Os deputados socialistas Isabel Moreira, André Rijo, João Paulo Correia, António Mendonça Mendes ou Pedro Vaz abandonaram os seus lugares durante o discurso de André Ventura, regressando assim que o presidente do Chega terminou de falar
O PS considerou que equiparar as comemorações do 25 de Novembro às do 25 de Abril é um “caminho de reabertura de feridas há muito saradas”, enquanto o BE qualificou a sessão de “solene disparate”. Do lado das bancadas à direita, PSD, Chega, IL e CDS-PP saudaram a evocação parlamentar inédita do 25 de Novembro de 1975, com os sociais-democratas a defenderem que a data une e o Chega a considerar que este “é o verdadeiro dia da liberdade”. O PCP não marcou presença na cerimónia desta segunda-feira.
Na primeira sessão solene evocativa do 25 de Novembro na Assembleia da República, os aplausos ao general Ramalho Eanes, presente na tribuna reservada às mais altas figuras do Estado, foram uma constante nas intervenções das bancadas à direita, com a primeira grande ovação a surgir após a referência do líder parlamentar do CDS-PP, o segundo partido a intervir na sessão. E Paulo Núncio foi claro na mensagem que quis passar: “Novembro não se fez contra Abril, Novembro fez-se contra a apropriação ilegítima de Abril” e completa essa data, disse Paulo Núncio.
Nos discursos na primeira sessão solene de sempre do 25 de Novembro de 1975, no parlamento, o Livre defendeu que o que alguns estão a tentar fazer ao 25 de Novembro “não demonstra verdadeiro respeito nem pela data, nem pela verdade histórica”, enquanto a deputada única do PAN alertou para o erguer de novas trincheiras.
Pelo PS, o deputado Pedro Delgado Alves citou o histórico Manuel Alegre – cujo poema “Abril de Abril” recitou para fechar a sua intervenção – para defender que “o 25 de Novembro não foi uma vitória da direita sobre a esquerda”. “Hoje, a melhor forma de homenagear esta capacidade de ultrapassar as divisões é a de não reabrir as fraturas que sabiamente estas gerações fundadoras do regime democrático souberam superar, recusando revisionismos, vontades revanchistas ou provocações”, apelou. O deputado reivindicou o papel determinante de Mário Soares e do PS para que “prevalecesse o caminho em direção à democracia pluralista”.
“O PS tem a legitimidade e autoridade histórica para recordar que, precisamente por não rejeitar por um instante o seu papel e a sua responsabilidade direta no sucesso do 25 de Novembro, a sua equiparação simbólica e cénica à comemoração da data fundadora do regime democrático é um caminho de reabertura de feridas há muito, e bem, saradas”, avisou.
De cravo vermelho, Joana Mortágua - a única deputada do BE que marcou presença - defendeu que “a atual mistificação sobre o significado histórico do 25 de Novembro é uma manobra de derrotados de Abril”, salientando que foi a Revolução dos Cravos que deu “a democracia, as liberdades individuais e coletivas” e não o 25 de Novembro.
“Inventar um passado alternativo para Portugal serve apenas a mitologia de uma certa direita que pretende normalizar o regime social do Estado Novo através da diabolização do PREC”, disse, qualificando estas comemorações como um “solene disparate”. “Esta sessão e as que se realizarem nos próximos dois ou três anos serão lembradas no futuro como o momento folclórico de um tempo bizarro, em que o PSD e a extrema-direita se aliaram no revisionismo histórico”, afirmou, numa intervenção aplaudida pelo PS.
Pelo PSD, o vice-presidente da bancada Miguel Guimarães defendeu que esta data “simboliza o triunfo da moderação sobre o extremismo”, que deve unir e não dividir o parlamento. “Comemorar o 25 de Novembro não é para apoucar ou tentar diminuir o 25 de Abril, o que seria absurdo e condenado ao fracasso”, afirmou, considerando que foi esta data que permitiu aos portugueses concretizar “a verdadeira promessa da Revolução de Abril: a liberdade”.
Já André Ventura destacou, numa referência a esta cerimónia inédita, que “uma nova maioria [parlamentar] permitiu que se dissesse que, sem esquecer o 25 de Abril, este é o verdadeiro dia da liberdade de Portugal”. Centrando depois o seu discurso na atualidade, o líder do Chega disse que Portugal vive hoje com a “ameaça da imigração descontrolada”.
Afirmando que há 49 anos “o país enfrentava uma guerra civil, com ameaça à sua segurança real e diária”, Ventura considerou que atualmente “os bairros à volta de Lisboa e do Porto apresentam novas ameaças e novos desafios, com o país a preferir dar razão a bandidos do que às forças de segurança”. Estas afirmações levaram vários deputados do PS a sair da sala das sessões da Assembleia da República, entre os quais Isabel Moreira, André Rijo, João Paulo Correia, António Mendonça Mendes ou Pedro Vaz, que regressaram quando terminou a intervenção de André Ventura.
O presidente do Chega considerou também que hoje a ameaça não é “dilaceração do Estado pela ditadura soviética”, mas sim “pela corrupção que Abril criou”, e disse que Portugal precisa “de uma melhor democracia”, sustentando que “precisa novamente desse espírito do 25 de Novembro, sem medo”. Ventura questionou ainda que o parlamento vá homenagear o antigo Presidente da República Mário Soares com uma sessão solene – a 6 de dezembro – e não o faça também para os ex-combatentes.
Pela Iniciativa Liberal, o presidente Rui Rocha defendeu que a falta de consenso à volta do 25 de Novembro não deve impedir o parlamento de o comemorar. “Ramalho Eanes e Mário Soares não procuraram consensos com aqueles que não amavam a liberdade. Procuraram afirmar a visão do país da democracia e da liberdade e é isso que hoje aqui celebramos”, defendeu.
Para Rui Rocha, a realização desta cerimónia representa “uma nova derrota daqueles que foram derrotados no 25 de Novembro”, lamentando que tenham sido precisos 49 anos para que esta cerimónia pudesse acontecer.
A realização de uma sessão solene anual para assinalar esta data no parlamento – em moldes semelhantes à do 25 de Abril - foi proposta pelo CDS-PP e aprovada por PSD, Chega e IL, com a abstenção do PAN e votos contra dos restantes partidos à esquerda.
Os acontecimentos do 25 de Novembro, em que forças militares antagónicas se defrontaram no terreno e venceu a chamada ala moderada do Movimento das Forças Armadas (MFA), marcaram o fim do chamado Período Revolucionário em Curso (PREC).