É um pássaro? É um avião? Não, são os lucros da banca a voarem. As principais instituições portuguesas tiveram um “super ano” em 2022, com resultados líquidos acima dos 2.000 milhões de euros, o que representa uma subida expressiva de 52% em relação ao ano transato. Muitos fatores ajudaram a construir aquele que foi o melhor ano para o setor em muito tempo. Mas há um ponto em comum em todos eles: a subida das taxas de juro, que fez a margem financeira disparar 30%.
Isto significa que quatro dos cinco principais bancos portugueses – o Novobanco só apresenta contas no dia 9, mas já se sabe que vão ser lucros recorde, possivelmente os melhores da banca privada – lucraram mais 5,5 milhões de euros por dia. Porém, nem todos estão, ainda assim, no mesmo patamar de rentabilidade.
PUB
Enquanto Caixa Geral de Depósitos (CGD) e Santander Totta já apresentam ROE (rentabilidade dos capitais próprios) na casa dos 10%, um indicador de referência para atrair investidores para um setor particularmente intensivo em capital, o BCP tem um longo caminho das pedras a percorrer, sobretudo por causa dos problemas com o seu banco na Polónia. O banco liderado por Miguel Maya teve o lucro mais baixo em relação aos pares, ligeiramente acima dos 200 milhões de euros, subindo 50% em relação a 2021, e não abre o jogo se vai distribuir dividendos.
No banco público, os lucros (quase recorde) de 843 milhões permitem a Paulo Macedo entregar ao Estado o maior dividendo da sua história: 352 milhões de euros em cash mais o edifício-sede, avaliado em mais de 300 milhões, a título de dividendo em espécie. “É um dividendo fantástico”, destacou o líder da instituição esta quinta-feira.
PUB
Quanto ao Santander Totta, o resultado duplicou no ano passado para mais de 600 milhões de euros e Pedro Castro e Almeida também não quis adiantar que parte irá para a casa-mãe em Espanha. No BPI, essas contas estão feitas e já foram divulgadas: do lucro de 365 milhões obtido em 2022, 285 milhões seguem para o também espanhol CaixaBank.
Resultados e ROE em 2022 Margem financeira dispara 30%O que ajudou nos resultados? Há muitos fatores. Por exemplo, o negócio internacional (sobretudo Angola) alavancou os resultados do BPI e da Caixa – no banco do Estado, a atividade internacional teve mesmo um ano recorde. No Santander e no BCP, a subida dos resultados também deve ser entendida à luz dos processos de reestruturação que fizeram em 2021 e cujos efeitos extraordinários deixaram de se fazer sentir este ano.
PUB
Há, contudo, um ponto em comum aos quatro bancos: a subida das receitas com juros, que é o core do negócio da banca. A margem financeira disparou 30% para perto de 4,9 mil milhões de euros, num ano marcado pela inversão abrupta das taxas de juro dos bancos centrais para controlar a escalada da inflação. Isto é o resultado dos juros mais altos que receberam pelos empréstimos concedidos a famílias e empresas, enquanto os juros pagos nos depósitos se mantiveram perto de 0%, comportamento este que mereceu a reprovação do governador do Banco de Portugal.
Caixa e BCP tiveram as maiores subidas da margem financeira. No banco público aumentou 40%, tirando partido da maior carteira de crédito no mercado português. No banco liderado por Miguel Maya subiu 35%, mas devido sobretudo ao negócio que tem na Polónia, onde o banco central foi mais expedito a normalizar a política monetária.
A expectativa é que a margem se reforce ao longo deste ano, à medida que as taxas de juro continuam a subir e esses se vão refletindo por toda a carteira de crédito dos bancos.
PUB
Ainda do lado das receitas, há muito que os bancos descobriram outra fonte de ganhar dinheiro: as comissões. Subiram 7% para 2,1 mil milhões de euros à boleia de mais transações na economia (2021 ainda foi afetado pela pandemia) e também do aumento do preçário que os bancos fizeram nos últimos anos – há várias iniciativas legislativas em curso para travar algumas comissões.
Margem financeira dispara Depósitos aumentam em 2022, mas já perdem em 2023O crescimento das receitas também se deveu ao aumento do volume de ativos, mas os bancos sentiram já um abrandamento do crescimento do crédito no ano passado. A carteira de empréstimos aumentou apenas 1,4% para perto de 180 mil milhões de euros. No BCP e Santander até encolheu, já sentindo os efeitos da incerteza da guerra, inflação e alta dos juros.
PUB
Em relação aos depósitos, é verdade que terminaram o ano a gerirem poupanças recorde das famílias, com um total de 228 mil milhões de euros, um crescimento de 6% face a 2021.
Contudo, arrancaram o novo ano com uma fuga de 2,5 mil milhões de euros, com as famílias a tirarem o dinheiro do banco para investirem nos atrativos Certificados de Aforro e também para amortizarem o crédito da casa (e, com isso, atenuar a subida da prestação da casa).
A perda de poupanças estará na base da recente mudança de comportamento dos bancos em relação aos juros dos depósitos a prazo que, em alguns casos, já rendem até 3%, mas há muitas condições no acesso.
PUB