"Politicamente muito conservador" e "muito à direita", candidato a juiz do Tribunal Constitucional já recusou legalização do aborto

CNN Portugal , DCT
14 mai 2022, 13:19
Justiça

Num artigo publicado em 1984, António Manuel Almeida Costa - agora escolhido pela “ala direita” dos juízes do Tribunal Constitucional para suceder a Pedro Machete - defendeu que o aborto apenas deveria ser permissível em caso de morte iminente da mãe, mesmo que a gravidez resultasse de uma violação

António Manuel Almeida Costa, juiz indicado pela “ala direita” para suceder a Pedro Machete no cargo de vice-presidente do Tribunal Constitucional (TC), publicou em 1984 um artigo na revista da Ordem dos Advogados em que defendia que o aborto apenas deveria ser permissível em caso de morte iminente da mãe, mesmo que a gravidez resultasse de uma violação.

A notícia é avançada este sábado pelo Diário de Notícias, que dá conta que o juiz de 66 anos é descrito por quem lhe próximo como “politicamente muito conservador” e “muito à direita, muito mais à direita que o PSD”, no entanto, diz o jornal, o nome do juiz está já assente para os juízes indicados pelo PSD e em curso a negociação com os juízes indicados pelo PS de modo a que seja o eleito. Para tal, necessita apenas da concordância de cinco juízes à direita e de dois à esquerda, num total de sete dos dez indicados pelo parlamento.

Contactado pelo jornal, o juiz defendeu que “o texto está datado e assinado e tem uma data. A matriz jurídicocultural é a mesma” e que não voltou a redigir sobre o tema porque “não calhou”, embora o tenha feito mais duas vezes segundo o jornal. O juiz recusou ainda a prestar declarações se, passados 38 anos, mantém a mesma opinião sobre a interrupção voluntária da gravidez.

O que dizia o artigo

No artigo intitulado de Aborto e Direito Penal / Algumas considerações a propósito do novo regime jurídico da interrupção voluntária da gravidez, o na altura assistente da Faculdade de Direito de Coimbra defendia que não existia “qualquer argumento favorável à legalização da interrupção voluntária da gravidez”, devendo a morte iminente da mãe ser o único critério válido, excluindo, por exemplo, a vontade da mulher ou a gravidez resultante de uma violação - situação que considerava, à data, como rara.

“De acordo com o estado atual da medicina [em 1984, portanto], o problema só se põe nas hipóteses de cancro do útero e de gravidez ectópica e extra-uterina. (...) Dado, porém que, nesses casos, a questão que se coloca consiste na alternativa, não entre salvar a mãe ou o filho, mas entre perder inevitavelmente ambas as vidas ou preservar uma delas (que só pode ser a da mãe) parece que daí não se extrai qualquer argumento favorável à legalização da interrupção voluntária da gravidez. (...) E isto porque, na verdade, não se estaria eliminando o feto - que, por força das circunstâncias, se encontraria já condenado - mas, tão-só, a salvar a única vida humana viável para o futuro, ou seja, a vida da mãe”, escreveu o atual juiz no artigo, agora citado pelo Diário de Notícias.

Para justificar a sua posição anti-aborto, o juiz recorreu, em 1984, àquilo a que chamou de “investigações médicas”, mas que, na verdade, podem ser experiências em campos nazis com mulheres prisineiras. O juiz citou maioriatamente Fred Emil Mecklenburg, obstetra-ginecologista americano de 87 anos que tem atuado em oposição ao aborto legal. No entanto, as experiências citadas pelo médico são agora inexistentes, com cientistas norte-americanos a afirmar que não há rasto de qualquer documentação.

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