"Eu nasci na Guiné-Bissau". Ministra da Saúde foi ouvida no dia em que morreu uma grávida num hospital e acabou a defender-se de uma acusação de xenofobia

31 out, 19:25

No mesmo dia em que morreu uma grávida de 38 semanas no Hospital Amadora-Sintra, Ana Paula Martins teve de comparecer a uma reunião agendada da comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública, onde apresentaria o orçamento para o setor. As questões relacionadas com o dinheiro, a falta de profissionais e a escassez de meios foram postas de parte em alguns momentos

A ministra da Saúde não se vai demitir após o caso da pela morte de uma grávida de 38 semanas devido a uma paragem cardiorrespiratória, dois dias após ter-se deslocado ao Amadora-Sintra e de lá ter sido enviada para casa com um diagnóstico de hipertensão.

Para azar de Ana Paula Martins, a morte ocorreu no dia em que estava agendada uma reunião da comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública, onde apresentaria o orçamento para o setor. As questões relacionadas com o dinheiro, a falta de profissionais e a escassez de meios foram postas de parte em alguns momentos.

Antecipando perguntas incómodas sobre a morte no Amadora-Sintra, Ana Paula Martins falou logo na intervenção inicial sobre os problemas na obstetrícia e justificou os elevados números de partos extra-hospitalares nos últimos anos - 169 em 2022, 173 em 2023, 189 em 2024 e 154 até outubro deste ano - com o perfil das grávidas.

“Sabemos quem são e o que aconteceu. São grávidas que nunca foram seguidas durante a gravidez, sem médico de família, recém-chegadas a Portugal e que, muitas vezes, nem falam português, não foram preparadas para chamar o socorro e nem telemóvel têm”, disse Ana Paula Martins.

Estas frases, entre outras, valeram uma acusação de xenofobia por parte do Livre contra a ministra. Na sua intervenção na comissão, o deputado Paulo Muacho lamentou a morte da grávida e acusou a ministra da Saúde de ter “adotado o discurso do Governo no sentido de todos os problemas serem responsabilidade dos estrangeiros e dos imigrantes”.

“Foi o que a sra. ministra aqui disse. ‘Bom, os bebés que nascem fora das ambulâncias são de mães estrangeiras que não têm telemóvel, que não estão a ser acompanhadas’, foi isso que disse”, acusou Muacho.

“A sra. ministra também fez questão, quando se referiu ao caso em específico, de referir duas vezes a nacionalidade da mulher em questão. Parece-nos que essa questão será irrelevante nesta matéria”, acrescentou.

O deputado Paulo Muacho, do Livre, acusou Ana Paula Martins de xenofobia durante a reunião da Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública desta sexta-feira (António Cotrim/Lusa)

Na resposta, Ana Paula Martins lembrou "um facto".

“Eu nasci na Guiné-Bissau. Não vejo nenhum problema em referir o sítio onde as pessoas nasceram. Nasci lá porque o meu pai trabalhava lá, nunca o escondi, bem pelo contrário, tenho orgulho da minha infância e até, no limite, se disse duas vezes, disse a falar de alguém que é compatriota”, começou por dizer a governante.

“O senhor tirou das minhas palavras aquilo que eu não disse. Eu só disse um facto: esta senhora é oriunda da Guiné-Bissau, chegou cá há muito pouco tempo, a primeira vez que a vimos foi com 38 semanas de gravidez e, já agora, acrescento: os partos das ambulâncias em boa parte são iguais, temos os dados. A forma que temos de resolver isto é sabendo que temos pessoas com estas características, e por isso é que fizemos a proposta de ter enfermeiros que possam falar com estas mulheres, que chegam sem terem apoio, para não andarem perdidas no sistema”, acrescentou.

Ana Paula Martins disse ainda que há médicos e enfermeiros que não fazem e têm medo de fazer urgências devido ao “enorme risco” de atender pessoas “que nunca viram e que não acompanharam na gravidez”.

“Isto é um problema, quer queiram, quer não queiram”, disse a ministra.

Ana Paula Martins não deu qualquer nova informação sobre o tema, remetendo explicações para o que o INEM e o Hospital Amadora-Sintra disseram acerca do caso, e reiterou: “é uma grávida que não era acompanhada até que deu entrada no Amadora-Sintra já com 38 semanas.” 

Questionada pelo Chega sobre se se demitirá no seguimento desta morte, a ministra foi concreta: “Continuar? A minha resposta é não, não me demito”. 

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