Pára tudo: Putin falou Inglês. Mas Putin não parou tudo - a guerra continua após a cimeira com Trump (e lembrem-se: um ataque relâmpago ameaçou mudar a guerra na Ucrânia)
Breaking news: Putin falou Inglês em público - duas vezes. Outras breaking news - que são breaking news mais delicadas que as breaking news sobre Putin poliglota (Putinglota?): não há cessar-fogo - nem total nem parcial nem de maneira nenhuma, pelo menos não na hora em que este texto foi escrito, que é a hora em que acabou a cimeira Putin / Trump.
O primeiro a manifestar-se no fim da reunião foi Putin e nessa primeira vez falou só em russo, bajulou Trump - porque se fosse Trump o presidente dos EUA em 2022 não haveria guerra na Ucrânia, afirmou Putin afirmando assim que Biden é culpado pela guerra ter entrado pela Ucrânia adentro - é como se Biden tivesse dado a ordem inicial para aquele dia inteiro mas nada limpo que foi 24 de fevereiro de 2022. Mas para Putin há mais culpas de Biden: o presidente russo disse também que as relações com os EUA atingiram o nível mais frágil desde a Guerra Fria e que é preciso trabalhar para que as relações aqueçam, elogiou Trump por estar a proporcionar isso só que no fim a cimeira teve um resultado morno: Putin afirmou apenas que espera que a guerra na Ucrânia acabe em breve, perdão, que "o conflito" na Ucrânia acabe e "quanto mais cedo melhor". Mas cedo é quanto Putin quiser, não quando Trump acha que é melhor.
Depois falou Trump, voz rouca e pose derrotada a contrastar com a postura vitoriosa do homólogo: o presidente dos EUA disse que houve entendimentos em "alguns pontos" sem dizer que pontos são e tem esta frase - que fica aqui em Inglês porque há nuances e subtilezas que se perdem nas traduções, aí vai: "We had an extremely productive meeting and many points were agreed to. We didn’t get there, but we have a very good chance of getting there". Portanto: não chegaram lá, ao cessar-fogo ou ao que quer que fosse a que Trump achava que ia chegar - os mísseis e os carros de combate russos vão continuar a matar na Ucrânia, o conflito prossegue, perdão: prossegue a guerra porque é de guerra que se trata, "conflito" tem nuances e subtilezas que mascaram a violência do que está a acontecer.
Trump anunciou ainda que ia ligar a Zelensky e aos líderes da NATO, pode ser que nesses telefonemas "os pontos" que foram acordados com Putin sejam alvo de clarificação - porque nem Trump nem Putin deixaram que os jornalistas desvendassem que pontos são aqueles, não houve direito a perguntas mas houve direito a esse acontecimento invulgar que é ouvir Putin a manifestar-se em Inglês, aconteceu assim: Trump começou por agradecer ao "Vladimir", quando se passa para o tratamento no nome próprio sem a deferência do Mr. President ou há intimidade ou é folclore, é um ponto também por clarificar, "Thank you very much, Vladimir", declara Trump virado para Putin, "Next time in Moscow", responde Putin em Inglês enquanto sorri orgulhosamente, "Oh, that's an interesting one", reage Trump, é apanhado desprevenido pela circunstância, Trump acrescenta que vê essa viagem a acontecer mas é com apreensão que o diz, agradece outra vez ao Vladimir e o Vladimir despede-se de todos com um "thank you so much". Foi uma festa.
O ataque relâmpago
Durante dois dias temeu-se o pior. Um ataque relâmpago russo conseguiu contornar as escassas posições defensivas ucranianas num dos pontos mais sensíveis da frente, na zona de Pokrovsk, na região de Donetsk. Com pequenas unidades, geralmente equipas de dois militares montados em motas todo terreno, as forças armadas conseguiram penetrar 15 quilómetros no território controlado pela Ucrânia. A surpresa foi de tal forma que os militares russos conseguiram até ultrapassar algumas das posições fortificadas ucranianas preparadas para um cenário de "catástrofe" na linha da frente.
O ataque obrigou o comando ucraniano a destacar uma das suas unidades mais capazes para o local: o 1.º Corpo Azov da Guarda Nacional, que começou a tentar estancar os avanços russos e a eliminar as unidades que conseguiram penetrar as posições ucranianas. O contraataque parece ter tido algum sucesso, com os avanços russos a pararem e com Kiev a recuperar algumas das posições que tinham sido perdidas dias antes.
Mas estes ataques são um dos exemplos mais claros de como a natureza da guerra na Ucrânia está a mudar. Longe vão os dias em que os generais russos ordenavam o ataque frontal de forças blindadas contra as posições ucranianas. A dimensão e a velocidade destas máquinas tornou-as presas fáceis para os milhões de drones que surgiram na linha da frente. Mas Moscovo adaptou-se e optou por ataques de pequenas dimensões e com grande velocidade.
As forças russas optam agora por avançar no terreno em motas todo terreno ou pequenos buggies militares, que apesar de permitirem apenas o transporte de algum equipamento ligeiro, garantem uma elevada velocidade e mobilidade às forças russas. Estas duas características têm-se provado cruciais para os avanços russos no terreno, tornando as movimentações russas mais difíceis de detetar por parte dos operadores de drones ucranianos, que têm menos tempo para reagir.
Os ataques são quase sempre conduzidos aos pares ou em grupos até seis soldados. Estes militares são conduzidos pelas ordens de um oficial que acompanha todas as movimentações através de um drone de reconhecimento. O objetivo destes homens não é atacar com sucesso as posições ucranianas, mas sim ultrapassá-las sem ser detectados, penetrando o máximo possível em território inimigo. Depois, estes soldados escondem-se e aguardam por reforços, antes de começar a causar o caos na retaguarda do adversário.
Esta nova táctica não só encontra uma solução para evitar as perdas monstruosas da frota de blindados como explora a principal fraqueza ucraniana: a falta de novos militares. As forças de Kiev deparam-se com uma crise severa de falta de soldados, com o número de baixas e deserções a pesar cada vez mais. Em alguns pontos da frente, um grupo de 12 soldados é responsável por defender uma secção de cinco a dez quilómetros da frente de batalha.
Atualmente, estima-se que a Ucrânia recrute entre 17 a 24 mil pessoas por mês, ou seja, um pouco mais de 200 mil soldados por ano. Ainda assim, este número não é suficiente para repor as capacidades das suas brigadas, algumas das quais operam com apenas 30% das suas capacidades iniciais. Este número é inferior aos 30 mil soldados que Moscovo é capaz de recrutar todos os meses, através de bónus de assinatura elevados e salários superiores à média no país. Estes números permitem a Moscovo manter a pressão, apesar das elevadas perdas.
Apesar da vantagem número russa, a Ucrânia tem encontrado formas de contrariar as desvantagens no campo de batalha. Um dessas táticas foi aplicada no campo da aviação, para proteger a frota de aviões ocidentais que a Ucrânia está a receber dos seus principais aliados. Desde que chegaram ao campo de batalha, a Rússia tem feito um esforço para conseguir atingir os caças F-16 de fabrico norte-americano e os Miragem-2000 franceses, particularmente quando estes aterram nas suas bases a receber manutenção ou a preparar-se para uma nova missão.
Os aviões ocidentais, que se tornaram fundamentais para a defesa antiaérea ucraniana nos últimos meses, são demasiado valiosos para se perderem enquanto estão nos hangares. Então, os militares ucranianos, juntamente com um grupo de voluntários, encontraram uma solução original, que permite aos pilotos da Força Aérea ucraniana levantar voo e aterrar em qualquer sítio, bem como fazer a respetiva manutenção e reabastecimento da aeronave.
Um novo Nakba ou uma tentativa de sobrevivência política?
No Médio Oriente, nada parece ser suficiente para travar o novo plano do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu para assumir o controlo total da cidade de Gaza, nem mesmo a oposição do chefe do Estado-Maior, Eyal Zamir, que criticou abertamente o plano, apesar das críticas de vários ministros do executivo israelita. A ofensiva já foi planeada, aprovada e 250 mil reservistas foram chamados para ocupada a cidade, mesmo com o exército a defender que o plano pode agravar ainda mais a crise humanitária e acabar com a esperança de recuperar os restantes 50 reféns do Hamas.
Em simultâneo, o primeiro-ministro israelita começou negociações com o Sudão do Sul, país devastado pela guerra, para a possível transferência de palestinianos de Gaza para o país africano. Segundo a Associated Press, que cita seis fontes próximas do processo, as negociações já aconteceram, trazendo de volta o fantasma do "Nakba" de 1948, quando dezenas de milhares de palestinianos foram alvo de expulsões violentas e desapropriação de terras, num processo que dura até aos dias de hoje.
Críticos da medida, incluindo grupos de direitos humanos e a comunidade internacional, classificam a proposta como uma tentativa de expulsão forçada que viola o direito internacional. Ainda assim, a medida parece contar a oposição do Egito, cujos oficiais estavam a par dos esforços israelitas e admitiram que o governo está a pressionar o Sudão do Sul a não aceitar os refugiados palestinianos, com receio de que estes migrantes acabem por entrar no seu território.
A pressão egípcia levou ao regresso às negociações por parte do Hamas, liderado por Khail Al-Hayya, para chegar a um cessar-fogo e para facilitar a entrega de comida. O grupo expressou abertura a uma força árabe e internacional em Gaza, mas rejeitou desarmamento antes da retirada israelita.
Mas nada parece ser suficiente para travar um Benjamin Netanyahu que continua a precisar de tempo para lutar pela sua sobrevivência política. No entanto, o governo israelita sublinha que uma administração civil pacífica e não israelita para Gaza está entre os cinco princípios-chave do governo israelita para pôr fim à guerra.Os outros princípios incluem a libertação dos reféns ainda detidos em Gaza, a entrega de armas pelo Hamas, a desmilitarização total de Gaza e a manutenção, por parte de Israel, de um controlo de segurança predominante.