Acontece aos melhores: Sandra comprou um carro… que depois foi "roubado" pelo vendedor

9 mai 2022, 21:40

Mulher de Lousada avançou com um processo-crime contra o dono do stand. Ministério Público acusou o homem, mas o tribunal acabou por absolvê-lo. Se também tem um problema que não consegue resolver, conte-nos a sua história para o e-mail aconteceaosmelhores@tvi.pt

Sandra Ribeiro e o marido tinham um BMW série 7, um carro antigo que já dava mais dores de cabeça do que bons momentos na estrada. Por isso, o casal de Lousada decidiu vender o automóvel, só não contavam que fosse tão depressa.

Fiquei sem carro para trabalhar. Eu trabalhava numa empresa de seguros, para o Rui Magalhães. Um desses dias, ele disse-me que tinha um carro que o meu marido ia gostar”, conta Sandra Ribeiro à TVI/CNN Portugal.

O patrão de Sandra propôs ao casal que comprasse uma carrinha Audi que tinha em sua posse. No entanto, o automóvel estava na oficina a reparar, porque tinha alguns trabalhos de bate-chapa para concluir.

Ele disse que assim que a carrinha estivesse pronta entregava-ma, mas eu continuava sem carro para trabalhar no imediato”, desenvolve Sandra Ribeiro.

Para fazer face à urgência de Sandra e do marido, o patrão da consultora de seguros sugeriu-lhes que ficassem com outro carro que tinha disponível na altura, um Volkswagen, que custava 12 mil euros.

Marido e mulher não quiseram perder a oportunidade de concluir um bom negócio, pelo que fizeram aquilo a que chamam uma compra provisória: pagaram os 12 mil euros e ficaram com o Volkswagen na condição de o trocarem pelo Audi, assim que este último estivesse reparado.

Porém, o novo carro tardou a chegar, e Sandra continuou a conduzir o Volkswagen, mesmo tendo passado já cerca de três meses desde a compra. A partir daí, em outubro de 2017, sucedeu o que, de facto, só Acontece aos Melhores.

A um domingo, estávamos no bar onde eu era gerente, em part-time. Íamos fazer Karaoke e o meu marido precisou de ir buscar uma peça para a aparelhagem. Tínhamos estacionado o carro à porta do bar. O meu marido desce e sobe logo muito depressa a dizer que o carro não estava lá, que tinha sido roubado”, conta, ainda com cara de espanto, Sandra Ribeiro à TVI/CNN Portugal.

O carro tinha desaparecido. A consultora de seguros quis confirmar que, de facto, não havia sinais do automóvel à porta do bar, em Freamunde. Assim aconteceu, e o casal correu para o posto da GNR, onde apresentou uma queixa por furto.

Ao mesmo tempo, Sandra resolveu ligar ao patrão, que lhe tinha vendido o carro. É que no porta-luvas da viatura estavam os documentos do automóvel, que eram necessários naquele momento. Rui Magalhães aconselhou, então, a empregada a dirigir-se ao stand de Joaquim Mendes, o homem que tinha vendido o carro ao patrão e que teria uma segunda via de todos os papéis.

Quando chego lá, o senhor Mendes estava muito descontraído. E disse-me para não me preocupar, porque o meu carro estava bem”, conta Sandra Ribeiro.

A consultora de seguros não podia ter ficado mais feliz, a achar que o automóvel tinha sido, finalmente, encontrado. Porém, a realidade estava muito longe de ser aquela.

O Joaquim Mendes vira-se e diz que foi ele que foi buscar o carro, e que eu tinha de me entender com o meu patrão, porque o meu patrão não lhe tinha pago o carro a ele.”

O caso é complexo, mas resumindo: Sandra comprou um carro ao patrão; por sua vez, o patrão tinha comprado este automóvel a Joaquim Mendes, proprietário de um stand. Ora, é Joaquim Mendes que, aparentemente do nada, vai buscar o carro que Sandra já tinha pago ao patrão, alegando que o patrão não lhe tinha pago a ele.

Contudo, será que, mesmo que o dono do stand não tivesse recebido o dinheiro do patrão de Sandra, poderia apoderar-se do carro que já estava na mão desta mulher?

Respondendo à sua questão, não. Não poderia ter entrado no carro (…), sabendo que a posse estava com outra pessoa. Devia tê-lo feito através dos tribunais, porque existem providências cautelares para o efeito”, considera a advogada Rita Garcia Pereira.

Perante o sucedido, Sandra Ribeiro resolveu questionar o patrão sobre o embróglio, e este garantiu-lhe que tinha pago o carro a Joaquim Mendes, o dono do stand.

O Rui disse-me que ia entender-se com o Mendes. Eu disse que esperava que fosse rápido, porque queria ou o carro ou o dinheiro, mas principalmente o carro.”

Certo é que o entendimento nunca aconteceu. O patrão dizia que tinha pago o carro ao vendedor, o vendedor insistia que o patrão nunca tinha saldado a dívida. À margem da discussão, mas sem o dinheiro e sem o automóvel, Sandra cansou-se e decidiu avançar para tribunal, através de um processo-crime contra Joaquim Mendes, o dono do stand, que foi buscar a viatura com recurso a uma segunda chave da viatura que, alegadamente, teria guardado de forma indevida.

Algum tempo depois, o Ministério Público acusou Joaquim Mendes de furto qualificado e de falsificação de documento, portanto a batalha parecia ganha à partida. Porém, no fim de contas, isto é no fim do processo já em 2021, o caso mudou de figura.

No veredicto final (sentença), eu e o meu marido somos inocentes, temos toda a razão, somos duas vítimas, mas não condenam o senhor Joaquim Mendes”, conta, indignada, Sandra Ribeiro.

O casal de Lousada ficou em choque. Todas as provas pareciam estar em cima da mesa, mas a juíza decidiu absolver o homem acusado de furtar o automóvel. É que, no dia em que desapareceu, o carro não estava registado em nome de Sandra Ribeiro. Para todos os efeitos, o Volkswagen não era propriedade da consultora de seguros, portanto não lhe pode ter sido roubado.

Nunca passei o carro para meu nome, porque estava à espera da Audi. Não ia passar o carro para meu nome, se, entretanto, ia passar a Audi para meu nome, estávamos sempre à espera”, explica Sandra Ribeiro.

Além disso, Sandra Ribeiro conhecia bem Joaquim Mendes, o dono do stand, porque este passava-lhe, com frequência, clientes que precisavam de fazer seguros para carros acabados de comprar.

O meu maior problema aqui foi a confiança, confiei de mais nas pessoas”, conclui Sandra Ribeiro.

A confiança pode, de facto, ser traiçoeira. Por isso, a advogada Rita Garcia Pereira deixa um conselho  fundamental na hora de vender ou comprar carro.

Sempre que temos bens passíveis de serem registados, para provar a propriedade, temos de fazer o competente registo. Neste caso, não foi efetuado...”

De qualquer maneira, se o automóvel estivesse em nome do patrão, o arguido (Joaquim Mendes) poderia ser condenado. Porém, em tribunal não foi possível provar que à data do desaparecimento do carro, nos registos, a viatura já tinha passado do nome da empresa de Joaquim Mendes para o nome de Rui Magalhães, o patrão de Sandra. Perante esta dúvida, o carro poderia ainda pertencer a Joaquim Medes, e um furto só pode verificar-se quando há a certeza de que o bem subtraído pertence a um terceiro, o que neste caso não aconteceu, por mais estranho que possa parecer.

E eu e o meu marido, no meio disto, ficamos prejudicados, porque ficámos sem o dinheiro e sem o carro, e a justiça não fez nada”, lamenta Sandra Ribeiro.

O Acontece aos Melhores foi ao encontro de Joaquim Mendes, o arguido. O homem recusou dar uma entrevista, mas garante que nunca vendeu o Volkswagen ao patrão de Sandra. Segundo o próprio, o que fez foi emprestar o carro a Rui Magalhães que, indevidamente, vendeu-o a Sandra. Sendo assim, Joaquim Mendes considerou estar no direito de ir buscar o que lhe pertencia.

No entanto, a versão do arguido levantou fortes dúvidas ao tribunal, que pondera que este tenha mentido durante o julgamento.

A TVI/CNN Portugal tentou também contactar Rui Magalhães, o patrão de Sandra, sem sucesso. Ao que tudo indica, terá fugido para Angola.

Ninguém tem o direito de roubar o que é dos outros, ninguém. Já não queria indemnizações, queria simplesmente que me dessem o valor, e eu saía bem da minha vida”, terminam Sandra Ribeiro e o marido, Nuno Coelho.

Ainda assim, a luz ao fundo do túnel ainda brilha. É que Sandra pode conseguir recuperar o dinheiro, caso interponha não um processo-crime, mas uma ação cível contra o patrão e contra o dono do stand, para que lhe seja restituído o valor de um bem que pagou, mas que não usufruiu.

Se, à semelhança de Sandra e do marido, também tem um problema que não consegue resolver, conte-nos a sua história para o e-mail aconteceaosmelhores@tvi.pt.

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