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A inferioridade moralista do Chega

Erradamente, há quem interprete a cerca sanitária em redor do Chega como algo derivado de uma superioridade moral ‒ da esquerda, em concreto ‒ sobre o partido de André Ventura.

Não subscrevo a tese, nem alinho na indignação. Não há qualquer tipo de “superioridade moral” em defender aquilo que garante, nas democracias, que ninguém é superior a alguém: a igualdade perante a lei. E, como estamos cansados de saber, as ideias do Chega atentam frequentemente contra essa igualdade. Seja na proposta de confinamentos étnicos, seja na sua divisão do país entre “portugueses de bem” e os demais, seja na facilidade com que ameaçaram enviar uma deputada “para a terra dela”, a discriminação é um elemento central da retórica do partido. Tal não é opinião; é facto consumado.

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Foi André Ventura, afinal, que se apresentou nesta campanha eleitoral como aquele que vinha “moralizar” o país. Ora, não é isso “superioridade moral”? As generalizações sobre o regime político e sobre as etnias não-caucasianas não são, elas próprias, uma estratégia de superioridade moral contra todos os que não as praticam? O Chega existiria sequer sem essa estratégia? E a resposta ideal seria qual? Baixar a cabeça, aceitar o rótulo, mudar de assunto e fingir que não está lá?

Por mais que os seus ideólogos, como Diogo Pacheco Amorim há dias, venham agora prometer que o partido “integra e respeita o regime” ‒ mas não “o sistema” ‒, há centenas de frases de André Ventura ao longo dos últimos dois anos que colocam em causa o regime, que pedem um novo 25 de Abril e anunciam uma Quarta República. Se a resposta a isso é oferecer-lhe uma vice-presidência da Assembleia que, a seu ver, deveria ter metade do tamanho, numa República que, a seu ver, deveria acabar, não me parece grande resposta. Depois de serem “contra o sistema” mas quererem ir para o governo com um partido fundador desse sistema, pretendem “acabar com a Terceira República” mas vice-presidir à Assembleia dessa República.

O problema da superioridade moral do Chega ‒ que é do Chega e não de quem não encolhe os ombros face ao Chega ‒ é essa perna curta. A sua suposta preocupação com os mais vulneráveis é imediatamente desmentida pelas soluções que indicam para reforçar o Estado Social: reduzir os deputados municipais e as assembleias de freguesia, esse enorme encargo público que desespera por reformas. A sua superioridade moral contra o regime, que está alegadamente “corrupto”, rapidamente se converte em inferioridade moralista quando se olha, não só para as suas medidas, mas para dentro do partido. A sua vereadora eleita em Benavente, por exemplo, cai no cómico de ter sido condenada em tribunal por comprar material roubado a alguém, ironicamente, pertencente a uma minoria étnica. Além das potencialidades cómicas do caso, creio que serve de bom alerta ao falso moralismo do Chega e à preguiçosa amoralidade de quem o relativiza. A maioria absoluta do PS, pelos vistos, não foi lição suficiente.

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