Exclusivo: dezenas de empresas criadas à medida e sem funcionários envolvidas em esquema de corrupção na Defesa

12 dez 2022, 20:00

Alberto Coelho, um dos principais visados da investigação, poderá vir a ser suspenso do CDS

Empresas fantasma, obras fictícias, subornos ou favorecimentos. A lista de irregularidades detetadas na operação Tempestade Perfeita, que investiga alegadas ilegalidades em negócios entre várias empresas e instituições tuteladas pelo Ministério da Defesa, continua a aumentar.

Uma investigação da TVI (do mesmo grupo da CNN Portugal) concluiu que existem mais empresas que fizeram contratos de milhares de euros, em alguns casos mais com isso, com a Direção-Geral de Recursos da Defesa Nacional, quando o diretor dessa instituição era o militante do CDS Alberto Coelho, que foi presidente do Conselho de Jurisdição do partido durante a presidência de Francisco Rodrigues dos Santos.

O responsável, de quem Nuno Melo já pediu a suspensão de militante do partido, foi um dos detidos (entretanto libertados com termo de identidade e residência) no âmbito desta mesma investigação, que culminou também na detenção dos empresários André Barros, Manuel Sousa e Paulo Machado, além de Francisco Almeida e Paulo Morais Branco, à data dos factos diretores do Serviço de Infraestruturas e Património e do Serviço de Gestão Financeira e Apoio, respetivamente.

Entre os casos investigados, que terão ocorrido entre 2019 e 2021, um dos mais flagrantes diz respeito a obras no Hospital Militar de Belém, inicialmente orçamentadas em 750 mil euros, mas que acabaram por custar aos cofres do Estado mais de três milhões de euros. Obras essas que foram aprovadas por Alberto Coelho e pelos outros dois responsáveis que representavam o Estado.

O esquema envolveria altos quadros e outros funcionários do Ministério da Defesa, que terão adjudicado contratos às empresas TRXMS e Weltbauen, com a vistoria a ficar a cargo da Roma Premium, tudo empresas com ligações aos empresários detidos.

No caso concreto das obras do Hospital de Belém, os 3,2 milhões de euros foram transferidos em 2020 para três empresas sob pretexto de serviços de construção, engenharias, especialidades e fiscalização. São precisamente as empresas TRXMS, Roma Premium e Weltbauen, mas há suspeitas de trabalhos não executados ou sobrevalorizados, e de corrupção pelas contrapartidas financeiras para os altos decisores da Defesa que, sem concurso público, ordenaram o pagamento destas verbas por ajuste direto. Era invocado o pretexto da urgência, uma vez que, no caso da remodelação do hospital, por exemplo, visava transformar a unidade num centro covid-19.

As suspeitas sobre Alberto Coelho e eventuais cúmplices são conhecidas há mais de um ano – e o caso da derrapagem das obras do hospital de Belém levou o então ministro da Defesa, João Gomes Cravinho, a afastá-lo da Direção-Geral de Recursos da Defesa Nacional em junho de 2021. Mas deu-lhe ao mesmo tempo posse como presidente da Empordef, empresa pública de tecnologias de informação, o que causou polémica junto da oposição ao Governo na Assembleia da República.

Alberto Coelho é investigado pela Unidade Nacional de Combate à Corrupção da PJ desde 2018, com base em denúncias anónimas que partiram do setor da Defesa. Há suspeitas de que tenha sido corrompido pelo setor privado noutros ajustes diretos, para além das obras do hospital de Belém. Em casos de limpeza de terrenos militares, de serviços de transportes e até na aquisição de armamento para as Forças Armadas, uma vez que também exerceu funções na Defesa no cargo de diretor nacional de Armamento.

Já esta segunda-feira o atual ministro dos Negócios Estrangeiros, que à data dos factos era o titular da pasta da Defesa, garantiu que seguiu todos os procedimentos: "Eu segui os procedimentos. Quando recebi o relatório do Tribunal de Contas, aquilo que fiz foi enviar esse relatório para o Ministério Público para prosseguir as suas investigações, de acordo com aquilo que entendessem", disse João Gomes Cravinho.

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