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“É gás pimenta, ó animal”: militares da GNR torturam por diversão imigrantes de Odemira

Imigrantes agredidos e humilhados por agentes fardados em Odemira que filmaram os próprios atos de violência. Sete militares da GNR estão acusados de um total de 33 crimes. Investigação CNN/TVI revela descrições e imagens que estão na Justiça

Aviso: este artigo contém linguagem ofensiva que pode ferir a suscetibilidade de alguns leitores 

Quando a Polícia Judiciária apreendeu em 2019 os telemóveis a cinco militares do posto da GNR de Vila Nova de Milfontes, Odemira, suspeitos de alegados maus-tratos a imigrantes, estava longe de imaginar a realidade em que iria tropeçar. O aparelho de um guarda de 25 anos, sujeito a perícias da PJ, revelou imagens brutais – até agora escondidas pela Justiça mas às quais a CNN Portugal e a TVI tiveram acesso. Trata-se de sete vídeos - com imagens filmadas por diversão pelo próprio militar - de sequestro, torturas, humilhações, violência e insultos racistas a vários trabalhadores agrícolas daquela região. Assim consta no processo judicial. 

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As vítimas, provenientes do sul da Ásia, a maioria do Bangladesh, do Nepal ou do Paquistão, são apanhadas na rua, de forma aleatória e gratuita, para gozo de sete militares fardados, ao serviço do Estado, que surgem nas imagens. Montam emboscadas a pretexto de falsas operações stop, de fiscalização de trânsito, e levam os imigrantes para o posto – onde os agridem e humilham, sendo sujeitos a várias praxes violentas. Numa das falsas operações stop, os elementos da GNR apanharam um imigrante que, levado para um descampado à noite, foi torturado com gás pimenta, que os militares obrigaram a inalar pela boca e pelo nariz através do tubo do aparelho de medição de taxa de alcoolemia, conhecido como “teste do balão”.

Enquanto isso, com a vítima em sofrimento e a pedir água em inglês, o que lhe recusam, surgem nesse vídeo militares da GNR a rir-se proferindo a seguinte frase: "É gás pimenta, ó animal. Filho de uma grande puta! Animal!".  

Um dos militares da GNR dá uma ordem em Inglês para o indivíduo colocar o tubo de plástico na boca. O militar da GNR, enquanto se ri, diz que aquele tubo tem gás pimenta no interior. O homem não entende português. É ainda visível o veículo da GNR no local e ouve-se: “Chupa isso, que tem gás pimenta, animal!”

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A Polícia Judiciária de Setúbal, que tinha um primeiro processo em que já investigava cinco militares por factos parecidos, mas apenas com prova testemunhal, arranjou nas perícias a estes telemóveis provas irrefutáveis sobre novos factos - que desconhecia. Foi então extraída uma certidão para processo autónomo, a correr em segredo no Ministério Público de Odemira, no qual a PJ analisou os sete vídeos, fotograma a fotograma. E contextualizou todas as imagens, legendando-as com as frases que iam sendo proferidas pelos militares agressores. 

Militares da GNR repetem insultos como "seu filho de uma ‘granda puta’”

Concluída a análise às várias situações, num despacho de acusação de 10 de novembro deste ano e ao qual a CNN Portugal e a TVI (ambas estações da Media Capital) tiveram acesso, o Ministério Público não tem dúvidas: "Faziam-no em manifesto uso excessivo de poder de autoridade que o cargo de militar lhes confere". Mais: "Todos os arguidos agiram com satisfação e desprezo pelos indivíduos". 

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Quanto aos motivos, a procuradora conclui: "Ódio claramente dirigido às nacionalidades que tinham e apenas por tal facto e por saberem que, por tal circunstância, eram alvos fáceis".

O comandante do posto foi chamado à investigação e, pelas vozes e imagens, identificou sete dos seus subordinados. Estão acusados de um total de 33 crimes, entre os quais sequestro, ofensas à integridade física qualificada e abuso de poder. Das vítimas identificadas nas imagens, uma já morreu de acidente e outras terão saído do país.

Em reação à investigação TVI/CNN Portugal, o Ministério da Administração Interna confirmou já estar a par do caso, adiantando que três dos militares envolvidos na situação de Odemira foram suspensos de funções anteriormente por envolvimento noutro caso.

Após inspirar profundamente pela boca, conforme lhe tinha sido ordenado em inglês, o indivíduo fica aflito e cospe para o chão. Nesse momento, continua a ser insultado com expressões como “filho da puta” e “burro do caraças”

No primeiro processo a ser investigado pela PJ e em que não havia imagens a sustentar as provas mas só testemunhos, cinco militares foram condenados a penas de prisão suspensa por crimes de ofensas à integridade física, sequestro, entre outros. Desses cinco elementos, e tal como o MAI confirmou esta quinta-feira, três são comuns a este caso de tortura em Odemira. Respondem aqui por sequestro, abuso de poder e ofensas à integridade física.

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