As juízas do Tribunal da Relação de Lisboa alertaram o Tribunal Constitucional para o “perigo de prescrição de alguns crimes” pelos quais José Sócrates foi pronunciado. Em causa estão os crimes de branqueamento de capitais e falsificação de documentos, os poucos que foram validados pelo juiz Ivo Rosa. O Constitucional decidiu, entretanto, e indeferiu o pedido de José Sócrates.
O antigo primeiro-ministro recorreu para a Relação do despacho daquele juiz que o indiciou por seis crimes, e depois, quando foi conhecido o coletivo que o iria analisar, pediu o afastamento das juízas - sendo esta última questão que estava pendente no Constitucional e que levou as juízas a admitirem que este processo está em perigo de prescrição.
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Num documento de 4 de janeiro deste ano, assinado pela juíza Maria José Caçador, pedia-se informações urgentes sobre o andamento da reclamação feita em julho de 2023 pela defesa de José Sócrates para o Constitucional. "Atento o lapso de tempo decorrido desde que os autos foram reencaminhados ao Tribunal Constitucional (18 de julho de 2023), tendo em conta o carácter urgente dos mesmos e o perigo de prescrição de alguns crimes, oficie, novamente, ao Tribunal Constitucional, com nota urgente, solicitando que informe o estado dos autos", refere o pedido que consta do processo que a CNN Portugal consultou e que entretanto teve desenvolvimentos, tendo, dia 17 de janeiro, a defesa do antigo primeiro-ministro sido informada que o Constitucional não lhe deu razão. .
Nas mãos do Constitucional estava uma reclamação feita por Sócrates sobre a ação do Supremo. Isto depois deste ter recusado o requerimento de afastamento do coletivo das desembargadoras Margarida Vieira de Almeida, Maria do Rosário Martins e Maria José Caçador, em junho do ano passado, e de não ter também aceite enviar para o Constitucional um outro pedido onde se invocava haver inconstitucionalidade nas regras de distribuição do processo na Relação. Perante esta situação, a defesa de Sócrates fez, a 18 de julho de 2023, uma reclamação para o TC desta última decisão do Supremo.
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Na altura, perante estes recursos, o Supremo chegou a acusar Sócrates de “ilegitimamente protelar o regular andamento do processo, subvertendo as finalidades do regime”.
À CNN Portugal, Pedro Delille, advogado de Sócrates garantiu não ter qualquer influência no risco de prescrição do caso, adiantando que o próprio processo “foi feito para se arrastar” e que a “prescrição é desculpa de mau perdedor do Ministério Público”.
Este não era porém, o único recurso que estava na Relação sobre a decisão de Ivo Rosa - que dos 31 crimes que Sócrates começou por ser acusado o ilibou de 25, validando apenas seis. Se Sócrates contestou a manutenção destes seis, o Ministério Público recorreu por Ivo Rosa ter deixado cair os restantes, nomeadamente de corrupção. Recurso que já teve recentemente resposta, tendo a Relação considerado que a decisão do juiz foi errada e que há indícios para acusar o antigo-primeiro ministro por 22 crimes, entre eles corrupção.
Aliás, o facto da Relação ter já decidido "anular" o despacho do juiz Ivo Rosa corre o risco de vir a interferir no outro recurso que está a aguardar a decisão do TC, pois segundo os especialistas, pode-se considerar já não "existir o despacho" em causa.
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Enquanto decorrem todos estes recursos, a defesa de José Sócrates decidiu colocar outros dois requerimentos no Tribunal da Relação, a solicitar o afastamento de várias magistradas. Um a insistir no afastamento de duas juízas que estão a analisar o despacho de Ivo Rosa; outro a pedir o mesmo para outras duas magistradas que decidiram o recurso do MP e voltaram a validar o crime de corrupção. O argumento usado é o de que estão “em situação de impedimento” pelo facto de terem sido colocadas em outros tribunais entre 2022 e 2023.
O primeiro requerimento contra as juízas que estão ainda a analisar os seis crimes validados por Ivo Rosa foi entregue ao tribunal no dia 10 de janeiro, alegando que José Sócrates “tomou conhecimento” de que duas das juízas passaram a pertencer ao Tribunal da Relação do Porto - no caso da juíza Maria Rosário Martins que foi colocada neste tribunal no movimento ordinário de 2022 - e ao tribunal da Relação de Évora, no caso da juíza relatora Maria José Caçador, que foi ali colocada no movimento de 2023.
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“Deixaram de pertencer a este tribunal”, lê-se no requerimento que pede que haja uma segunda distribuição do processo. “Estes factos determinam incapacidade e incompetência de ambas as juízas para o exercício de poderes jurisdicionais neste processo”, sustenta a defesa.
O segundo requerimento foi feito depois do outro coletivo ter, na semana passada, validado 22 crimes, incluindo corrupção, segundo relatou o advogado Pedro Delille à CNN Portugal, numa entrevista, referindo-se às juízas Raquel Correia Lima e Madalena Caldeira, colocadas nos tribunais da Relação do Porto e de Guimarães no movimento ordinário de 2023.
A defesa do ex-primeiro-ministro aguarda agora por saber se os requerimentos serão deferidos pela Relação e se existirá uma nova distribuição dos processos. Pedro Delille sublinha que se o resultado for negativo o tribunal "foi longe demais”. “Se isto se se mantiver, Portugal deixará de se considerar um Estado de Direito”.
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