A mãe de todas as fugas de informação

Não, não são coisas do outro mundo. É o Admirável Mundo Trump
Sáb, 31 mai 2025

A Rússia de Vladimir Putin, um dos estados securitários mais poderosos do mundo, acaba de ver milhões de documentos confidenciais serem divulgados, naquela que será uma das maiores fugas de informação secreta da história do país. Os documentos revelam em grande detalhe como é que a Rússia está a modernizar as suas bases nucleares, permitindo não só obter as suas localizações, bem como informações sobre como todas estas estruturas estão a ser montadas.

Os mais de dois milhões de documentos foram obtidos por jornalistas do alemão Der Spiegel e do dinamarquês Danwatch numa base de dados russa, onde as empresas de construção militar russas partilhavam documentos sensíveis com os planos de construção de diferentes infraestruturas. Os jornalistas tiveram acesso a centenas de plantas altamente pormenorizadas das novas instalações nucleares russas.

Na pequena cidade de Yasny, a sul dos montes Urais, foi descoberta uma das 11 localizações que a Rússia tem preparadas para lançar algumas das maiores ogivas nucleares alguma vez concebidas. Nos arredores desta localidade, existem 30 silos espalhados pelas vastas planícies da região. Dois destes recintos estão prontos para disparar o veículo hipersónico Avangard, uma das armas nucleares mais importantes da estratégia de dissuasão nuclear russa. 

Várias destas localizações eram conhecidas, mas o que se sabia limitava-se às imagens capturadas por satélite. Esta investigação permitiu conhecer o interior destas estruturas e compreender os seus pontos fortes e as suas vulnerabilidades. E os detalhes não se ficam por aí. É também possível perceber de forma extensiva a segurança destas infraestruturas - que têm um perímetro de segurança com três camadas - bem como todo o tipo de sensores. Em vários casos, até é possível saber as localizações das câmaras de segurança no interior dos bunkers. 

Os documentos detalham também os tipos de materiais e técnicas utilizadas na sua construção, com dados sobre as entregas de quantidades significativas de ferro, areia, cimento, tijolos e materiais isolantes. A fuga de informação dá a conhecer também quais os sistemas tecnológicos utilizados nestas bases, as localizações e o tipo de instalações elétricas, bem como os planos para a canalização, aquecimento e ventilação.

As forças armadas russas, segundo as informações divulgadas, estão a destruir muitas das antigas instalações nucleares herdadas da União Soviética e a construir estas novas e melhoradas infraestruturas completamente de raiz, num processo em curso ao longo da última década. Foram erguidas centenas de novas casernas, centros de controlo, torres de vigia e túneis subterrâneos a ligar estes edifícios.

"Até agora, só conseguíamos monitorizar estas bases a partir de cima, utilizando imagens de satélite. Agora, com a ajuda destes desenhos únicos, podemos, pela primeira vez, entrar nos edifícios e ir até ao subsolo. É algo completamente sem precedentes", disse Hans M. Kristensen, diretor do Projeto de Informação Nuclear da Federação de Cientistas Americanos, ao Danwatch e à Der Spiegel. 

Esta investigação retrata também uma verdade inconveniente para o Ocidente: que as bases estão repletas de equipamentos de várias empresas ocidentais. O caso na Dinamarca gerou mesmo polémica, depois de os jornalistas terem descoberto que muitas das peças fundamentais para o esforço de modernização do arsenal nuclear russo estão a ser fabricadas com equipamentos de algumas das maiores empresas dinamarquesas.

Para os serviços secretos ocidentais, estas informações são fundamentais e podem colocar em risco os militares destas novas bases russas. "Se formos capazes de compreender como é que a eletricidade é conduzida e de onde vem a água", disse um antigo oficial dos serviços secretos britânicos, então "podemos identificar os pontos fortes e fracos e encontrar um ponto fraco para atacar".

Outros destacam a importância de a informação ter sido tornada pública, para que a Europa compreenda a verdadeira dimensão do esforço russo para modernizar as suas infraestruturas nucleares, numa altura em que o Kremlin tem utilizado a ameaça de armas nucleares para evitar mais apoio de países europeus à Ucrânia.

Delegações de Ucrânia e Rússia reunidas em Istambul

Delegações de Ucrânia e Rússia reúnem-se em Istambul (Murat Gok/AP)

Quem está a ganhar a guerra?

Todos os olhos voltam a estar postos em Istambul. A segunda ronda de negociações de paz entre a Ucrânia e a Rússia está marcada para a próxima segunda-feira. O lado ucraniano prepara-se para apresentar um memorando que inclui provisões para um cessar-fogo na terra, no ar e no mar, que deve ser monitorizado por vários parceiros internacionais, de acordo com um relato do New York Times, que cita um diplomata ucraniano. A ideia é semelhante ao que foi proposto no passado pela Ucrânia e por países ocidentais, embora a Rússia tenha negado categoricamente a possibilidade de acordar um cessar-fogo de 30 dias.

Ao mesmo tempo, dos Estados Unidos continuam as ameaças de retirada do processo de paz, caso a Rússia continue a guerra. Desta vez, o aviso veio por parte do representante americano na reunião do Conselho de Segurança das Nações Unidas, John Kelly, que afirmou que Washington está pronta para abandonar a sua participação na iniciativa de paz, ainda que tenha sublinhado que isso não significa "abandonar os nossos princípios ou os nossos amigos", deixando a porta aberta para a continuação do apoio à resistência ucraniana. Ao mesmo tempo, o enviado especial de Trump para a Ucrânia revelou que os EUA estão disponíveis para travar a adesão de novos países à NATO, como uma condição para um acordo de paz na Ucrânia.

Só que nem tudo foram más notícias para Zelensky. O novo chanceler alemão preciso apenas de 21 dias para reverter a política do seu antecessor e abrir as portas para que a o melhor míssil de longo alcance europeu possa estar ao serviço das forças armadas ucranianas. Friedrich Merz disse que esta será uma cooperação a nível industrial, com os alemães a fornecerem a tecnologia para que a Ucrânia possa produzir este tipo de equipamentos. Moscovo protestou imediatamente contra a decisão. Estes mísseis, pedidos por Kiev há vários anos, podem ser importantes para atacar alvos na retaguarda russa, como a ponte de Kerch, que liga a Rússia à península ocupada da Crimeia.

Não são só os adversários russos que lhes estão a causar dores de cabeça. O Kremlin acusou o seu aliado histórico da Sérvia de dar uma "facada nas costas", afirmando que Belgrado está a fornecer armamento à Ucrânia. Os serviços secretos russos publicaram um comunicado onde acusa as empresas sérvias de "contrariamente à neutralidade declarada" pelo governo de Vučić, continuar a fornecer munições a Kiev, através de vendas a países da NATO, como a Polónia, a Chéquia e a Bulgária. O líder sérvio rejeitou as acusações russas e recordou que está a ser criado um grupo de trabalho com a Rússia para determinar como é que as armas de fabrico sérvio chegam à Ucrânia. João Guerreiro Rodrigues

A ofensiva de Trump contra a Europa está “a sair pela culatra”?

“No final do dia, assim que conhecermos os resultados, haverá um enquadramento para todas as pessoas em toda a Europa e no resto do mundo perceberem o que pode acontecer daqui para a frente”, diz Zerka sobre a segunda volta das eleições presidenciais polacas – disputadas entre o centrista pró-UE Rafal Trzaskowski, apoiado pela Coligação Cívica do primeiro-ministro, Donald Tusk, e o nacionalista conservador Karol Nawrocki, apoiado pelo Partido Lei e Justiça (PiS) do atual presidente, Andrzej Duda.

Em entrevista à CNN, a analista polaca Małgorzata Zachara-Szymańska tinha destacado há uma semana a importância destas eleições para os polacos e a sua relação com a UE, dois anos depois de uma maioria dos eleitores ter posto fim aos oito anos de poderio do PiS, marcados por um grande fosso entre Varsóvia e Bruxelas, firmando o regresso de Tusk à cadeira do poder na Polónia. Mas não é só o futuro da Polónia e da UE que se joga este domingo nas urnas.

Com o sentimento de pertença à UE num pico histórico em inúmeros países do bloco, no que pode ser uma “consequência não intencional” dos primeiros seis meses da nova administração Trump, Zerka destaca que “a ofensiva do presidente americano contra a Europa pode estar a sair pela culatra” – e a votação na Polónia vai servir para demonstrar se assim é.

“Se Nawrocki ganhar, o enquadramento será que o apoio de Trump a este candidato teve real importância. Mas se perder, então os candidatos de ultradireita por toda a Europa e o resto do mundo talvez devam ser mais cautelosos em relação ao apoio que obtêm de Washington.” — Joana Azevedo Viana

Kristi Noem encontra-se com o candidato presidencial conservador polaco

Kristi Noem Secretária de Segurança Nacional EUA administração Trump visita Polónia encontro apoio candidato presidencial conservador Karol Nawrocki (Alex Brandon, Pool/AP)

A semana em que Musk saiu de cena – e as tarifas também (mas só por momentos)

A conversa com O’Brien, à margem da mesma conferência do ECFR na Gulbenkian, decorreu horas depois de um tribunal americano ter ordenado a suspensão das chamadas tarifas “recíprocas” que Trump impôs a quase todos os países do mundo – e horas antes de outro tribunal ter suspendido essa decisão, repondo temporariamente as tarifas.

Com a aproximação galopante do mais recente prazo imposto pelo presidente americano à UE (9 de junho), na corrida para se negociar um acordo que trave (mais) tarifas às exportações europeias – e sob a ameaça de aumentar essas taxas aduaneiras para 50% – resta esperar pelos próximos capítulos desta saga. E enquanto se espera, vale a pena ler a reportagem exclusiva que o New York Times publicou na sexta-feira, revelando que Musk consumiu tantas drogas durante a campanha e já à frente do Departamento de Eficiência Governamental (DOGE) que desenvolveu um problema de bexiga. — Joana Azevedo Viana

Elon Musk na Casa Branca

Elon Musk (Getty)

Braços-de-ferro sobre a Palestina

Passou uma semana desde que Israel desbloqueou parcialmente a entrada de ajuda humanitária em Gaza após quase três meses sem autorizar nada a entrar no enclave. Com o amontoar de notícias sobre milhares de bebés e crianças em risco de morrer à fome, perante o contínuo bombardeamento do território palestiniano, a distribuição da pouca comida e medicamentos que entraram finalmente em Gaza provou-se difícil. E foi ainda mais dificultada pela empreitada EUA-Israel para alimentar os palestinianos do território.

Entre notícias sobre milhares de pessoas concentradas em campos no norte de Gaza para terem acesso a alimentos e notícias sobre soldados israelitas a abrirem fogo contra as famílias desesperadas, o novo chanceler alemão assumiu que a retórica de destruir o Hamas está a esvaziar-se de conteúdo.

“Prejudicar a população civil desta forma, como tem acontecido cada vez mais nos últimos dias, não pode mais ser justificado como uma luta contra o terrorismo do Hamas”, disse Friedrich Merz em entrevista à WDR. “Já não entendo o que o exército israelita está a fazer na Faixa de Gaza, com que objetivo a população civil está a ser impactada desta forma.”

É neste contexto, perante renovadas negociações infrutíferas por um cessar-fogo – e com a operação de Israel pelo “controlo total” do enclave em marcha – que os países da ONU se preparam agora para uma conferência sobre a solução de dois Estados, que vai ter lugar já nos próximos dias 4 e 5 de junho, para preparar um segundo encontro outro, que acontece entre 17 e 20 do mesmo mês.

Para salvar a solução preconizada nos Acordos de Oslo de 1993, é preciso reconhecer o Estado da Palestina, no que o presidente francês diz ser “um dever moral e uma necessidade política”. Ao lado do primeiro-ministro de Singapura, Emmanuel Macron também deixou um aviso, horas depois de a ONU ter informado que 100% da população de Gaza está agora em risco de fome severa: "Se não houver uma resposta, nas próximas horas e dias, em linha com a situação humanitária, teremos de endurecer a nossa posição coletiva."

Já este fim de semana, o ministro dos Negócios Estrangeiros da Arábia Saudita visita a Cisjordânia ocupada, acompanhado por autoridades do Egito e da Jordânia, naquela que será a viagem oficial de mais alto nível dos sauditas ao território palestiniano desde 1967. "A visita ministerial é considerada uma mensagem clara", defende o embaixador palestiniano em Riade. "A de que a causa palestiniana é uma questão central para árabes e muçulmanos." Joana Azevedo Viana

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