícia já foi contactada, mas mostrou-se cético quanto a uma intervenção das autoridades: “não vão fazer nada”.

Contactado pela Lusa, o secretário para Informação e Propaganda do Bureau Político do Comité Central do MPLA, Rui Falcão, negou que o partido esteja envolvido no incidente, salientando que este “não se revê e nada tem a ver com esse comportamento ignóbil só possível de ser adotado por criminosos a soldo”.

E contra-atacou a UNITA que, segundo diz, está a seguir uma estratégia: “Foi para isso que contrataram ex-agentes da secreta israelita. Quem tem vindo a estimular os militantes da UNITA para ações de insurreição são os seus patrocinados”, declarou à Lusa.

O cartaz que circula nas redes sociais apresenta várias figuras ligadas à UNITA, entre as quais o presidente, Adalberto Costa Júnior, Nelito Ekuikui, o general Abílio Kamalata Numa e os ativistas Osvaldo Kaholo, Dito Dali e Gangsta, com o título “Atenção autoridades”.

“Em caso de instabilidade no país, fruto das eleições, esses devem ser os primeiros a ser abatidos”, diz o cartaz, em letras vermelhas, que tem sido partilhado juntamente com uma lista de endereços, incluindo de familiares de dirigentes da UNITA, que Nelito Ekuikui afirmou serem verdadeiros.

“Estou muito tranquilo e sereno, não sou um homem que se deixa ameaçar, não sou um homem que se deixa abater e abalar”, disse o responsável da UNITA.

As autoridades angolanas, “que deviam velar pela nossa segurança”, estão “constantemente a ameaçar-nos”, lamentou, acrescentando: “o correto é matar mesmo, até porque conhecem as nossas casas”.

“Venham matar e depois façam um funeral, é mais fácil, em vez de constantemente ameaçar, se o nosso sangue é tão importante para se manterem no poder, à margem da vontade do povo, então venham mesmo matar em vez de intimidar as pessoas”, desafiou, durante uma transmissão em direto no Facebook, garantindo: “eu não vou fugir do país”.

A Lusa contactou o Serviço de Investigação Criminal (SIC), mas não foi possível obter uma resposta até ao momento.

Esta semana foram capturados e detidos dois jovens por proferirem ameaças e ofensas ao presidente da República e à primeira-dama na rede Tik Tok.

Um outro homem foi detido por partilhar nas redes sociais um áudio dizendo que o presidente da República tinha morrido.

Ambos os casos tiveram cobertura mediática na comunicação social angolana.

“Da mesma forma que quando alguém ataca o presidente da República, um órgão de soberania, os senhores, reagem eu estou à espera que parem esta onda de ameaças às pessoas. Foram longe demais se me quiserem matar a mim, matem-me, mas não envolvam os meus filhos”, disse ainda Nelito Ekuikui, dirigindo-se ao Procurador-Geral da Republica, ao ministro do Interior, ao Presidente da Republica e ao general Garcia Miala.

O ambiente de tensão aumentou no contexto das eleições gerais de 24 de agosto, em que o MPLA venceu, mas cujos resultados foram contestados pela UNITA, pretensão que foi recusada pelo Tribunal Constitucional.

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