opinião
Comentadora CNN

Farofa e bacalhau

23 dez 2022, 18:19

Que o próximo Natal seja de ainda mais diversidade e, principalmente, de união dos povos irmãos, com mais direitos, menos xenofobia, menos racismo e mais amor em Portugal

Nesta semana, ouvi em uma conversa no mercado brasileiro que a farofa, um maravilhoso prato típico da ceia de Natal do Brasil, combina com bacalhau, que não costuma faltar na mesa dos portugueses no dia 24 de dezembro. Naquela manhã, ao lado dos deliciosos chocotones, a farofa era um dos itens mais requisitados nos cestos de compras.

Certamente, muitas farofas estarão nas ceias de Natal dos brasileiros que vivem em Portugal. O país tem 240 mil pessoas do Brasil com Autorização de Residência (AR), de acordo com o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF). O número é muito superior, se somados os cidadãos com dupla nacionalidade e os que estão na longa espera para obter o documento. 

Portugal, a terra do bacalhau, do pastel de nata e de bons vinhos, é o país europeu mais procurado por brasileiros que querem sair do país. É engraçado que muitos conservadores escolham um país de esquerda para viver, mas a imigração é um fenômeno muito além da política e, acima de tudo, é um direito humano.

Os brasileiros são a nacionalidade mais numerosa, mas apenas mais uma das dezenas que aqui vivem. Atualmente, são mais de 700 mil estrangeiros de diferentes idiomas, sotaques, religiões, raças e costumes variados, tentando encontrar seu lugar no mundo, misturando suas tradições com as que aqui já existem. 

O Natal, a mistura de culturas, de pratos culinários e da ceia, é uma boa data para refletir sobre como o país se tornou o destino de centenas de milhares de estrangeiros em busca de uma vida melhor, ou, ao menos, uma vida diferente. É o mesmo que os milhares de portugueses que escolhem outros países para viver e quem sabe assem bacalhau neste dia 24 em localidades onde não seja um prato comum. Ou seja, somos todos seres humanos em busca de um lugar ao sol para tentar viver bem e em paz, algo que não existe em inúmeras zonas do planeta. 

Portugal é um país de imigrantes e os portugueses são um povo que emigra. Temos muito mais em comum do que podemos imaginar. Na verdade, somos todos cidadãos do mundo, é uma ilusão pensar que territórios são de apenas uma raça, uma cor ou de quem nasceu ali. No caso de nós brasileiros, ainda partilhamos o mesmo lindo idioma, costumes e fatos históricos. 

Não faz nenhum sentido que a sociedade continue alimentando preconceitos e estereótipos entre os povos. Isso se torna ainda mais importante quando a imigração é necessária, como ocorre em Portugal. O Indicadores de Integração de Imigrantes 2022, divulgado nesta semana, mostra que sem os profissionais estrangeiros, alguns setores da economia entrariam em colapso. 

Ou seja, confirma porque é tão comum beber um café servido por um brasileiro ou comer um prato português que foi preparado por um indiano, por exemplo. Não adianta olhar torto ou tratar mal. A pessoa está ali trabalhando de forma digna e garantindo que as pessoas sejam atendidas. Para quem não gosta, terá que se habituar, pois tende a continuar sendo uma normalidade. Até porque é normal. 

É normal que as pessoas mudem de país, que aprendam novos costumes, sem perder suas raízes e que aprendam a viver em comunidades diversas e ricas, como Portugal se torna cada vez mais. É normal que ocupem os mais variados postos de trabalho, como as escolas, os hospitais, as construções e a mídia. Sonho com o dia que toda a sociedade vai parar de pensar que ter imigrantes no país é um fenômeno estranho ou perigoso. 

Que o próximo Natal seja de ainda mais diversidade e, principalmente, de união dos povos que aqui vivem, com mais direitos, menos xenofobia, menos racismo e mais amor. Ah, também sempre com farofa brasileira, bacalhau e vinho português na consoada do dia 24.
 

Brasil

Mais Brasil

Patrocinados